Decrescimento populacional com prosperidade social no Japão
O Japão está buscando se adaptar para a nova realidade da mudança da estrutura etária e para o aproveitamento da economia prateada
Artigo de José Eustáquio Diniz Alves
Em 1945 o Japão foi derrotado na Guerra e se tornou o único país do mundo a sofrer o ataque de duas bombas atômicas, nas cidades de Hiroshima e Nagasaki. O Japão saiu destroçado da Segunda Guerra, mas conseguiu uma grande recuperação nos últimos 80 anos.
A população japonesa era de 86,4 milhões de habitantes em 1950 e cresceu até o pico de 128,2 milhões de habitantes em 2009. A queda das taxas de fecundidade começou logo após o fim da guerra e, nas décadas de 1950 a 1980, o Japão pode contar com uma janela de oportunidade demográfica que foi fundamental para o “milagre econômico” do país, para a eliminação da pobreza e para transforma o país do Sol Nascente em uma potência econômica global.
Mas nestes mesmos 80 anos o Japão se tornou o país com a estrutura etária mais envelhecida do mundo. A idade mediana da população japonesa era de 21,3 anos em 1950, passou para 40,8 anos no ano 2000 e chegou a 50 anos em 2025. Ou seja, metade da população japonesa tem mais de 50 anos em 2025, com uma expectativa de vida ao nascer de 85 anos.
A população japonesa que estava em 117 milhões de habitantes em 1980, atingiu o pico em 2009 com 128,2 milhões, começou a decrescer em 2010 e deve ficar em 121 milhões de habitantes em 2029. Mas embora o Japão já apresente uma estrutura etária muito envelhecida, com um declínio da população, a renda per capita, em preços constantes, em poder de paridade de compra (ppp), tem crescido no período. A renda per capita japonesa era de US$ 22,3 mil em 1980, subiu para US$ 36,6 mil em 2009, chegou a US$ 43,3 mil em 2024 e deve alcançar US$ 46 mil em 2029, segundo as projeções do FMI, conforme mostra o gráfico abaixo.
No pensamento convencional, o envelhecimento populacional conjugado com o decrescimento demográfico é interpretado como “armadilha gerontológica” ou “inverno demográfico” e seria o fim da linha para o desenvolvimento humano de qualquer nação. Contudo, o exemplo do Japão mostra que pode haver decrescimento da população com prosperidade social.
O Japão tem implementado diversas iniciativas para aproveitar o potencial da geração prateada (50+), promovendo uma sociedade que valoriza a experiência e a contribuição contínua dos idosos. Algumas das principais abordagens são:
1. Extensão da Vida Ativa e do Trabalho Pós-Aposentadoria
O governo japonês tem incentivado os idosos a permanecerem no mercado de trabalho por mais tempo, promovendo políticas que permitem a extensão do período de trabalho. As empresas são incentivadas a reter trabalhadores com mais de 60 anos e a criar condições de trabalho mais flexíveis, como meio período, horários flexíveis e trabalho remoto.
2. Requalificação e Treinamento de Idosos
Programas de requalificação e treinamento para idosos têm sido desenvolvidos para permitir que continuem a contribuir economicamente. O governo japonês oferece cursos de educação continuada e treinamentos em novas áreas, como tecnologia e serviços, permitindo que eles adquiram habilidades atualizadas.
3. Envolvimento em Atividades Voluntárias
Muitos idosos no Japão participam ativamente em atividades de voluntariado, desempenhando papéis importantes em suas comunidades, como cuidadores, mentores e educadores. Programas comunitários incentivam o engajamento de idosos em iniciativas locais, o que, além de beneficiar a sociedade, promove o bem-estar social e mental desses indivíduos.
4. Tecnologia e Inovação
O Japão também está à frente na aplicação de tecnologia para apoiar a população idosa. Desde robôs de assistência até serviços de saúde digital, o país tem investido em inovação para ajudar os idosos a manterem sua independência por mais tempo. A tecnologia também facilita o trabalho de cuidadores e familiares.
5. Promoção da Saúde e Prevenção de Doenças
Há um grande foco na promoção da saúde entre os idosos, com programas preventivos que visam reduzir a dependência de cuidados médicos. Programas de exercícios físicos, acompanhamento nutricional e consultas regulares são incentivados. Além disso, há um esforço em melhorar os serviços de saúde domiciliar e comunitária, para que os idosos possam permanecer em suas casas por mais tempo.
6. Planejamento Urbano e Inclusão Social
Para adaptar-se ao envelhecimento da população, o Japão tem investido em um planejamento urbano inclusivo, que facilita o acesso a serviços e infraestrutura por parte dos idosos.
Cidades estão sendo adaptadas para serem mais amigáveis, com transporte acessível, habitação adaptada e espaços públicos que atendam às necessidades dessa faixa etária.
Essas iniciativas fazem parte de uma estratégia mais ampla de “envelhecimento ativo”, promovida pelo Japão para garantir que a população idosa continue a desempenhar um papel vital na sociedade e na economia.
O Japão conseguir enriquecer simultaneamente ao envelhecimento populacional. O país do Sol Nascente aproveitou bem o 1º bônus demográfico (o bônus da estrutura etária). Mas a janela de oportunidade demográfica já se fechou e o envelhecimento populacional é a nova realidade, embora não seja o fim da linha para o progresso social.
O Japão tem buscado liderar a discussão sobre outros bônus demográficos. O 2º bônus demográfico (ou bônus da produtividade) é um conceito que se refere ao impacto positivo que o aumento dos níveis de escolaridade e da produtividade têm sobre a economia e os salários dos trabalhadores.
Em termos simples, ele ocorre quando os trabalhadores produzem mais bens e serviços por hora de trabalho, o que pode resultar em melhores salários, maior competitividade das empresas e crescimento econômico sustentável.
O Bônus da Produtividade permite:
a) Aumento da eficiência, quando as empresas e os trabalhadores se tornam mais eficientes, utilizando menos recursos para produzir a mesma quantidade ou mais, gerando um excedente econômico. A produtividade pode ser aumentada por meio de inovações tecnológicas, melhores práticas de gestão, qualificação dos trabalhadores ou investimentos em capital,
b) Mais Investimentos, quando o aumento da produtividade atrai mais investimentos, tanto internos quanto externos e as empresas que são mais produtivas conseguem gerar maiores retornos sobre os fatores de produção (capital e trabalho).
O 3º bônus demográfico, ou dividendo prateado, é um conceito que se refere ao aproveitamento do potencial produtivo e criativo das gerações prateadas (de 50 anos e mais de idade). O artigo “Population Aging and the Three Demographic Dividends in Asia” (Ogawa et al, 2021) mostra que o Japão – o país mais envelhecido do mundo – tem tomado uma série de medidas para reduzir a escassez de recursos humanos no país.
Os autores usaram um modelo de simulação para avaliar a capacidade de trabalho inexplorada para idosos japoneses. A “capacidade de trabalho não explorada” foi definida como uma folga entre a probabilidade de emprego real e a prevista.
Desta forma, o Japão está buscando se adaptar para a nova realidade da mudança da estrutura etária e para o aproveitamento da economia prateada (“Silver economy”), que se refere ao conjunto de atividades econômicas que abarcam as contribuições, as necessidades e as demandas da população idosa, especialmente de 50 anos e mais de idade.
Aproveitando o “bônus prateado”, o Japão pode garantir o progresso do bem-estar social, mesmo no cenário de redução da população durante o século XXI.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. O envelhecimento populacional e a economia prateada, Ecodebate, 04/12/2024
Naohiro Ogawa, Norma Mansor, Sang-Hyop Lee, Michael R.M. Abrigo, and Tahir Aris. Population Aging and the Three Demographic Dividends in Asia. Asian Development Review, vol. 38, no. 1, pp. 32–67, 2021 https://direct.mit.edu/adev/article/38/1/32/98309/Population-Aging-and-the-Three-Demographic
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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