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Artigo

As plantas também são tímidas

 

artigo de opinião

Eu também não sei o que é mais ou menos, só sei que existo e amo plantas e árvores, e por isso respeito a sua timidez

Ensaio de Rosângela Trajano

Pessoas tímidas iguais a mim tremem de medo quando alguém se aproxima delas. Gaguejam no falar em público e ficam coradas ao receber um elogio de estranhos, assim também acontece com as plantas. Muitas delas até demonstram as suas timidezes se fechando todas quando são tocadas e a ciência pode até querer explicar com a razão e o método científico isso que acontece com elas, mas eu fico com a explicação poética e divina que as musas me deram e que aqui me trazem hoje.

Sim, eu não sei se vocês já perceberam ou até mesmo se já aconteceu com vocês de tocar numa plantinha e ela se encolher toda. Parece uma menina em apuros. Na verdade, ela está tão tímida e assustada diante de você que não sabe como se comportar, é preciso dizer à plantinha que não tenha medo e de que você não vai machucá-la porque a todo toque seu mais assustada ela vai ficar, correndo o risco até mesmo de morrer.

Há plantas que demonstram isso claramente, mas eu quero dizer para você que a maioria delas, mais de 90% das plantas são tímidas. Poucas são as que gostam de ser ousadas e amostradas com as suas folhas a se balançarem junto com os galhos. As plantas gostam mesmo é de ficar quietinhas nos seus jardins e detestam vasos apertados.

Se você for uma das pessoas que gosta de criar plantinhas dentro de casa cuide delas com carinho. Primeiro, respeite a sua individualidade e subjetividade não a tocando sem ter permissão para isso. Sim, as plantas podem nos permitir que as toquemos porque elas também têm sensações e emoções.

As plantas são capazes de adoecerem se tiverem a sua privacidade invadida, pois cada uma delas tem seus segredos e jeito de ser que não gostariam de mostrar para qualquer um, por isso se receber uma visita em sua casa não saia mostrando as suas plantas sem antes pedir-lhes licença. Respeite-as e se respeite também já que as plantas são cuidadas por você e a visita pode achar que elas estão feias e amedrontadas por falta de cuidados quando tudo isso não passa de timidez acima do normal.

A timidez não é uma doença. Faz parte do jeito de ser de cada pessoa ou, no nosso caso, plantinha. Se fechar para o mundo ao primeiro toque de alguém não quer dizer que você não queira ser amada ou receber elogios, claro que não! Quer dizer que você se preocupa consigo, com o que o outro pensa de você e com as suas intenções.

Muitas plantinhas vivem nos canteiros das ruas das grandes cidades em total abandono, parecidas com as pessoas em situação de rua, sequer têm o que comer ou onde dormir. Não são protegidas do sol ou da chuva. Vivem ao Deus dará. Seus espinhos as machucam e vai ou vem alguém as pisam com força. Essas plantas são as que mais precisam de cuidados e são as mais tímidas e assustadas porque seus traumas são tantos que não se corrigem com uma simples limpeza de homens não treinados para lidar com plantinhas assustadas. É preciso cuidar, saber respeitar, experimentar o carinho no momento exato e a permissão de ser tocada. Você não gostaria de ser tocado sem permitir.

Estou querendo falar, na verdade, da plantinha conhecida popularmente como dormideira, dorme-dorme, sensitiva, maria-fecha-a-porta, não-me-toques ou dorme-joão, você já deve ter cruzado com uma plantinha que se fecha ao encostar nela. Estou falando da Mimosa pudica L., uma espécie subarbustiva, nativa da América do Sul. Pertencente à família Fabaceae, subfamília Caesalpinioideaea mesma do pau-brasil.

Desde sua descoberta chamou a atenção pela sua habilidade em mover rapidamente as folhas ao ser tocada, fechando os folíolos e baixando a folha. Por essa razão, foi nomeada por Linné com o epíteto específico de pudica. Que quer dizer, mesmo em português, “tímida”, “envergonhada”. E essa timidez pede respeito de você cidadão que passa pelas ruas e vê uma “Não-me-toques” quietinha no seu canto. Tudo o que ela quer é viver sossegada sem intrusos a mexerem com ela, a lhe perturbarem a paz, a roubarem o seu silêncio da alma, sim, porque planta também tem alma e sente o mesmo que sentimos.

Eu me lembro bem de quando era mais jovem que chegava num baile e ficava no canto da parede meio tímida e desconfiada olhando as pessoas dançarem enquanto eu não dava um passo. Achava que não sabia dançar ou que ia fazer feio e todos ririam do meu jeito engraçado no meio do salão. Assim acontece com as plantinhas não somente a “Não-me-toque”, mas todas elas temem fazer feio diante do público. Elas querem se apresentar bonitas e cheirosas para que sejam sempre visitadas e amadas por você.

Se avistar uma plantinha “Não-me-toque” não a perturbe. Seja cauteloso. Converse com ela antes de receber a autorização para tocá-la e dizer-lhe palavras bonitas. Tenha paciência com ela. Não a machuque. Ela também é um ser vivo que precisa de cuidados. Em toda a minha vida eu vivi perto das plantas dentro e fora de casa e conheci muitas delas que eram tão tímidas ao ponto de quando eram tocadas por um estranho suas folhinhas caírem ou murcharem completamente.

Você já ouviu falar em mau-olhado? Pois bem, a minha bisavó curava as pessoas com três raminhos de plantas tiradas do nosso jardim e elas logo murchavam quando as pessoas estavam com algum problema sério emocional ou físico. As plantas sentem as nossas energias negativas, transmitimos para o meio ambiente aquilo que somos e sentimos, por isso devemos ter cuidado ao tocar as plantinhas ou ao abraçarmos uma árvore mesmo frondosa e exuberante ela pode vir a morrer se não estivermos bem emocionalmente.

Eu amo plantas e sempre as peço licença para iniciar uma conversa com elas. Sim, também são boas ouvintes e conselheiras. Mesmo sem as entendermos muitas vezes porque não sabemos decifrar o que querem nos dizer as suas folhas quando nos escutam por sermos dotados de muita razão e pouca emoção ainda assim eu consigo receber do ambiente a energia que a plantinha transmite quando lhe conto algo triste ou alegre.

Respeite a privacidade das plantas e das árvores, peço mais uma vez. Só as abrace e as toque se tiver permissão para isso.

Em muitos parques ambientais existem placas proibindo o toque nas plantas e árvores, eu gosto disso, porque há pessoas tão ignorantes que adoram tocar nelas sem serem autorizadas. Às vezes a plantinha ou árvore está sendo curada de uma doença séria e precisa de repouso e silêncio.

Para terminar este pequeno ensaio deixo você com o poema do meu poeta maior português Fernando Pessoa no heterônimo de Alberto Caeiro que nos diz Dizes-me: tu és mais alguma coisa / Que uma pedra ou uma planta. / Dizes-me: sentes, pensas e sabes / Que pensas e sentes. / Então as pedras escrevem versos? / Então as plantas têm ideias sobre o mundo? / Sim: há diferença. / Mas não é a diferença que encontras; / Porque o ter consciência não me obriga a ter teorias sobre as coisas: / Só me obriga a ser consciente. / Se sou mais que uma pedra ou uma planta? Não sei. / Sou diferente. Não sei o que é mais ou menos.”

Eu também não sei o que é mais ou menos, só sei que existo e amo plantas e árvores, e por isso respeito a sua timidez e sei bem o que é se envergonhar diante da multidão de fotógrafos querendo o melhor clique do nosso vestido novo.

As plantas trocam de vestes todas as noites no processo de fotossíntese. Outro tema para um novo ensaio este dos paparazzi das plantas e seus vestidos longos de festas. Até mais!

Rosângela Trajano, Articulista do EcoDebate, é poetisa, escritora, ilustradora, revisora, diagramadora, programadora de computadores e fotógrafa. Licenciada e bacharel em filosofia pela UFRN e mestra em literatura comparada também pela UFRN. É pesquisadora do CIMEEP – Centro Internacional e Multidisciplinar de Estudos Épicos. Com mais de 50 (cinquenta) livros publicados para crianças, ministra aulas de Filosofia para crianças na varanda da sua casa, de forma voluntária. Além disso, mora pertinho de um mangue aonde vai todas as manhãs receber inspiração para poetizar.

 

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

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