Brasil bate recorde de exportações, mas com dependência das commodities
Brasil bate recorde de exportações, mas com dependência das commodities, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
O quadro do comércio internacional mostra que o Brasil possui uma inserção subordinada na ordem internacional e possui uma economia com muita fragilidade
Com o aumento do preço das commodities e a desvalorização cambial, o Brasil bateu o recorde de exportações em 2021 e obteve o maior saldo comercial de todos os tempos, isto depois de uma década de resultados decepcionantes no comércio internacional.
O gráfico abaixo, com dados da Organização Mundial de Comércio (WTO, na sigla em inglês), mostra que o Brasil exportou US$ 280,4 bilhões em 2021, valor bem superior aos US$ 209,1 bilhões de 2020 e do recorde anterior que ocorreu em 2011, com US$ 256 bilhões. Evidentemente, a inflação nacional está relacionada com o aumento das exportações brasileiras e a obtenção do saldo comercial de US$ 61 bilhões.
Mas este “sucesso” brasileiro fica ofuscado quando se compara, por exemplo, com o desempenho do Vietnã. Em 1984, o Brasil exportou US$ 27 bilhões, contra apenas US$ 649 milhões do Vietnã (41,6 vezes mais). Em 2011, quando o Brasil bateu um recorde de exportação de US$ 256 bilhões, o Vietnã exportou US$ 96,9 bilhões (o Brasil exportou 2,6 vezes mais). Mas entre 2016 e 2018 os dois países exportaram, aproximadamente, o mesmo valor. Contudo, em 2019, enquanto as exportações brasileiras caiam, as exportações vietnamitas cresciam e atingiram US$ 262 bilhões. Em 2020, mesmo com todos os problemas gerados pela pandemia da covid-19, as exportações do Vietnã continuaram crescendo e atingiram US$ 280 bilhões, enquanto as exportações do Brasil caíram de US$ 224 bilhões em 2019 e para US$ 209,2 bilhões em 2020. Em 2021, o Brasil exportou US$ 280,4 bilhões e o Vietnã exportou US$ 335 bilhões.
No ano 2000, a corrente de comércio (exportações + importações) do Brasil foi de US$ 113,8 bilhões e a do Vietnã de US$ 30,1 bilhões. Em 2021, estes números passaram para US$ 500 bilhões e US$ 666,2 bilhões. Ou seja, no século XXI a corrente de comércio aumentou 4,4 vezes no Brasil e 22,1 vezes no Vietnã.
O avanço do comércio exterior é essencial para o desenvolvimento econômico de qualquer nação e para se atingir alto padrão de vida populacional. Como mostrou Adam Smith, em 1776, a divisão do trabalho (que implica em geração de emprego e aumento da produtividade da economia) depende da extensão dos mercados nacionais e internacionais. Em função das vantagens comparativas do comércio global, uma maior inserção do país no comércio mundial é essencial para o desenvolvimento nacional e regional.
O quadro do comércio internacional mostra que o Brasil possui uma inserção subordinada na ordem internacional e possui uma economia com muita fragilidade, pois além de perder espaço quantitativo no comércio global, tem piorado a qualidade das exportações ao reduzir o volume de envio de bens manufaturados e aumentado o volume de bens básicos e commodities, o que a espiral de reprimarização e de especialização regressiva do maior país da América Latina.
O gráfico abaixo, da FUNCEX, mostra que, entre janeiro e novembro de 2021, as exportações de produtos básicos alcançaram 51% do total. Desde 2010, pelo menos, essa classe de produtos não tinha uma relevância tão grande na pauta brasileira. Em 2020, por exemplo, os básicos encerraram o ano com uma fatia de 48%.
Portanto, é muito contrastante o ritmo de desenvolvimento dos dois países. O fato é que o Brasil, entre 1900 e 1980, crescia muito, enquanto o Vietnã – que estava dominado pela França e em guerra contra o Japão e os Estados Unidos – se mantinha um país pobre e atrasado. Mas os papeis se inverteram nos últimos 30 a 40 anos. O Brasil teve uma década perdida no período 1981-1990, quando o crescimento do PIB ficou abaixo do crescimento da população, apresentou baixo crescimento econômico entre 1991 e 2010 e teve uma nova década perdida na atualidade (2011-2020). Enquanto isto, do outro lado do mundo, o Vietnã manteve um crescimento do PIB acima de 6% ao ano desde meados da década de 1980. Mantida a tendência das últimas décadas a renda per capita do Vietnã será maior do que a renda per capita brasileira ainda na atual década.
O Brasil vai passar pelos 200 anos da Independência em uma situação dramática, podendo enfrentar o começo de uma terceira década perdida, enquanto o Vietnã se moderniza, se industrializa e aumenta a sua inserção soberana na comunidade internacional. Como disse Millôr Fernandes: “O Brasil tem um enorme passado pela frente”
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. Vietnã emergente e Brasil submergente, Ecodebate, 16/04/2021
https://www.ecodebate.com.br/2021/04/16/vietna-emergente-e-brasil-submergente/
ALVES, JED. Bônus demográfico no Brasil: do nascimento tardio à morte precoce pela Covid-19, R. bras. Est. Pop., v.37, 1-18, e0120, 2020
https://www.scielo.br/pdf/rbepop/v37/0102-3098-rbepop-37-e0120.pdf
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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