Contribuição da Economia Social e Solidária para o Futuro do Trabalho
Contribuição da Economia Social e Solidária para o Futuro do Trabalho, artigo de José Austerliano Rodrigues
As diversas formas organizacionais que compõem a economia social e solidária podem ser encontradas em todo o mundo e têm sido atores importantes no processo de desenvolvimento econômico, ambiental e social
A economia global é afetada por mudanças econômicas, tecnológicas e demográficas significativas que ameaçam reduzir as oportunidades de trabalho digno, numa altura em que a procura de emprego está a crescer e as desigualdades econômicas são mais elevadas do que nunca.
Assim sendo, as novas tecnologias e a automatização estão cada vez mais a substituir os trabalhadores humanos, e os setores que são menos susceptíveis de serem afetados por estes fenômenos e mais susceptíveis de crescer num futuro próximo. Por exemplo, como os serviços pessoais, que são mais propensos as formas informais ou não padronizadas de emprego (BORZAGA; SALVATORI; BODINI, 2019).
Neste contexto, é recomendado uma atenção significativa à economia social e solidária (ESS) como uma opção viável para enfrentar alguns destes desafios. Embora a ESS compreenda um universo diversificado e heterogêneo de modelos e abordagens organizacionais, os principais intervenientes na ESS partilham um conjunto de características comuns que os tornam idealmente adequados para enfrentar algumas das questões-chave relacionadas com o futuro do trabalho.
Desta maneira, a ESS pode ser definida como “um conceito que se refere a empresas e organizações, em particular cooperativas, sociedades de benefício mútuo, associações, fundações e empresas sociais, que produzem especificamente bens, serviços e conhecimentos, ao mesmo tempo que prosseguem objetivos econômicos, ambientais e sociais e promovem a solidariedade” (OIT, 2011).
Isto inclui os intervenientes tradicionais da economia social (associações, cooperativas, mútuas e fundações), com uma variedade de outros tipos de organizações que surgiram nos últimos anos, incluindo, sobretudo, empresas sociais (BORZAGA; SALVATORI; BODINI, 2019).
Portanto, as diversas formas organizacionais que compõem a economia social e solidária podem ser encontradas em todo o mundo e têm sido atores importantes no processo de desenvolvimento econômico, ambiental e social numa variedade de atividades econômicas e contextos geográficos e culturais.
Na Europa, por exemplo, as associações começaram a surgir assim que a democracia se consolidou e têm sido fundamentais na criação e expansão de sistemas de segurança social em muitos países (BORZAGA; SALVATORI; BODINI, 2019).
Da mesma forma, as cooperativas e mútuas têm estado ativas desde o início do século XIX, ajudando vários grupos de pessoas (consumidores, produtores e trabalhadores) a terem acesso a bens e serviços básicos, desde produtos alimentares até cuidados com a saúde.
O mesmo acontece noutros continentes, onde podem ser encontrados estes mesmos tipos de organizações ou outras que partilham características semelhantes.
Na África, por exemplo, práticas tradicionais que contêm elementos de cooperação, solidariedade e propriedade coletiva existiram ao longo da história para responder a necessidades sociais, ambientais e econômicas específicas (BORZAGA; GALERA, 2014). Com estas organizações de ESS mais tradicionais, surgiram novas nos últimos anos. Entre estes, a ascensão das empresas sociais tem sido talvez o fenômeno mais significativo e difundido, particularmente na Europa, Ásia e América do Norte.
No município de Campina Grande, no estado da Paraíba, o autor deste artigo foi Colaborador do Projeto de Implementação de uma Incubadora para Empreendimentos Populares Solidários, da Associação de Cuidodores de Idosos da Fundação Pedro Américo, em 2015.
Deste modo, as empresas sociais evoluíram a partir de organizações sem fins lucrativos que começaram a produzir bens e serviços como uma componente central da sua atividade, bem como de organizações tradicionais da economia social (especialmente cooperativas) que expandiram os seus objetivos para além dos interesses dos seus membros e em direção ao bem-estar.
Em alguns contextos, as empresas sociais operam principalmente na prestação de serviços de bem-estar, enquanto noutros países também prestam serviços de educação, comunitários e de interesse geral.
Assim sendo, as empresas sociais também podem dedicar-se explicitamente à integração profissional de grupos desfavorecidos, caso em que poderão operar em praticamente qualquer setor (incluindo, por exemplo, serviços de lavandaria, jardinagem, logística, etc.), mas com foco na contratação de trabalhadores de grupos desfavorecidos (BORZAGA; SALVATORI; BODINI, 2019).
Contudo, as tendências recentes mostram que as organizações da economia social e solidária têm apresentado um crescimento significativo mesmo durante fases de recessão econômica. Também demonstraram capacidade de expansão em novos setores de atividade com base nas necessidades das suas comunidades e da sociedade como um todo.
De fato, ao longo dos anos, as organizações da ESS, incluindo cooperativas e empresas sociais, assumiram atividades tão diversas como a educação, a produção alimentar, os serviços financeiros e os serviços de interesse geral, incluindo serviços públicos. Também demonstraram ter uma grande capacidade de inovar naquilo que fazem e como o fazem, em resposta às necessidades sociais do contexto em que operam (ESIM; KATAJAMAKI, 2016).
Apesar da sua diversidade e heterogeneidade, as organizações da ESS que se dedicam à produção de bens e serviços partilham algumas características essenciais que as diferenciam das empresas convencionais, a seguir:
Primeiro, muitas vezes são organizações da base para o topo que surgem nas comunidades locais como resposta a necessidades ou oportunidades partilhadas entre grupos de cidadãos.
Em segundo lugar, caracterizam-se por uma participação significativa de voluntários, que muitas vezes desempenham um papel importante na fase de criação e arranque da empresa.
Terceiro, as suas atividades não são essencialmente orientadas para a criação de lucros a distribuir aos seus proprietários. Em vez disso, prosseguem os interesses dos seus membros (por exemplo, no caso de organizações mutualistas como as cooperativas e mútuas tradicionais) e da comunidade em geral (por exemplo, no caso de empresas sociais).
Quarto, a estrutura de propriedade normalmente atribui direitos a uma variedade de partes interessadas (stakeholders), em vez de apenas aos investidores (como no caso das empresas convencionais).
Consequentemente, a estrutura de governação também tende a ser mais inclusiva e democrática dando voz a diferentes tipos de partes interessadas (trabalhadores, voluntários, utilizadores, etc.) no processo de tomada de decisão.
Desta maneira, as duas últimas características em particular (o fato de as organizações de economa social e solidária não perseguirem principalmente os lucros, mas sim os interesses dos seus membros e o fato de serem propriedade e geridas pelos seus intervenientes) têm consequências importantes na forma como estas organizações se comportam e tornam-nas particularmente relevante nesta fase de profundas transformações sociais, ambientais e econômicas (BORZAGA; SALVATORI; BODINI, 2019).
José Austerliano Rodrigues é Administrador, Especialista em Sustentabilidade de Marketing e Docente em Gestão de Sustentabilidade em Marketing e em Administração Geral, com doutorado em Sustentabilidade de Marketing pela UFRJ. E-mail: austerlianorodrigues@bol.com.br.
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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