China e Índia lideram o crescimento das emissões de CO2 no século XXI
As emissões globais de carbono dispararam 46% desde 2000, com China e Índia liderando o aumento (212% e 190%, respectivamente). Em contraste, a UE-27 e os EUA reduziram as emissões em 16% e 23%. Nos últimos 30 anos, as emissões de CO2 superaram as dos 142 anos anteriores.
Síntese:
- Tendências globais de emissões de CO2
- Impacto do crescimento demoeconômico no Antropoceno
- Negacionismo demográfico e suas consequências
- Aumento do efeito estufa e aquecimento global
- Superação do limite de 1,5ºC do Acordo de Paris
Artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“A evidência à qual não podemos escapar é que em nossa civilização, a criação de
valor econômico provoca, na grande maioria dos casos, processos
irreversíveis de degradação do mundo físico” (1974, p. 17)
Celso Furtado (1920-2004)
Celso Furtado (1920-2004) publicou o livro “O mito do desenvolvimento econômico”, em 1974, há 50 anos, mostrando a impossibilidade de crescimento econômico ilimitado em um Planeta finito. Influenciado por autores da escola da Economia Ecológica, Celso Furtado chamava a atenção para a impossibilidade de generalização do crescimento econômico com preservação ambiental. Na passagem abaixo ele alerta para a possibilidade de um colapso ambiental:
(…) que acontecerá se o desenvolvimento econômico, para o qual estão sendo mobilizados todos os povos da terra, chegar efetivamente a concretizar-se, isto é, se as atuais formas de vida dos povos ricos chegam efetivamente a universalizar-se? A resposta a essa pergunta é clara, sem ambiguidades: se tal acontecesse, a pressão sobre os recursos não renováveis e a poluição do meio ambiente seriam de tal ordem (ou alternativamente, o custo do controle da poluição seria tão elevado) que o sistema econômico mundial entraria necessariamente em colapso (Furtado, 1974, p. 19).
O gráfico abaixo, com dados do Global Carbon Project, mostra que a China e a Índia – as duas nações mais populosas do mundo, com mais de 1,4 bilhão de habitantes cada uma – são também os dois territórios que apresentam as maiores taxas de crescimento das emissões de C02 no século XXI.
As emissões globais de carbono cresceram 46% entre o ano 2000 e 2022. Na China o crescimento foi de 212% e na Índia de 190%. No mesmo período, houve uma redução de 16% nas emissões da União Europeia (EU-27 países) e de 23% nos Estados Unidos da América (EUA).
Estes dados mostram uma nova realidade nas tendências das emissões de CO2. De 1850 a 1992 (ano da Conferência do Meio Ambiente do Rio de Janeiro) o total das emissões globais de carbono foi de 232 milhões de toneladas de carbono e de 1993 a 2022 foi de 251 milhões de toneladas de carbono. Ou seja, nos últimos 30 anos houve mais emissões de CO2 do que nos 142 anos anteriores. E os países de renda média superaram as emissões dos países ricos.
Como mostrei no texto, “Crescimento demoeconômico no Antropoceno e negacionismo demográfico” (Alves, 2022), os países em desenvolvimento superaram as emissões dos países desenvolvidos. Em 1960, os países da OCDE (países com elevada renda per capita) eram responsáveis por 66% das emissões globais e o restante do mundo (não OCDE) emitia 34%. Em 2004 houve a virada com os países em desenvolvimento superando as emissões dos países desenvolvidos. Em 2020, os países da OCDE emitiram 32% das emissões globais e o restante do mundo emitiu 68% das emissões globais.
Portanto, os países em desenvolvimento – liderados por China e Índia – apresentam atualmente as maiores taxas de emissões de CO2. E como previu Celso Furtado, a poluição do meio ambiente seria de tal ordem que ameaçaria a ordem econômica internacional.
De fato, a concentração de CO2 na atmosfera que se manteve abaixo de 280 partes por milhão (ppm) durante milhares de anos começou a subir após a Revolução Industrial e Energética, atingiu 300 ppm em 1920, chegou a 310 ppm em 1950, alcançou 350 ppm em 1987, registrou 400 ppm no ano do Acordo de Paris, em 2015, e marcou o recorde de 422 ppm em 2023, conforme dados da Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA, na sigla em inglês), dos Estados Unidos. A taxa de crescimento anual estava abaixo de 1 ppm na primeira metade do século XX, passou para cerca de 1,5 ppm na segunda metade do século passado e atingiu 2,4 ppm na última década. Em 2023, o recorde foi ainda maior, com aumento de 3,36 ppm na concentração de CO2 na atmosfera.
Em consequência houve aumento do efeito estufa e os últimos 10 anos (2014-2023) foram os mais quentes do Holoceno (últimos 12 mil anos). Os meses de janeiro a abril de 2024 foram os mais quentes já registrado para esta época do ano. O limite mínimo do Acordo de Paris, de 1,5ºC, foi ultrapassado nos 12 meses de maio de 2023 a abril de 2024.
A emergência climática é uma ameaça existencial à civilização humana. Quanto maiores forem as emissões, maior será o efeito estufa e maiores serão as temperaturas. As consequências do desequilíbrio climático serão catastróficas, como se tornou evidente nas enchentes do Rio Grande do Sul neste mês de maio de 2024. Os países desenvolvidos – que já apresentam um desacoplamento entre crescimento da economia e as emissões de carbono precisam ajudar os países em desenvolvimento a fazer a transição energética e implementar uma economia de baixo carbono.
Referências:
ALVES, JED. Crescimento demoeconômico no Antropoceno e negacionismo demográfico, Liinc em Revista, RJ, v. 18, n. 1, e5942, maio 2022 https://revista.ibict.br/liinc/article/view/5942/5595
FURTADO, C. O mito do desenvolvimento econômico. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1974
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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