Eventos climáticos extremos afetam mais o Sul Global
O aumento do número e da intensidade de eventos climáticos extremos, como inundações, secas, tempestades e ondas de calor, está se tornando cada vez mais frequente em várias partes do mundo.
Por Pamela Gouveia, Instituto ClimaInfo
Um levantamento mostra que algumas regiões já estão vendo esses desastresse tornarem o “novo normal”. O Índice de Risco Climático 2025 da organização ambiental Germanwatch mostra que os países do Sul Global foram especialmente impactados pelas consequências desses fenômenos nos últimos 30 anos.
O índice analisa o impacto de eventos climáticos extremos ao longo do tempo, classifica os países conforme os efeitos econômicos e humanos (fatalidades, pessoas afetadas, feridas e desabrigadas), posicionando os mais afetados no topo. Entre 1993 e 2022, o mundo registrou mais de 9.400 desastres climáticos. Eles resultaram na morte de quase 800 mil pessoas e causaram perdas econômicas de 4,2 trilhões de dólares (ajustados pela inflação). Enquanto países como China, Índia e Filipinas foram atingidos por eventos climáticos recorrentes, nações como Dominica, Honduras, Mianmar e Vanuatu foram os mais afetados por eventos extremos. Três países da União Europeia – Itália, Espanha e Grécia – figuram entre os dez mais atingidos.
A chefe da Divisão de Política Climática Internacional da Germanwatch, Laura Schaefer, observou que, caso os dados dos países do Sul Global fossem tão completos quanto os de nações do Norte Global, os impactos econômicos e humanos seriam ainda mais alarmantes. “Estamos entrando em uma fase crítica e imprevisível da crise climática, o que agravará os conflitos, desestabilizará sociedades e afetará negativamente a segurança humana no mundo todo.”
Amazônia em chamas
O relatório alerta para o “novo normal” dos eventos climáticos extremos, destacando o grande número de ocorrências em 2024 como uma fase preocupante da crise. “Na Amazônia, os piores incêndios florestais desde 2005 destruíram 22 milhões de hectares, uma área quase do tamanho do Reino Unido. Chuvas torrenciais e inundações no Brasil, que será o anfitrião da COP30, deslocaram mais de 580.000 pessoas e causaram inúmeras mortes”, aponta o estudo.
A Terra registrou seu dia mais quente de todos os tempos em 22 de julho de 2024, e o ano de 2024 foi o mais quente já registrado, sendo também o primeiro a ultrapassar a temperatura média de 1,5°C (Copernicus, 2025). Os anos de 2023 e 2024 foram, de longe, os dois com as mais altas temperaturas globais de superfície do mar já registradas. O relatório cita ainda o Fórum Econômico Mundial, que classificou os eventos climáticos extremos como o segundo risco global mais urgente para o curto prazo em 2025, com previsões de agravamento e se tornando a principal ameaça da próxima década.
“À medida que o mundo se aproxima do limite de +1,5°C mais rapidamente do que o antecipado pelo mais recente relatório do IPCC, os impactos e riscos irreversíveis se tornam cada vez mais evidentes, afetando de forma desproporcional as populações e países mais vulneráveis”, diz o estudo.
Schaefer ressalta a crescente relação entre a crise climática e a segurança global. “A crise climática está se tornando um risco crescente para a segurança global e deve ser enfrentada com ações multilaterais ousadas. Os líderes da Conferência de Segurança de Munique não podem discutir segurança sem abordar a mudança climática”, afirmou.
O novo índice de risco climático mostra que a falta de ações adequadas em mitigação e adaptação está resultando em impactos graves, inclusive em países de alta renda. “Países ricos e emissores de grandes quantidades de gases de efeito estufa precisam entender a urgência de acelerar os esforços de mitigação”, afirmou David Eckstein, conselheiro sênior para Finanças Climáticas da Germanwatch e coautor do índice. Ele alerta que as perdas nos últimos 30 anos, de 4,2 trilhões de dólares, são comparáveis ao PIB da Alemanha. “Quanto menos investirmos agora em mitigação e adaptação, mais altos serão os custos humanos e econômicos no futuro”, disse.
COP30: hora da virada para adaptação
A próxima cúpula climática no Brasil deve abordar a falta de financiamento climático adicional para apoiar os mais vulneráveis em suas capacidades de adaptação e de compensação de perdas e danos. “Os países mais vulneráveis são desproporcionalmente afetados pelos impactos da mudança climática, em parte devido às suas limitações financeiras e técnicas para se adaptar e gerenciar perdas e danos. Simultaneamente, para evitar mais perdas e danos, os países precisam urgentemente intensificar suas ações de mitigação com novas contribuições nacionalmente determinadas para ficar abaixo ou o mais próximo possível de 1,5°C de aquecimento”, disse Lina Adil, assessora de política para Adaptação e Perda & Dano da Germanwatch e coautora do índice.
O Índice de Risco Climático revela que, em certos casos, como em Dominica, as perdas causadas por um único evento climático extremo podem ser várias vezes maiores que o PIB de um país. Na China, uma grande quantidade de pessoas foi afetada por inundações, tufões e secas. Já na Itália, ondas de calor severas, especialmente em 2003 e 2022, causaram mais de 38.000 mortes.
Vera Kuenzel, assessora sênior para Adaptação e Direitos Humanos da Germanwatch, lembra que os dados do índice deixam claro que todos os países precisam melhorar sua capacidade de gerenciar riscos climáticos. “É necessário que os países mais vulneráveis recebam o apoio necessário para enfrentar os desastres climáticos com mais eficácia”, afirma.
Notas:
Sobre o Índice de Risco Climático
Desde 2006, o Índice de Risco Climático avalia o número de mortes, pessoas afetadas e danos econômicos causados por eventos climáticos extremos, tanto em números absolutos quanto relativos à população ou ao PIB. A Germanwatch revisou a metodologia do índice, que agora é compilado com base em dados da Base de Dados Internacional de Desastres (EM-DAT) e informações socioeconômicas do Fundo Monetário Internacional (FMI). Embora não seja possível atribuir diretamente os danos causados a eventos climáticos ao aquecimento global, há um consenso crescente de que a mudança climática tem um impacto significativo na frequência e intensidade desses eventos. Em muitos casos, estudos de atribuição podem agora determinar precisamente o papel da mudança climática em fenômenos extremos.
Sobre a Germanwatch
A Germanwatch é uma organização não governamental independente, focada em desenvolvimento sustentável, meio ambiente e direitos humanos, atuando como think tank desde 1991. Defende o desenvolvimento global sustentável, baseado em equidade social, respeito à natureza e justiça econômica.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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