As receitas da Rebeca

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Artigo de Montserrat Martins

Se você ainda não viu, localize na internet a entrevista com a Rebeca Andrade na qual lhe perguntam no que ela pensa naquele momento antes da prova, quando os atletas estão concentrados esperando a sua vez de entrar. Muitos atletas contam que passa um “filme” da sua vida, mas, para surpresa do entrevistador, a Rebeca com aquele seu jeito simples tipo adolescente, que parece ter menos que seus 25 anos, revelou que antes da prova ela estava pensando em… receitas. Receitas de comidas que ela vê na internet, que ela gosta de ver e nem é ela quem costuma fazer, pede para fazerem para ela.

Essa resposta das receitas ficou famosa e, num outro dia, diante de qual receita estava pensando antes da prova, ela respondeu que naquele dia não tinha pensado em comida, mas sim numa série de TV que gosta de assistir, que ficou “viajando” imaginando ser uma médica cirurgiã que ela viu na série. É essa simplicidade, simpatia e bom humor da Rebeca que cativa as pessoas, além de sua relação afetiva com a lendária Simone Biles.

São rivais nas disputas, mas com gestos amistosos recíprocos entre elas, que culminaram na reverência das americanas no momento do pódio de ouro da brasileira.

Nyjah Huston, skatista americano, é o oposto da Rebeca, é outra história que vale a pena você conhecer, pelas lições que traz. Não é fácil, nem comum, manter a leveza no esporte de alto rendimento. Muitos atletas se tornam obsessivos pela vitória a ponto de perderem sua espontaneidade, humor e isso afetar sua vida afetiva.

É o caso do Nyjah, que chega a destoar dos demais skatistas pela falta de afeto e de espírito esportivo. No skate é comum a simpatia recíproca e os atletas admirarem as manobras dos outros. Nyjah é um dos poucos que demonstra no semblante o contrário, a satisfação com os erros dos adversários, evidenciando sua obsessão por ganhar.

A personalidade do Nyjah tem a ver com seu pai, que lhe cobraria perfeição e vitórias, de um modo tão estressante que o filho acabou rompendo relações com ele. Eu chamaria isso de “Síndrome do Pai do Michael Jackson”, o caso mais famoso de um pai que torturava o filho com sua obsessão pela perfeição e pelo sucesso. Uma pessoa assim vê os outros como rivais, não como colegas ou amigos.

Nesse domingo, aliás, é o Dia dos Pais. Que esses exemplos de vida, felizes e infelizes, nos lembrem que o papel dos pais não é ter filhos “perfeitos”, nem “vitoriosos”, o papel dos pais é fazer a sua parte para que os filhos sejam felizes.

É possível vencer sendo feliz, obrigado Rebeca por nos mostrar isso.

Montserrat Martins é Psiquiatra.

 

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in EcoDebate, ISSN 2446-9394

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