Desafios e oportunidades para os idosos nas grandes cidades brasileiras
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Transição urbana no Brasil: aumento da concentração populacional nas grandes cidades e os desafios e oportunidades para idosos. Soluções e planejamento inclusivo.
Artigo de José Eustáquio Diniz Alves
A população brasileira, na maior parte dos primeiros cinco séculos do país, estava localizada, predominantemente, na área rural. Todavia, o Brasil viveu uma transição urbana no século XX e a população foi se concentrando, gradualmente, nas grandes cidades.
O gráfico abaixo, com dados do censo demográfico 2010 e das projeções populacionais de 2024, mostra que as cidades com menos de 20 mil habitantes concentravam 17,1% da população total em 2010 e caiu para 15,1% em 2024. As cidades entre 20 mil e 100 mil habitantes concentravam 28,1% em 2010 e caiu para 26,7% em 2024. Já as cidades com mais de 100 mil habitantes concentravam 54,7% em 2010 e subiu para 58,2% em 2024. Portanto, a maior parte da população brasileira está concentrada em municípios com mais de 100 mil habitantes.
Concomitante à transição urbana, o Brasil vive uma transição demográfica e também uma transição da estrutura etária. Isto quer dizer que o país está passando por um processo de envelhecimento que vai se aprofundar no século XXI. No ano 2000, 85% da população tinha entre 0-49 anos e apenas 15% tinham 50 anos e mais de idade. Em 2075 haverá praticamente um empate. Mas nas duas décadas finais do atual século a população prateada (50+) concentrará a maioria dos habitantes brasileiros.
A economia prateada vai avançar, inexoravelmente, no meio urbano. Mas as cidades brasileiras enfrentam várias barreiras de acessibilidade que afetam diretamente a mobilidade da população idosa. Essas barreiras dificultam o acesso dos idosos aos serviços, espaços públicos e ao transporte, comprometendo sua qualidade de vida e autonomia. As principais barreiras de acessibilidade para idosos nas cidades brasileiras são:
1) Calçadas irregulares e mal conservadas: Muitas calçadas nas cidades brasileiras são mal projetadas ou mal conservadas, com buracos, desníveis, obstáculos (como postes e árvores mal posicionadas) e falta de rampas para cadeirantes. Isso representa um risco significativo para idosos, que têm maior dificuldade de locomoção e equilíbrio.
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Solução: As administrações municipais podem criar programas específicos para a reforma e padronização das calçadas, com foco na acessibilidade universal. Isso inclui nivelamento adequado, largura mínima de passagem, instalação de rampas e a remoção de obstáculos. Incentivos fiscais ou regulamentações podem ser implementados para que proprietários de imóveis também sejam responsáveis pela manutenção adequada das calçadas.
2) Falta de acessibilidade no transporte público: O transporte público em muitas cidades do Brasil não é totalmente acessível para idosos. Muitas vezes, os ônibus não têm plataformas adequadas, e as paradas de ônibus carecem de bancos, abrigos, e informações visuais e sonoras adequadas. Além disso, a frequência e o planejamento das rotas podem não atender às necessidades dessa população.
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Solução: Para resolver esse problema, os municípios precisam garantir que toda a frota de transporte público tenha acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida, com rampas, assentos prioritários claramente demarcados e sinalização sonora e visual dentro dos veículos. Também é importante criar paradas de ônibus acessíveis e bem localizadas, com abrigos adequados para proteger do sol e da chuva, além de aumentar a frequência de linhas em áreas onde vivem grandes populações de idosos. Treinamento contínuo dos motoristas e cobradores em relação ao atendimento aos idosos também é essencial.
3) Sinalização deficiente e tempo insuficiente nos semáforos: O tempo de travessia de semáforos geralmente é insuficiente para idosos, que tendem a caminhar mais devagar. Além disso, a sinalização de trânsito pode ser inadequada, com placas mal posicionadas ou faixas de pedestres mal pintadas.
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Solução: As administrações municipais podem ajustar os tempos de semáforos em áreas de maior circulação de idosos, permitindo mais tempo para a travessia segura. A instalação de sinais sonoros para pessoas com deficiência visual também ajudaria a melhorar a acessibilidade. Além disso, a manutenção regular da pintura das faixas de pedestres e da sinalização vertical pode aumentar a visibilidade e a segurança.
4) Espaços públicos inadequados: Parques, praças e calçadões muitas vezes não são projetados pensando nas necessidades dos idosos, com poucos bancos, falta de áreas de sombra, superfícies irregulares e falta de banheiros públicos acessíveis.
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Solução: As prefeituras podem realizar adaptações em espaços públicos, criando áreas de descanso em intervalos curtos, instalando bancos confortáveis e sombreados, e garantindo que os caminhos sejam acessíveis, com superfícies planas e seguras. Banheiros públicos acessíveis e bem distribuídos em áreas de grande circulação também são essenciais para garantir que os idosos possam aproveitar os espaços de lazer.
5) Segurança pública: A insegurança é uma barreira significativa para a mobilidade dos idosos nas cidades brasileiras. O medo de violência e de assaltos impede muitos idosos de sair de casa, especialmente à noite, limitando sua autonomia e interação social.
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Solução: As administrações podem aumentar a presença de policiamento ostensivo em áreas de maior circulação de idosos, como centros comerciais e estações de transporte público. Além disso, a instalação de câmeras de segurança e iluminação pública de qualidade pode ajudar a reduzir a criminalidade e aumentar a sensação de segurança para os idosos.
6) Desigualdade no acesso ao transporte: Muitas vezes, as áreas periféricas, onde vive uma grande parte da população idosa de baixa renda, têm um acesso mais limitado a opções de transporte público de qualidade. Isso agrava o isolamento social e limita o acesso aos serviços de saúde e lazer.
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Solução: As administrações municipais devem expandir as redes de transporte para cobrir melhor as áreas periféricas, assegurando que os idosos em bairros mais distantes também tenham acesso ao transporte público de forma segura e eficiente. Subsídios ou tarifas reduzidas para idosos em situação de vulnerabilidade social também são medidas importantes para garantir a inclusão.
7) Falta de educação e conscientização sobre acessibilidade: Muitos motoristas, pedestres e até mesmo operadores de transporte público não estão conscientes da importância de respeitar as necessidades dos idosos. Atitudes de desrespeito, como estacionar em locais reservados para idosos ou não oferecer o assento prioritário, são comuns.
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Solução: Campanhas de conscientização sobre acessibilidade e direitos dos idosos podem ajudar a transformar essa cultura. Programas de educação no trânsito voltados para o respeito às necessidades de pessoas com mobilidade reduzida e campanhas permanentes nos transportes públicos podem reforçar essa conscientização. Além disso, a aplicação de multas e sanções mais rigorosas para quem desrespeitar essas normas é uma medida que pode reforçar o cumprimento.
Políticas municipais para soluções mais eficientes:
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Planejamento Urbano Inclusivo: Municípios devem criar políticas de planejamento urbano com foco em acessibilidade universal, considerando as necessidades de mobilidade dos idosos desde a fase de projeto. Isso inclui a criação de conselhos consultivos que incluam idosos e especialistas em acessibilidade para planejar novas obras e reformas.
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Criação de Zonas Amigáveis ao Idoso: Algumas cidades podem se beneficiar da criação de zonas específicas, como bairros ou distritos que tenham infraestrutura adaptada para idosos, com calçadas amplas, transporte acessível e segurança reforçada. Essas zonas poderiam servir como modelos a serem expandidos para outras áreas.
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Investimento em Tecnologia Assistiva: As prefeituras podem apoiar a implementação de tecnologia assistiva, como sistemas de transporte sob demanda para idosos e aplicativos de celular que ajudem na navegação pela cidade. Também podem ser promovidos programas de empréstimo de scooters elétricas ou cadeiras de rodas motorizadas para idosos.
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Parcerias Público-Privadas: Estabelecer parcerias entre o setor público e privado pode ajudar a financiar a infraestrutura necessária para melhorar a acessibilidade urbana. Além disso, essas parcerias podem garantir que novos projetos de construção estejam de acordo com as normas de acessibilidade.
As barreiras de acessibilidade nas cidades brasileiras são um desafio significativo para a mobilidade da população idosa. Grandes cidades, como o Rio de Janeiro, já pararam de crescer e vão apresentar decrescimento do número de habitantes. Isto ajuda a redirecionar os investimentos públicos da lógica do crescimento para a lógica da qualidade de vida e do bem-estar.
Com o planejamento urbano inclusivo e justo, reformas específicas em infraestrutura, transporte público acessível e campanhas de conscientização, as novas administrações municipais, que serão eleitas em outubro de 2024, podem enfrentar esses problemas de forma eficaz.
A adoção dessas medidas não só melhora a qualidade de vida dos idosos, mas também beneficia toda a sociedade, promovendo cidades mais acessíveis e inclusivas para todos.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. Brasil 2042: Enfrentando a Nova Revolução Demográfica, Ecodebate, 23/08/2024
https://www.ecodebate.com.br/2024/08/23/brasil-2042-enfrentando-a-nova-revolucao-demografica/
ALVES, JED. As novidades e as surpresas do censo demográfico 2022, Ecodebate, 03/07/2023
https://www.ecodebate.com.br/2023/07/03/as-novidades-e-as-surpresas-do-censo-demografico-2022/
ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século XXI (com a colaboração de GALIZA, F), ENS, maio de 2022
https://prdapi.ens.edu.br/media/downloads/Livro_Demografia_e_Economia_digital_2.pdf
IBGE. Projeções da População, 22/08/2024 https://www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/populacao/9109-projecao-da-populacao.html?edicao=41053&t=resultados
Entrevista à Globonews sobre as novas projeções do IBGE, 24/08/2024
https://www.linkedin.com/feed/update/urn:li:activity:7233119347450290177/
Entrevista à Globonews sobre as novas projeções do IBGE, 31/08/2024
https://www.linkedin.com/feed/update/urn:li:activity:7235626642553925632/
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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