Javalis comprometem a regeneração natural das araucárias
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Artigo de Waldir L. Roque
A presença de javalis no Brasil vem de longa data, mas nas últimas décadas a incidência desse animal exótico e sem predadores naturais no país está causando muitos problemas, com consequências bastante sérias para a agricultura, para a fauna nativa, para o turismo e especialmente para o meio ambiente, que sofrerá fortemente os impactos em poucos anos.
Os javalis (Sus scofra L.) são animais selvagens, agressivos, extremamente adaptáveis e generalistas, alimentando-se de praticamente tudo que encontram em seu caminho. Eles fuçam as áreas ao redor de árvores e plantações comendo as sementes e os brotos, o que causa problemas para a agricultura e para os processos de regeneração e sucessão naturais de plantas nativas.
As araucárias são árvores nativas típicas do sul do Brasil e que sofreram uma grande redução na sua população, especialmente decorrente da derrubada pela qualidade de sua madeira. Atualmente, estão classificadas como “em perigo” na lista das espécies da flora brasileira ameaçadas de extinção. Isso levou a uma legislação federal proibindo o seu corte.
De acordo com o Inventário Florestal Nacional de 2018, o mecanismo de sucessão natural das araucárias é bastante baixo, da ordem de 4% na floresta ombrófila mista, ambiente natural da mata atlântica com maior ocorrência delas. As araucárias remanescentes da grande redução foram aquelas com menor potencial madeireiro, o que levou à permanência de exemplares com menor qualidade genética. Por outro lado, estudos indicam que o aquecimento global terá um forte impacto sobre elas e, consequentemente, na geração de sementes para a regeneração natural.
As sementes das araucárias são recalcitrantes, ou seja, possuem uma capacidade germinativa de curto prazo, não podendo ser armazenadas em condições normais e por períodos longos. A germinação natural acontece poucos dias após os pinhões caírem das pinhas e aqueles que, como a ponta de uma seta, conseguem penetrar no solo terão maiores chances de germinarem.
O período de amadurecimento e produção das pinhas é curto ocorrendo, basicamente, de abril a julho, para as variedades mais comuns encontradas na região sul do Brasil. Nesse período, desconsiderando os efeitos de coleta pelos humanos, as pinhas debulham permitindo que os pinhões caiam em grande quantidade. Os pinhões são um alimento rico em nutrientes e de sabor agradável, sendo levemente doces quando crus. Vários animais e aves aproveitam a fartura e se alimentam deles em grande quantidade.
A recente tecnologia de araucárias enxertadas é bastante interessante, reduzindo para algo em torno de 4 a 6 anos a produção das pinhas. Esses pinheiros anões serão destinados à produção comercial de pinhões. Como as araucárias naturais produzem pinhas apenas após 10 a 12 anos e como não é possível fazer-se um manejo com o corte das araucárias mais senis dando espaço para a regeneração de novas árvores, a enxertia suscita uma preocupação tendo em vista que poderá ampliar o desinteresse no plantio de araucárias naturais e também com relação ao processo de sucessão espontâneo das mesmas.
Os javalis são um dos animais que se alimentam dos pinhões que estão sobre a superfície, competindo fortemente com a fauna nativa, mas também com seus hábitos de fuçarem o solo, removem as sementes que penetraram no mesmo e até os brotos das araucárias já em desenvolvimento. A presença desses mamíferos de grande porte está comprometendo os processos de regeneração e sucessão naturais das araucárias e o futuro das florestas ombrófilas mistas.
Um estudo científico recente (Biota Neotropica 21(1): e20201111, 2021) confirma a grande ameaça provocada pelos javalis, inclusive naquelas regiões cujas matas de araucárias estão mais protegidas como nas Unidades de Conservação (RPPNs incluídas), considerando que nessas unidades estes animais têm maior disponibilidade de alimentos e um ambiente favorável à procriação.
No Brasil, os métodos para a contenção dos javalis têm se mostrado pouco eficientes.
O manejo através da caça tem contribuído em baixa escala e ainda tem sido bastante controverso por não ter um modelo integrado e tecnicamente delineado para a erradicação a médio e/ou longo prazos.
Portanto, é fundamental e urgente que sejam adotadas políticas mais específicas para o combate a está praga exótica em nosso país (por sorte eles ainda não estão presentes no habitat amazônico), antes que prejuízos muito mais sérios advenham.
Waldir L. Roque
RPPNista nos Aparados da Serra, RS
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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