Crise climática não é “normal”
Crise climática não é “normal”, artigo de Montserrat Martins
As novas gerações não conheceram períodos de regularidade climática, mas até há duas décadas, por exemplo, não havia ciclones no Rio Grande do Sul e eram mais raras enchentes ou secas.
Nos últimos anos, se sucedem fenômenos de desequilíbrio, tivemos secas dramáticas que afetaram o abastecimento de água em muitas cidades e arruinaram safras, agora essas semanas de chuva sem parar que levaram a enchentes, mortes e destruição.
Nos anos 70, José Lutzemberger escreveu o Manifesto Ecológico explicando a crise climática, com uma previsão de futuro que, infelizmente, se realizou. Até então eram raros os fenômenos climáticos extremos, a enchente do Guaíba que levou ao muro da Mauá, em Porto Alegre, ocorreu apenas uma vez – e o muro ficou lá, sem utilidade. Na época, se dizia que a Amazônia era o pulmão do planeta, até Lutzemberguer explicar que “a Amazônia não é o pulmão, é o ar condicionado do planeta”.
É difícil explicar algo que, para as novas gerações, já está “normalizado”, como ocorre também com a poluição. Gerações mais antigas chegaram a tomar banho no Guaíba, hoje as pessoas se conformam em ir passear na Orla e ver o rio ali, poluído, como se fosse normal.
O desmatamento e a poluição do ar, normais para a sociedade industrial, alteraram não só o clima no planeta como a qualidade da atmosfera, hoje temos menos proteção contra os raios solares e aumentou a incidência do câncer de pele, bem como todas as outras formas de tumores devido à contaminação do ar, da água e do solo, que se refletem também na contaminação dos alimentos. Na casca dos legumes e frutas, onde estaria a maior concentração de vitaminas, agora está a maior concentração de agrotóxicos.
Hoje, as tragédias que se sucedem geram muito sofrimento com as mortes e geram correntes de solidariedade também, para auxílio às vítimas com as perdas materiais, milhares de famílias que perderam tudo. Mas tudo, hoje, parece inevitável, como se fosse normal. As novas gerações já se acostumaram com os efeitos da crise climática, que é uma realidade desde o início dos anos 2000, quando nos anos 70 era apenas a previsão de gênios da ecologia, como Lutzemberger.
Lutz nunca participou da guerra ideológica entre esquerda e direita (e foi muito criticado por isso), dizia que a causa do desequilíbrio era a sociedade industrial, o exagero do consumismo e a falta de preocupação com o ambiente. Já naquela época se afigurava que países como os Estados Unidos e a China – com dois regimes políticos opostos – eram os maiores poluidores.
As pessoas hoje parecem tão envolvidas na guerra ideológica que esquecem que a crise climática e a poluição atingem a todos – e deveriam ser consideradas questões urgentes e graves, a nos unir para que consigamos ter respostas racionais e rápidas a elas.
A crise climática não é “normal”, porque é efeito da ação humana irracional sobre o planeta, que estamos tornando inabitável para nossa própria espécie – após o que, só as baratas sobreviverão.
Montserrat Martins é Psiquiatra.
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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