Transição demográfica e transição energética fez a China atingir o pico das emissões
A análise mais recente mostra que as decisões políticas tomadas em 2025 afetarão fortemente a trajetória de emissões da China nos próximos anos
Artigo de José Eustáquio Diniz Alves
A China tinha 544 milhões de habitantes em 1950 e atingiu 1,41 bilhão de habitantes em 2021. O gigante asiático tinha um Produto Interno Bruto (PIB) menor do que o brasileiro até 1987 e em 2024 tinha uma economia mais de 8 vezes maior. Em termos econômicos, a China foi o país que mais cresceu no mundo, em menor espaço de tempo.
Em consequência houve um grande crescimento das emissões de CO2. Em meados do século passado, a China emitia apenas uma fração das emissões de CO2 da União Europeia e dos EUA. As emissões de CO2 da China representavam apenas 1,3% do total global em 1950, passou para 5,4% em 1970, ultrapassou o nível das emissões da União Europeia no ano 2000, ultrapassou o nível das emissões dos EUA na primeira década do século XXI, atingiu 26% do total mundial em 2010 e 32% do total em 2023. Portanto, a China é líder isolada nas emissões de CO2, emitindo mais do que a soma da União Europeia e dos EUA, conforme mostra o gráfico abaixo.
Porém, recentemente, um aumento recorde na produção de energia renovável manteve as emissões de dióxido de carbono (CO2) da China abaixo dos níveis do ano anterior nos últimos 10 meses de 2024. Análise do instituto Carbon Brief, com base em números oficiais e dados comerciais, mostra que o fim da recuperação da China da Covid zero em janeiro e fevereiro, combinado com um crescimento anormalmente alto na demanda por energia, impediu que as emissões de CO2 caíssem em 2024 no geral. Embora a produção de CO2 da China em 2024 tenha crescido em cerca de 0,8% ano a ano, as emissões foram menores do que nos 12 meses até fevereiro de 2024.
O artigo do Carbon Brief ainda indica que as emissões de CO2 da China cresceram 0,6% ano a ano no quarto trimestre, à medida que as esperanças de medidas de estímulo aumentaram o uso de carvão industrial e a demanda por petróleo. Além disso, a energia eólica e solar ficaram aquém dos níveis esperados no último trimestre de 2024, provavelmente como resultado da negação de acesso à rede em favor da energia a carvão, que ficou estável ano a ano.
O crescimento da capacidade de energia limpa acelerará em 2025, à medida que projetos eólicos, solares e nucleares de grande escala correm para terminar antes do fim do 14º período do plano quinquenal.
O crescimento da demanda industrial por eletricidade desacelerou desde o verão de 2024 e o crescimento total da demanda por energia diminuiu no quarto trimestre do ano.
Espera-se que esses fatores levem a produção de energia a carvão da China a cair em 2025, o que teria importância internacional para os mercados de energia e emissões. No entanto, outro período de crescimento da demanda industrial impulsionado por esforços de estímulo do governo pode mudar esse quadro, principalmente se a crise imobiliária se reverter.
A análise mais recente mostra que as decisões políticas tomadas em 2025 afetarão fortemente a trajetória de emissões da China nos próximos anos. Em particular, os novos compromissos da China sob o Acordo de Paris e o próximo plano quinquenal do país estão sendo preparados em 2025.
O importante a destacar é que as emissões chinesas estagnaram desde fevereiro de 2024. As emissões se estabilizaram em março-dezembro de 2024, pois o crescimento do fornecimento de eletricidade limpa cobriu todo o crescimento da demanda de eletricidade, enquanto as emissões da produção de cimento e aço caíram devido à contração da demanda por materiais de construção, como mostrado na figura abaixo.
O pico das emissões de CO2 na China é uma boa notícia para o mundo, mas é preciso saber qual vai ser o ritmo de queda nos próximos anos até atingir as emissões líquidas zero.
O fato é que o pico das emissões só foi alcançada em função da transição demográfica e da transição energética A população da China alcançou o máximo populacional em 2021, com 1,426 bilhão de habitantes e deve decrescer para 633,4 milhões em 2100. Ou seja, a China deve perder 793 milhões de habitantes entre 2021 e 2100 (isto é mais do que toda a população da América Latina que foi de 656,6 milhões de habitantes em 2023).
Entre 1921 e 2100 a população chinesa vai decrescer em cerca de 1% ao ano. Isto quer dizer que mesmo se o PIB chinês ficar estagnado (crescimento econômico zero) entre 2022 e 2100, a renda per capita do país dobraria de tamanho, sem aumento geral da economia. Com o avanço da transição energética a quantidade de emissões de CO2 por unidade de produção tende a cair.
Isto quer dizer que o bem-estar social na China pode ser alcançado com menor crescimento econômico e com menores emissões de gases de efeito estufa.
Evidentemente, várias outras ações são importantes para mitigar a crise climática, como o aumento da área verde (reflorestamento), melhoria da infraestrutura econômica, construção de cidades mais eficientes e resilientes, melhoria da reciclagem, avanço da economia circular e maior informatização na produção e comércio de bens e serviços.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. China e Índia lideram o crescimento das emissões de CO2 no século XXI, Ecodebate, 15/05/2024 https://www.ecodebate.com.br/2024/05/15/china-e-india-lideram-o-crescimento-das-emissoes-de-co2-no-seculo-xxi/
ALVES, JED. Crescimento demoeconômico no Antropoceno e negacionismo demográfico, Liinc em Revista, RJ, v. 18, n. 1, e5942, maio 2022 https://revista.ibict.br/liinc/article/view/5942/5595
Carbon Brief. Analysis: Record surge of clean energy in 2024 halts China’s CO2 rise, 27/01/2025
https://www.carbonbrief.org/analysis-record-surge-of-clean-energy-in-2024-halts-chinas-co2-rise/
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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