Contradições da COP30 na Amazônia: feita de concreto, ferro e asfalto
A forma como Belém está se preparando para a COP30 parece refletir uma visão de desenvolvimento que já se mostrou ultrapassada
Artigo de José de Ribamar Bento da Silva Júnior¹
A Amazônia. Maior floresta tropical do mundo. Símbolo global da luta pela preservação ambiental. Lugar de debates urgentes sobre o futuro do planeta. Mas, enquanto o mundo clama por soluções para estancar as mudanças climáticas, Belém, a cidade que sediará a COP30 em 2025, parece estar escrevendo um roteiro contraditório.
Vamos imaginar: uma conferência que tem como tema central a proteção da natureza, mas cuja preparação da cidade se resume a canteiros de obras repletos de concreto, ferro e asfalto. Materiais que, não exatamente “dialogam” com a exuberância da floresta que cerca a cidade. A arborização e as praças públicas, aqueles espaços verdes, parecem ter sido relegados ao esquecimento.
Ninguém nega que a infraestrutura é necessária. Belém vai receber milhares de pessoas – delegados, ativistas, jornalistas – e precisa estar à altura do evento. Mas a pergunta que não quer calar é: por que tanto concreto, aço e asfalto, e tão pouca integração com o bioma que a Amazônia oferece? Por que não pensar em obras que valorize a natureza, que utilizem materiais sustentáveis e técnicas que minimizem o impacto ambiental?
Obras da COP30, em Belém, PA. Foto: Agência Gov | Via Secom
A Amazônia não será um mero cenário. Ela é a protagonista dessa história. E, no entanto, a forma como Belém está se preparando para a COP30 parece refletir uma visão de desenvolvimento que já se mostrou ultrapassada – aquela que mede o progresso pela quantidade de concreto derramado e pela imponência das estruturas construídas. Uma lógica que, em outras partes do mundo, já provou ser insustentável. Aqui, na Amazônia, parece uma amarga ironia.
Cadê a arquitetura bioclimática, que aproveita os recursos naturais para reduzir o consumo de energia? Cadê as ciclovias, os transportes públicos eficientes, as soluções que priorizam a mobilidade sustentável? E por que não utilizar materiais locais e técnicas tradicionais, aquelas que as comunidades amazônicas já dominam há séculos? Essas escolhas não só reduziriam o impacto ambiental, mas também valorizariam o conhecimento tradicional – algo que, em tese, a COP deveria celebrar.
A COP30 tem tudo para ser um marco na história da Amazônia. Mas, para isso, precisa ir além dos discursos. Precisa refletir, na prática, os valores que defende. A Amazônia merece mais do que concreto, ferro e asfalto. Merece um desenvolvimento que dialogue com sua essência, que respeite sua biodiversidade e que valorize os saberes das populações que nela vivem.
Enquanto as obras avançam, uma pergunta ecoa: estamos construindo um futuro sustentável ou apenas repetindo os erros do passado, agora encobertos pela narrativa de um evento ambiental?
A resposta a essa pergunta não definirá apenas o sucesso da COP30. Ela definirá o futuro da Amazônia – e, por extensão, o futuro do planeta.
A vida, em todas as suas formas, agradece.
¹Doutorando da UFPA/NUMA/PPGDAM. Mestre em Ciências Ambientais e Desenvolvimento Sustentável (UFPA/ITV). MBA em Gestão Ambiental pela Fundação Getúlio Vargas. Psicanalista pelo Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica. Graduado em Engenharia Florestal pela Universidade Federal Rural da Amazônia.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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Adorei.