A necessidade de Itabuna e de outros municípios se transformarem em esponjas para o combate a enchentes, inundações e alagamentos
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Artigo de Elissandro Santana
Analista em infraestrutura e urbanismo, Geógrafo, Gestor ambiental, Bacharel em Biomedicina, Licenciado em Ciências biológicas, Licenciado em Química, Licenciado em Geografia, Licenciado em Letras – Línguas estrangeiras modernas, dentre outras formações de pós-graduação. Revisor e editor de meio ambiente na Revista Latinoamerica.
Imagem: Google Earth
Itabuna e outras cidades do entorno do Rio Cachoeira possuem um histórico de enchentes, inundações e alagamentos em períodos de grandes volumes pluviométricos. Em função disso, estas cidades precisam aprender a lidar, de forma inteligente, eficaz e eficiente com esta questão, ou seja, com o manejo das águas, um problema recorrente em várias partes do Brasil e do mundo.
Antes de avançarmos na discussão sobre cidade-esponja e caracterização da situação em Itabuna e outras cidades no tangente às enchentes, inundações e alagamentos, é importante diferenciar estes três termos. De forma simples e resumida, pode-se afirmar que as diferenças consistem basicamente nas seguintes noções: a enchente ocorre a partir da elevada vazão pluviométrica, a inundação se dá pelo transbordamento em determinada área, caso não exista um sistema de drenagem eficiente que comporte a vazão das chuvas na área. Na imagem abaixo, pode-se compreender tais conceitos de uma forma bastante simples e didática:
Fonte: Qual é a diferença entre inundação, enchente e alagamento (jornaldaparaiba.com.br)
No caso específico de Itabuna, nas duas últimas enchentes ou cheias, houve a inundação de vários pontos urbanos, principalmente, em bairros localizados em áreas de planície ou de várzea. Enfim, há pouco mais de dois anos, grande parte do espaço urbano de Itabuna, em especial, os perímetros topográficos com declive ou na margem do Rio Cachoeira, foram inundados, com prejuízos e transtornos para diversos cidadãos, principalmente, para os mais pobres em bairros mais fragilizados sócio-econômico-ambientalmente. Os prejuízos não se resumiram somente às questões financeiras, mas, também, em relação à vida e isso pode ser constatado a partir dos registros na mídia e em outros meios de informação/comunicação.
Na perspectiva da percepção ambiental, ao dialogar com moradores, especificamente de Itabuna, ficou nítido que as imagens memoriais sobre as enchentes funcionam como uma espécie de fantasma ambiental que assombra e isso, sem dúvida, interfere na dinâmica da vida, na dimensão de uma psicologia ambiental e em outras vertentes de análise. Diante do quadro e histórico de enchentes, inundações e alagamentos, não somente em Itabuna, mas em partes de outras cidades às margens do Rio Cachoeira, na atualidade, são necessários planos e medidas multidisciplinares de manejo da água para que, desta forma, os espaços urbanísticos não colapsem em períodos de intempéries climáticas e ambientais que desencadeiam cheias e, consequentemente, transbordamentos e inundações. Como pontuado, as destruições causadas por enchentes e inundações afetam não somente o financeiro, mas a própria dimensão afetiva de moradores, dado que estes, diante desses fenômenos, vivenciam uma espécie de êxodo, à revelia, de seus locais, espaços, territórios e paisagens de afetos e de memórias, uma das facetas mais cruéis dos desastres ambientais.
Feitas estas considerações e conceituações iniciais, a seguir, apresentarei uma alternativa que citei no artigo “Direções para uma Itabuna inteligente e sustentável”, mas que só mencionei rapidamente, a questão de Itabuna como uma cidade-esponja. De imediato, cabe mencionar que a ideia de cidades como esponjas já vem sendo usada em experiências na China e em outros países, e esta poderia ser replicada em Itabuna e região, mesmo que isso demande altos investimentos com a remodelação urbanístico-espacial, sempre pensando na dimensão da vida em todas as suas formas.
Para iniciarmos uma discussão sobre a proposta de Itabuna como uma cidade-esponja, em primeiro lugar, faz-se imprescindível discutir o próprio conceito de cidade-esponja e como isso funcionaria. Como já existem trabalhos publicados nessa linha, inclusive, alguns deles são usados para a fundamentação da discussão que ora se faz, convido o/a leitor/a para visitar páginas como https://oics.cgee.org.br/, https://www.nationalgeographicbrasil.com/, dentre outras e fazerem buscas relacionadas à temática das experiências tangentes às cidades-esponja com base em ações baseadas na própria natureza.
Conceitualmente, de acordo com a National Geographic Brasil, ao mencionar artigo publicado pelo Observatório de Inovação para Cidades Sustentáveis, define-se que “Cidade-Esponja é um conceito de cidade sensível à água, remetendo à situação na qual a mesma possui a capacidade de deter, limpar e infiltrar águas usando soluções baseadas na natureza”.1
Ainda segundo a National Geographic Brasil, citando o artigo publicado por OBICS, o objetivo das mudanças arquitetônicas e urbanísticas que fazem uma cidade entrar para o conceito sustentável de “esponja” é encontrar soluções que ajudem a absorver as águas de chuva – seja em “áreas livres ou construídas”. A ideia seria recarregar os aquíferos e lençóis freáticos locais com essa água, bem como deixar o excedente de chuva escorrer para áreas possíveis de serem alagáveis.2
Fazendo a ponte entre o histórico de Itabuna e cidades do entorno ao Rio Cachoeira e medidas de combate a enchentes, alagamentos e inundações, é importante correlacionar os problemas da cidade e região a medidas que visem a encontrar soluções no que se refere à capacidade de deter, de limpar e de infiltrar águas, sempre na perspectiva de soluções engenho-arquitetônicas e urbanísticas baseadas na natureza e como construir essa capilaridade transformadora, para que, desta forma, a cidade e a região não fiquem à mercê das intempéries climáticas e agindo apenas sobre os estragos.
Explorados os conceitos básicos, cabe destacar que são muitas as medidas e características para que uma cidade seja classificada como esponja. Muitas dessas ideias podem, facilmente, ser encontradas no trabalho da OBICS citado pela National Geographic Brasil. Além das medidas que aparecem no trabalho mencionado, menciono outras ações que também podem servir a uma cidade-esponja e resiliência ecossistêmica. Dentre elas, as principais ou mais conhecidas e difundidas são:
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Criação ou ampliação de áreas verdes. No tocante a isto, tais espaços poderiam funcionar como áreas úmidas e parques alagáveis que serviriam como perímetros de absorção da água, ou seja, seriam pontes de escape de água.
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Restauração e proteção de nascentes em áreas urbanas e periurbanas.
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Programa permanente de retirada de entulhos e resíduos poluentes de rios. Em nosso caso, do Rio Cachoeira e outros cursos de água.
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Políticas públicas robustas e consistentes de educação ambiental permanente para mudanças comportamentais socioculturais na relação sociedade-rio-meio ambiente.
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Reconstrução de partes da margem dos rios. No caso de Itabuna e região, o Rio Cachoeira e outros cursos que nele desaguam. Como isso se daria? Este processo poderia começar com a retirada de concreto e restauração de matas ciliares ou outras formas de áreas verdes em todo o perímetro urbano e, também, nos espaços rurais e periurbanos.
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Construção de jardins de chuva. Estes despontariam como áreas por toda a cidade para a redução do escoamento superficial. Aqui cabe mencionar o Jardim de Chuvas3 da cidade de Nova York, nos Estados Unidos, como uma experiência para ser analisada e replicada, caso seja possível, com as adaptações à nossa realidade local.
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Políticas públicas ou parcerias público-privadas para a construção de telhados verdes, em um primeiro plano, em instituições públicas e privadas, mas, também, nas residências, em geral, à medida que a sociedade fosse se conscientizando do papel de tais estruturas para a redução das taxas de escoamento pluviométrico.
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Tecnologias propiciadoras de pavimentações permeáveis e isso se daria tanto em rodovias como ruas por todos os bairros e espaços. Em se tratando do município de Itabuna e outras cidades da região com vínculo com o Rio Cachoeira e a Bacia hidrográfica ao qual ele pertence, dado que soluções na perspectiva de combate a inundações, alagamentos e enchentes passam por questões em rede, ou melhor, pela dimensão das Bacias Hidrográficas e não somente de um rio, essa seria uma ótima alternativa de escoamento e absorção dos excessos hídricos.
À guisa de considerações finais, é interessante e oportuno pontuar que várias experiências não somente na China e nos Estados Unidos, mas em outras partes do Planeta estão sendo bastante eficientes e que as medidas para o combate a enchentes, alagamentos e inundações são múltiplas, por isso, exigem análises e ações multidisciplinares.
O importante é que as gestões municipais, as instâncias privadas e a própria sociedade comecem a pensar e a agir em prol de mudanças sustentáveis, consistentes e de forma contínua.
Como é perceptível, também há medidas que podem ser tomadas pela própria sociedade e aqui nos referimos àquelas parcelas sociais que reúnem condições econômicas para isso. O importante é que nos reunamos em rede para ações consubstanciadas e cobranças públicas e privadas, para que alternativas assim se concretizem.
A ideia de cidade-esponja, como já destaquei, demanda gastos, planejamento e investimentos, mas é possível e, melhor, ela pode se tornar realidade, sem descartar, evidentemente, outras ações para o combate ao problema das enchentes, inundações e alagamentos, para que, desta forma, Itabuna e região se transformem em referências e lugares de bem viver.
1 https://www.nationalgeographicbrasil.com/meio-ambiente/2024/05/o-que-e-uma-cidade-esponja-e-como-ela-funciona-para-evitar-enchentes
2 https://www.nationalgeographicbrasil.com/meio-ambiente/2024/05/o-que-e-uma-cidade-esponja-e-como-ela-funciona-para-evitar-enchentes
3 https://oics.cgee.org.br/estudos-de-caso/jardim-de-chuva-na-cidade-de-nova-york-estados-unidos_5ec28b424d1d7350393f9504
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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Elissandro é um ser humano necessário para o meio ambiente! Excelente artigo e sim, é possível fazer.