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Artigo

Você já fez cocô no mato?

 

rio contaminado por esgoto

Ensaio de Rosângela Trajano

No Brasil, cerca de mais de cinco milhões de pessoas não têm banheiro em casa e fazem xixi e cocô nos matos.

A região que mais concentra residências sem banheiros é a Nordeste seguida pela do Norte. São pessoas simples que muitas vezes não têm sequer o que comer e suas casas ainda são feitas de taipa e chão de barro.

Conheço lugares onde os banheiros são foras das residências e já cheguei a fazer cocô no mato numa dessas minhas viagens pelo nordeste brasileiro quando fui visitar uma família que não tinha banheiro em casa. Confesso que a sensação não é nada boa. A gente pensa que vem uma cobra nos picar, que um bicho qualquer vai correr atrás da gente com o vestido ou a saia levantados e de cócoras, pronta para uma carreira daquelas, com os matos secos a se balançarem com o pouco de vento que vai e vem.

Se você não sabia, querido leitor, desta informação fique sabendo que muita gente ainda faz cocô dentro dos matos e não é porque queira, mas por pura necessidade. Falta dinheiro para comprar a comida imagine construir um banheiro no quintal ou dentro de casa. Para muitos brasileiros, isso até parece um sonho que nunca se tornará realidade. Acredite! Estamos em meio a uma revolução da tecnologia com a IA entrando nas nossas casas e mudando o nosso jeito de viver enquanto muitos brasileiros ainda correm para o mato pra fazerem as suas necessidades básicas, ou seja, fazer cocô ou xixi.

Não é somente no Nordeste e Norte que há residências sem banheiros sanitários, em outras regiões, mesmo nas mais desenvolvidas podemos ver isso, infelizmente. Falta água potável para o povo beber, rede de esgotos e tudo o que é necessário para uma qualidade de vida digna, como dizia o filósofo italiano Giovanni Pico della Mirandola em sua linda obra “A dignidade do homem” que fala sobre o homem ser a semelhança de Deus e logo poder criar, mas como criar algo sem poder comprar o material necessário para sua construção ou fabricação? O jeito é improvisar com um pedaço de pano, um papelão ou um cercadinho de palha para esconder quem está lá dentro.

Nas comunidades mais carentes as pessoas ainda se limpam depois de fazerem cocô com folhas secas que estão ali perto delas. Não há um cuidado com este povo que tanto luta pela sobrevivência e por dias melhores de um viver sem se parecer com bicho ou outra coisa qualquer.

A falta de banheiros nas residências afeta principalmente as mulheres que moram sozinhas com seus filhos, ou seja, acarretando numa desigualdade de gênero e numa pobreza e falta de higiene menstrual. Muitas dessas mulheres ainda usam como absorvente pedaços de panos velhos que são lavados com água de rios poluídos até mesmo sem sabão para uma limpeza mais profunda.

Então, caro leitor, se você precisar fazer uma viagem ao sertão nordestino onde a pobreza toma conta das famílias, não ache uma coisa absurda se chegar numa casa e pedir para ir ao banheiro e lhe disserem que é preciso ir aos matos, pois na casa não tem nenhum. Às vezes nos oferecem um velho penico de alumínio com um pedaço de papel jornal, mas até o jornal impresso está saindo de circulação! Como faremos para nos limpar depois de cocozados? Fica a questão!

A dica é que você viaje sempre com um rolo de papel higiênico e as mulheres com um pacote de absorvente porque isso é artigo de luxo nos lugares mais pobres do nosso País e tem até gente que nunca viu um negócio desses por incrível que pareça.

Esse povo pobre que sofre para sobreviver com dignidade mesmo sabendo que é um direito seu já se acostumou a fazer cocô no mato, mas e você? Se acostumaria com uma vida dessa? Reflita um pouco sobre a situação de bem na hora do seu cocô aparecer uma onça pintada ou uma cobra e você ter que correr, não é para rir, mas para reivindicarmos uma vida melhor para quem vive de sonhos e já ouviu alguém dizer por alto que existe banheiro com vaso sanitário de luxo! Será mesmo que o seu é assim, querido leitor?

Rosângela Trajano, Colunista do EcoDebate, é poetisa, escritora, ilustradora, revisora, diagramadora, programadora de computadores e fotógrafa. Licenciada e bacharel em filosofia pela UFRN e mestra em literatura comparada também pela UFRN. É pesquisadora do CIMEEP – Centro Internacional e Multidisciplinar de Estudos Épicos. Com mais de 50 (cinquenta) livros publicados para crianças, ministra aulas de Filosofia para crianças na varanda da sua casa, de forma voluntária. Além disso, mora pertinho de um mangue aonde vai todas as manhãs receber inspiração para poetizar.

 
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
 

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