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Serra do Curral em Risco: Impactos da Mineração e Urbanização

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artigo de opinião

A degradação da Serra do Curral, em Belo Horizonte, avança com a mineração e a urbanização, ameaçando ecossistemas e o patrimônio cultural da cidade.

História, novas histórias. Dias de luta, dias de glória”.

Vagner Luciano Coelho de Lima Andrade1

No passado, a serra das Congonhas era marco paisagístico que emoldurava a antiga localidade de Curral Del Rey. Local de pastagens verdejantes e inúmeros cursos d’água, onde se fixavam temporariamente as comitivas, que vindas dos sertões do São Francisco e da Bahia levavam as boiadas aos centros mineradores. Eram espaços e tempos distintos que a história local registrou. Havia paisagens para minerar e paisagens para plantar. A Rua Padre Pedro Pinto, em Venda Nova, na época chamada de Rua Direita fazia parte destes caminhos. No registro da Contagem das Abóboras, contabilizava-se o número de passantes para pagamento dos tributos reais. Transeuntes, bois, escravizados, mercadorias eram taxados, pois não havia outra forma de arrecadação.

O tempo adveio e o passado colonial português imortalizado nas estradas, ruas e travessas se fazia presente evocando elementos que precisavam ser esquecidos. A República trouxe novos sonhos e com eles empreenderam-se mudanças e novos olhares. Esta região do “belo horizonte”, entre 1894 e 1897 receberia à nova Capital das Minas Gerais, em substituição a Ouro Preto. Hoje, uma metrópole com mais de dois milhões de habitantes e um grande aglomerado conurbado no entorno. Do passado restou a Serra das Congonhas, que com o tempo passou a ser chamada de Serra do Curral Del Rey e posteriormente, Serra do Curral, marco simbólico na paisagem da capital mineira. Esta serra causou encantamento em Carlos Drummond de Andrade, que se mudara para cá, indignado com o sumiço de um pico engolido pela mineração, em sua terra natal, Itabira. Porém, a história se repetiria por aqui, deixando-o indignado novamente. Há vários registros literários desta revolta, antes dele empreender sua ida definitiva para o Rio de Janeiro.

Assim, aquele alinhamento serrano, tombado pelo IPHAN em 1960, e destinado a se tornar parque estadual de acordo com a lei nº 7041 de 19/07/1977, transformou-se nas três décadas seguintes, numa enorme cava, com áreas laterais degradadas. A mineração no chamado Complexo Águas Claras, desestabilizou o talude da serra, atualmente escorado por amarras tecnicamente adequadas. Um grande lago de 200 metros de profundidade emoldura o cenário de desolação e destruição. Era o começo de uma história sem fim. No Taquaril, uma grande lavra se formou, descaracterizando severamente a paisagem local. No Acaba Mundo, Olhos d’água e Solar do Barreiro, a mineração efetivaria recortes significativos contabilizando lucros imediatos e socializando impactos diversos. E a história, outrora conhecida de todos, se repetia. Lucros para poucos e o passivo ambiental para todos.

As leis se mostraram irreveláveis e adaptáveis à ideologia míope do “progresso”. No ano de 1995, a população elegeu a serra como símbolo da cidade, e várias unidades de conservação se efetivaram para preservação de um mosaico de biodiversidade e geodiversidade. Porém, as pretéritas feridas abertas pelas mineradoras, continuam sangrando. A serra silenciosamente caminha para o caos. Apesar da legislação, a pressão urbana também exerce força gradativamente sobre o símbolo dos belo-horizontinos fatiando-lhe pedaços significativos. Resta agora, que o grito de socorro da mesma, ecoe na garganta daqueles que sempre a contemplaram além do horizonte. Para aqueles que não se imaginam sem esta serra ao alcance dos olhos e também da alma, resta o grito e a mobilização.

Sim, nossa alma está lá, encantada entre vales, regatos e matas e nos anuncia tristezas futuras. E é justamente para além do (belo) horizonte, escondida e desconfiada como um bom mineiro, a serra receberá seu golpe final. A região do Pico Belo Horizonte, encontra-se seriamente ameaçada por um grande Complexo Minerário formado pela Junção das empresas COWAN, EMPABRA e Mineradora Taquaril. O irrevelável empreendimento de grandes proporções afetará diretamente Nova Lima, Raposos e Sabará. Uma grande área de renascentes nativos inseridos na transição entre cerrado e mata atlântica será removida. Áreas de canga ferruginosa, com alto endemismo de espécies, também serão afetadas. Em Belo Horizonte, os impactos afetarão à região central e as zonas leste e sul. Seriam fraturas futuras a elucidarem um triste horizonte?

É preciso rever este absurdo, que inclusive encontra-se avançado, no que se refere ao licenciamento. A serra não contempla mais nenhum abuso. É preciso mobilizar a sociedade para as projeções metropolitanas desse empreendimento insano. A área potencializa cenários únicos, através da conservação de suas paisagens potencializando ecoturismo e geoturismo. Sua importância vai além dos aspectos ambientais, pois reconfigura-se no imaginário dos moradores de Belo Horizonte, sendo, portanto inegável patrimônio cultural.

Além do horizonte existe um lugar bonito e tranquilo. Era aqui que morava a alma dos primeiros habitantes destes vales que hoje formam a sexta maior urbe do país. É aqui que se refugiou a alma dos moradores de um antigo arraial condenado à demolição para construção de outra cidade. É aqui que mora a alma dos mais de dois milhões de habitantes que residem nesta grande cidade. E esta alma anuncia que não partirá, jamais. Ela se fortalecerá com o grito coletivo dos que não se deixam vencer pela égide minerária. Ela vislumbra novos tempos para estas paisagens únicas. Tempos em que sua natureza, recuperada e efetivamente preservada possa encantar as futuras gerações. Não à mineração na serra, continua e continuará sendo o grito de todos aqueles que lutam por novos tempos.

1 Agente educador e mobilizador da Rede Ação Ambiental, com formação em Ecologia, Geografia, Magistério, Patrimônio e Turismo

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

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