O Canadá tem melhores indicadores demográficos, sociais e ambientais do que os EUA
Além de melhores indicadores sociodemográficos o Canadá também possui melhores indicadores ambientais
Artigo de José Eustáquio Diniz Alves
O Canadá tem uma área geográfica de 9.985.000 km², um pouquinho maior do que a área dos Estados Unidos da América (EUA) de 9.867.000 km². Em termos populacionais e econômicos os EUA são muito maiores. Mas os indicadores sociodemográficos do Canadá são melhores.
O gráfico abaixo mostra a população dos EUA e do Canadá de 1950 a 2100. Em 1950, a população canadense era de 13,7 milhões de habitantes e a americana de 154 milhões de habitantes (11,2 vezes maior). Em 2025, a população canadense está estimada em 40,1 milhões e a americana 347,3 milhões (8,7 vezes maior). Para 2100, as projeções indicam que a população canadense será de 53,6 milhões de habitantes e a americana de 421,3 milhões de habitantes (7,9 vezes maior). Portanto, a população do Canadá é bem menor, mas cresce em ritmo um pouco mais rápido do que a dos EUA.
A taxa de fecundidade total (TFT) dos EUA era de 3,1 filhos por mulher em 1950, passou para 1,62 filhos por mulher em 2025 e deve ficar em 1,65 filhos por mulher em 2100. A TFT do Canadá era de 3,4 filhos por mulher, caiu para 1,33 filhos por mulher e deve ficar em 1,49 filhos por mulher, no mesmo período. Portanto, o Canadá tem taxas de fecundidade menores do que as dos EUA, mas possui um saldo imigratório maior e por isto tem um crescimento populacional maior.
A mortalidade infantil era maior no Canadá em 1950, mas está em 3,9 óbitos por mil nascimentos em 2025, abaixo de 4,8 óbitos por mil dos EUA. A expectativa de vida ao nascer (Eo) dos EUA era de 68,1 anos em 1950, passou para 79,6 anos em 2025 e deve ficar em 89,2 anos em 2100. A Eo do Canadá era de 68,1 anos, subiu para 82,9 anos e deve alcançar 91,7 anos, nas mesmas datas. Portanto, o Canadá tem menor mortalidade infantil e maior expectativa de vida. Os indicadores de saúde são melhores no vizinho de cima da América do Norte.
A idade mediana era de 29 anos em 1950 nos EUA, passou para 38,5 anos em 2025 e deve chegar a 45,3 anos em 2100. No mesmo período, a idade mediana do Canadá era 26,7 anos, passou para 40,6 anos e deve alcançar 46,9 anos no final do atual século. Portanto, o Canadá tem um processo de envelhecimento populacional um pouco mais rápido do que o seu vizinho do sul.
O gráfico abaixo mostra, para EUA e Canadá, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que é um indicador sintético que engloba as dimensões da saúde, da educação e da renda dos países. Nota-se que o IDH dos EUA era de 0,875 em 1990, acima do índice do Canadá de 0,861. Mas depois de 2010, o IDH do Canadá ultrapassou o IDH dos EUA. Em 2022, o IDH ficou em 0,935 no Canadá e de 0,927 nos EUA. O Canadá superou o índice pré-pandêmico em 2022 e os EUA não. O Canadá ocupava o 18º lugar no ranking global do IDH e os EUA ocupava o 20º lugar no ranking.
Além de melhores indicadores sociodemográficos o Canadá também possui melhores indicadores ambientais. A Global Footprint Network apresenta uma metodologia que viabiliza o cálculo do déficit ou superávit ambiental, contabilizando o impacto humano sobre o meio ambiente e a disponibilidade de “capital natural” do mundo. A primeira medida, chamada de pegada ecológica, serve para avaliar o impacto do ser humano sobre a biosfera. A segunda medida, chamada de biocapacidade, avalia o montante de terra, água e demais recursos biologicamente produtivos para prover bens e serviços do ecossistema, sendo equivalente à capacidade regenerativa da natureza. Ambas as medidas são representadas em hectares globais (gha).
O gráfico abaixo, do Instituto Global Footprint Network, apresenta os valores da pegada ecológica e da biocapacidade dos EUA de 1961 a 2019, com uma estimativa até 2022. Em 1961, a população americana era de 183 milhões de habitantes, com uma biocapacidade de 1,03 bilhão de gha e uma pegada ecológica de 1,64 bilhão de gha. Portanto, havia um déficit ambiental de 600 milhões de gha. A pegada ecológica aumentou muito até a primeira década do século e já começou a cair. Mas em 2022, com uma população de 341 milhões de habitantes, a pegada ecológica total dos EUA foi de 2,52 bilhões de gha e a biocapacidade era de 1,26 bilhão de gha. Portanto, em 2022, o déficit ambiental absoluto foi de 1,26 bilhão de gha, ou 100% em temos relativo.
O gráfico abaixo apresenta os mesmos dados para o Canadá. Em 1961, a população canadense era de 18,3 milhões de habitantes, com uma biocapacidade de 488 milhões de gha e uma pegada ecológica de 148 milhões de gha. Portanto, havia um superávit ambiental de 348 milhões de gha. Em 2022, com uma população de 39 milhões de habitantes, a biocapacidade foi de 548 milhões de gha e a pegada ecológica total foi de 285 milhões de gha. Portanto, em 2022, houve um superávit ambiental absoluto de 263 milhões de gha, ou 92% em temos relativo.
Em termos per capita, os EUA e o Canadá possuem uma pegada ecológica de 7,5 gha. Mas com uma população de 341 milhões de habitantes, os EUA possuem um déficit ambiental. Já o Canadá com uma população bem menor, de 39 milhões de habitantes, possui um superávit ambiental.
Todos estes dados mostram que o Canadá tem indicadores sociais e ambientais bem melhores do que os dos EUA. Portanto, é fácil entender como a população canadense se recusa a considerar a proposta de Donald Trump de transformar o Canadá no 51º estado americano.
Um pouco de história
Os Estados Unidos já tentaram invadir o Canadá durante a Guerra de 1812, que transcorreu entre 1812 e 1815. Esse conflito envolveu os EUA contra o Reino Unido e suas colônias na América do Norte, incluindo o Canadá. Os EUA declararam guerra ao Reino Unido principalmente por três causas:
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Restrição ao Comércio – O Reino Unido impôs bloqueios que prejudicavam o comércio americano com a França, já que estava em guerra contra Napoleão.
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Impressment – A Marinha Real Britânica recrutava à força marinheiros americanos, alegando que eram desertores britânicos.
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Apoio Britânico aos Indígenas – O Reino Unido apoiava tribos indígenas hostis à expansão dos EUA no Oeste.
Os EUA acreditavam que poderiam facilmente tomar o Canadá, já que a população canadense era bem menor e tinha o apoio de alguns colonos descontentes. No entanto, a invasão falhou em várias frentes: a) Em julho de 2012, tropas americanas cruzaram para o Alto Canadá (atual Ontário), mas foram derrotadas em Detroit e Queenston Heights, uma vez que os britânicos, junto com milícias canadenses e aliados indígenas, repeliram os ataques; b) Em 1813 os americanos tomaram York (atual Toronto), mas não conseguiram manter o controle e houve avanços temporários no Niágara, mas os britânicos retomaram os territórios; c) Em 1814 houve a derrota final dos EUA no Canadá, pois os britânicos e seus aliados expulsaram os americanos do território canadense. Como retaliação, tropas britânicas atacaram Washington, D.C. e incendiaram a Casa Branca.
A invasão americana falhou e o Tratado de Gante (1814) restaurou as fronteiras anteriores à guerra. Esse conflito fortaleceu a identidade nacional do Canadá e consolidou a lealdade à Coroa Britânica, com aumento da soberania canadense.
Duzentos anos depois da primeira tentativa dos EUA de ocupar o Canadá, o atual presidente americano, Donald Trump, ameaça anexar o vizinho do Norte e está impondo tarifas alfandegárias unilaterais em pleno século XXI.
A fronteira internacional entre o Canadá e os Estados Unidos é a mais longa do mundo, com 8.891 km em extensão total. Mas nunca a divisão econômica e política foi tão profunda.
Diante do tarifaço de Donald Trump, o Senado americano votou, em gesto simbólico, uma resolução para bloquear as tarifas alfandegárias contra o Canadá. É um aviso de que as políticas de Donald Trump contra o seu vizinho não são bem-vindas e não fazem sentido nem em termos econômicos e nem políticos.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. O déficit ambiental dos Estados Unidos e o superávit ambiental do Canadá, Ecodebate, 09/08/2013 https://www.ecodebate.com.br/2013/08/09/o-deficit-ambiental-dos-estados-unidos-e-o-superavit-ambiental-do-canada-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. Crescimento demoeconômico no Antropoceno e negacionismo demográfico, Liinc em Revista, RJ, v. 18, n. 1, e5942, maio 2022 https://revista.ibict.br/liinc/article/view/5942/5595
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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