O sonho da casa própria e os desafios da vida urbana
Vista panorâmica do Oceano Atlântico (ao fundo) a partir da Praia do Itaguá, Ubatuba, Litoral Norte do Estado de São Paulo, por onde passa o Trópico de Capricórnio (marco no primeiro plano). Cerca de 6.500 km, em linha reta, encontra-se a costa da África. Foto de 03/02/2025. Autor: Heraldo Campos.
Reflexões sobre a casa própria, aluguel e a urbanização crescente. Como conflitos e a alta densidade populacional impactam a qualidade de vida?
Artigo de Heraldo Campos
O sonho da cada própria. Nunca tive. Sempre pensei que com um bom emprego, com carteira assinada, era possível morar numa casa ou apartamento alugado e, quando, outra possibilidade de melhorar de qualidade de vida junto com a família surgisse, “romper um contrato de aluguel de um apartamento, se a coisa não vai bem” [1], não era muito complicado.
Nadando meio contra a maré da minha geração e das anteriores, e dos profissionais com quem trabalhei nos anos 70/80 do século passado, era aconselhado para, num determinado momento, adquirir um imóvel. A última carteira assinada que tive lá se vão uns 25 anos (uma geração!) e um modesto apartamento comprado uns 20 anos atrás, após viver em várias cidades e moradias “nessa longa estrada da vida geológica” [2].
Ressalta-se que poucas dessas passagens em diferentes lugares foi um paraíso, porque a vida profissional e familiar sempre foram levadas com muita perseverança e privilegiando o bom convívio com as novas pessoas que iam sendo conhecidas no meio do caminho. Porém, observa-se nos últimos tempos que, segundo informações de diferentes fontes, parece que a coisa não é muito fácil para quem tem casa própria e deseja uma mudança.
Em várias partes desse nosso planeta, aglomerações urbanas que começam a ter mais e mais edificações espremidas uma contra as outras, por motivos de conflito na ocupação do espaço, associado as diferenças políticas e sociais, geralmente tende a dar bolo e, salvo melhor avaliação, dentro das próprias comunidades como, por exemplo, em condomínios (horizontais ou verticais), onde as tensões podem se alastrar.
Numa situação utópica, será que espalhar mais as pessoas, para que cada uma possa ter a sua hortinha, o seu canteiro de flores, o seu cão de estimação, etc., etc., não seria mais interessante e menos conflituoso? Aqui me faz lembrar o seguinte trecho da música cantada pela Elis Regina: “Eu quero uma casa no campo / Onde eu possa compor muitos rocks rurais / E tenha somente a certeza / Dos amigos do peito e nada mais”. [3].
Essa saída pode ser uma visão simplista demais mas, os conflitos, as guerras, os genocídios, são mais fáceis de proliferarem quando existe alta concentração de pessoas numa mesma faixa de território.
Sem a pretensão de fazer aqui um rabisco de tratado filosófico ou sociológico sobre o assunto, mesmo porque não temos lastro de vida universitária para isso, vai lá saber se não pode ser uma pequena contribuição a sugestão de um espalhamento no planeta terra?
Talvez, muito talvez mesmo, desde que não seja ambientalmente predatório, ceifando vidas, para atender interesses mesquinhos de determinados grupos econômicos, como vem ocorrendo há séculos, a partir dos grandes impérios colonizadores ao longo da história humana.
Para encerrar, nesse mundo capitalista, a procura e a demanda para imóveis alugados, deve ser tanto justa para o locador como para o locatário, visando atender de forma equilibrada ambas as partes no possível. A minha casa própria é o Planeta Terra.
“Morava numa casa em Botafogo, a mesma casa onde tinha nascido e que agora era a última casa da rua, espremida entre dois grandes edifícios, na frente de um terceiro maior ainda, atrás de outro ainda maior.” (Luís Fernando Veríssimo) [4].
Fontes
[1] “Passado duvidoso” artigo de 31/01/2025.
https://cacamedeirosfilho.blogspot.com/2025/01/passado-duvidoso.html
[2] “Por onde a água passa” artigo de 13/12/2024.
https://cacamedeirosfilho.blogspot.com/2024/12/por-onde-agua-passa.html
[3] “Casa no campo” de autoria de José Rodrigues Trindade (Zé Rodrix) e Luis Otavio de Melo Carvalho (Tavito).
[4] Trecho da crônica “O homem sitiado” de Luís Fernando Veríssimo, publicada na 11ª edição pela Editora Ática, em 2004, no livro “O nariz”, página 83.
*Heraldo Campos é geólogo (Instituto de Geociências e Ciências Exatas da UNESP, 1976), mestre em Geologia Geral e de Aplicação e doutor em Ciências (Instituto de Geociências da USP, 1987 e 1993) e pós-doutor em hidrogeologia (Universidad Politécnica de Cataluña e Escola de Engenharia de São Carlos da USP, 2000 e 2010).
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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