Duas Megatendências: Sustentabilidade e Digitalização
Artigo de José Austerliano Rodrigues
Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas e as 5 Dimensões do Modelo de Sustentabilidade de Marketing: econômica, social, ambiental, cidadania ecológica e de tecnologia de informação, ressaltam que a sustentabilidade constitui uma das principais tendências para formuladores de políticas, empresas e indivíduos (NAÇÕES UNIDAS, 2015; RODRIGUES; RODRIGUES FILHO, 2018; LICHTENTHALER, 2021).
No que diz respeito às empresas, uma perspectiva baseada na inovação sugere que a sustentabilidade terá um impacto maciço na transformação de muitas indústrias nos próximos anos e décadas (LICHTENTHALER, 2016; HOEK, 2017; SACHS; SCHMIDT-TRAUB; MAZZUCATO; MESSNER; NAKICENOVIC; ROCKSTRÖM, 2019).
De fato, a sustentabilidade terá grandes consequências para empresas de quase todos os setores, desde o setor de energia com foco em energias renováveis e o setor automotivo com mobilidade mais sustentável até a indústria da moda com uma produção mais sustentável (planejamento e controle de produção sustentável) de novos itens de moda (LICHTENTHALER, 2021; RODRIGUES, 2024).
Em geral, sustentabilidade é um conceito relativamente amplo, e há muitas compreensões conceituais diferentes do que ela realmente compreende (HAHN; KÜHNEN, 2013; MAIER et al., 2020).
Todavia, muitas contribuições à literatura argumentam que a sustentabilidade vai além da conservação do meio ambiente e também envolve fatores econômicos e sociais, levando as dimensões do modelo de sustentabilidade de marketing de resultados financeiros responsáveis, ambientais, sociais, cidadania ecológica e tecnologia de informação (ELKINGTON, 2018; RODRIGUES; RODRIGUES FILHO, 2018).
Este entendimento é consistente com os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (2015), e com o conceito de criação de valor compartilhado, que descreve as atividades das empresas de alcançar objetivos financeiros responsáveis e estratégicos e, ao mesmo tempo, contribuir positivamente para o meio ambiente e para a sociedade (PORTER; KRAMER, 2011; PFITZER et al., 2013).
Desta maneira, a enorme atenção pública à sustentabilidade nos últimos anos e décadas pode ser relativamente nova, incluindo os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (2015), e a Agenda Sociedade 5.0 do Japão (FERREIRA; SERPA, 2018).
No entanto, as raízes da sustentabilidade remontam a vários séculos (CARADONNA, 2014). Como tal, um grande corpo de pesquisas anteriores sobre sustentabilidade e tópicos relacionados de várias disciplinas se desenvolveu, incluindo a visão baseada em recursos naturais (HART, 1995; HART; DOWELL, 2011).
Com base nisto, muitas empresas criaram iniciativas específicas com múltiplas medidas individuais para aumentar a sustentabilidade de suas atividades comerciais (ARTIACH; LEE; NELSON; WALKER, 2010; REICHEL; SEEBERG, 2011; MONTIEL; DELGADO-CEBALLOS, 2014).
Neste sentido, a gestão da sustentabilidade nas empresas foi recentemente definida pela empresa de pesquisa e consultoria Gartner da seguinte forma: “gestão da sustentabilidade concentra-se em produtos, serviços, na empresa e na cadeia de suprimentos, e busca equilibrar de forma otimizada o desempenho e os resultados organizacionais em todos os critérios econômicos, ambientais e sociais em todas as escalas de tempo” (GARTNER, 2021).
Além disso, pesquisas anteriores de uma perspectiva baseada em inovação enfatizaram como diferentes tipos de inovação, como novos produtos, serviços, processos e modelos de negócios, podem contribuir positivamente para o triple bottom line, modelo de sustentabilidade de marketing: conceptualização no setor industrial, sustentabilidade de marketing nas empresas da nova economia de consumo e planejamento e controle de produção sustentável (PFITZER et al., 2013; FICHTER; CLAUSEN, 2016; LICHTENTHALER, 2017; RODRIGUES; RODRIGUES FILHO, 2018; RODRIGUES; RODRIGUES FILHO, 2022; RODRIGUES, 2024).
Outros trabalhos também ressaltaram a relevância de projetar novas soluções sustentáveis e tentar deixar melhores condições em vez de apenas causar menos danos ao meio ambiente (SHERWIN, 2004; EHRENFELD, 2008; THACKARA, 2015).
Apesar da variedade de atividades de inovação que atualmente têm pelo menos algum foco de sustentabilidade em muitas empresas, elas geralmente não estão relacionadas às iniciativas de digitalização que as mesmas empresas frequentemente estabeleceram nos últimos anos (DEL RÍO CASTRO et al., 2020; MAIER et al., 2020).
Esta relativa independência da sustentabilidade e da digitalização é surpreendente, especialmente porque ambas as megatendências exigem transformação e mudança substanciais em muitas empresas (MOTWANI, 2014; CLAUSEN; GÖLL; TAPPESER, 2017; NARAYAN, 2019; GEORGE; MERRILL; SCHILLEBEECKX, 2020).
No entanto, as interdependências muito limitadas da gestão da sustentabilidade e da digitalização atualmente também são ilustradas pelos relatórios de sustentabilidade de muitas empresas, que geralmente descrevem múltiplas medidas para reduzir o consumo de recursos com um foco bastante exclusivo em medidas não digitais (KOLK, 2004; HAHN; KÜHNEN, 2013).
Assim, sustentabilidade e digitalização são itens fundamentais nas agendas estratégicas de muitas empresas de diversos setores (LICHTENTHALER, 2021).
Contudo, a implementação de iniciativas e medidas particulares ocorre de relativo isolamento, sem considerar as potenciais interdependências positivas e negativas (STUERMER et al., 2017; GEORGE et al., 2020).
No que diz respeito à digitalização, a empresa de consultoria e pesquisa Gartner sugeriu a seguinte definição, que se tornou relativamente popular: “digitalização é o uso de tecnologias digitais para mudar um modelo de negócios e fornecer novas oportunidades de receita e produção de valor, é o processo de mudança para um negócio digital” (GARTNER, 2019).
Este processo de mudança para um negócio digital já indica a grande necessidade de transformação que muitas vezes é necessária se as empresas almejam alcançar um nível mais alto de digitalização (WESTERMAN; BONNET, 2015; LICHTENTHALER, 2020a).
Devido às novas oportunidades que proporciona, a digitalização também pode contribuir para níveis mais elevados de sustentabilidade, o que indicaria interdependências positivas entre essas duas megatendências (LICHTENTHALER, 2021).
Na verdade, a digitalização pode acelerar a evolução para reduzir a pegada de carbono e ajuda a conectar pessoas em todo o mundo, o que pode encorajar uma cultura de colaboração global e senso de urgência para abordar as preocupações ambientais (NAÇÕES UNIDAS, 2015; AKSIN-SIVRIKAYA; BHATTACHARYA, 2017; GUPTA et al., 2020).
Ao mesmo tempo, também pode haver interdependências negativas entre digitalização e sustentabilidade. A digitalização pode contribuir positivamente para os objetivos financeiros de uma empresa, mas pode simultaneamente ter efeitos ambientais negativos e pode fortalecer as divisões sociais (AKSINSIVRIKAYA; BHATTACHARYA, 2017; SACHS et al., 2019 ; GUPTA et al., 2020). Por exemplo, apenas focar na eficiência analógica e não digital não será suficiente (LICHTENTHALER, 2021).
Em vez disso, as empresas também podem precisar abordar a eficiência digital para reduzir o consumo de energia de ferramentas digitais, dispositivos inteligentes, streaming de vídeo, internet das coisas e diversas aplicações de inteligência artificial no contexto da crescente digitalização (HUELSENBECK, 2007; HAO, 2019; LICHTENTHALER, 2021).
Assim, os executivos podem ter que transformar suas organizações para permitir uma coexistência bem-sucedida de metas financeiras responsáveis e de sustentabilidade em um ambiente de negócios cada vez mais digital (MOTWANI, 2014; ALBERTI; VARON GARRIDO, 2017).
Em síntese, uma compreensão mais profunda das potenciais interdependências positivas e negativas entre digitalização e sustentabilidade é igualmente importante para formuladores de políticas, acadêmicos e profissionais no contexto dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas e das 5 Dimensões do Modelo de Sustentanbilidade de Marketing (NAÇÕES UNIDAS, 2015; RODRIGUES; RODRIGUES FILHO, 2018).
José Austerliano Rodrigues é Administrador, Especialista em Sustentabilidade de Marketing e Docente em Gestão de Sustentabilidade em Marketing e em Empreendedorismo, com doutorado em Sustentabilidade de Marketing pela UFRJ. E-mail: austerlianorodrigues@bol.com.br.
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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