Benefícios das Soluções baseadas na Natureza nas cidades
Benefícios das Soluções baseadas na Natureza nas cidades
As SBN podem ajudar a minimizar os impactos induzidos pelas mudanças climáticas e servir como opções de adaptação proativa
Por Fabiana Barbi*
A noção de Soluções baseadas na Natureza (SBN) surgiu na interface ciência-política-prática. Nas cidades elas dizem respeito às intervenções deliberadas que podem ser inspiradas pela natureza ou apoiá-las no enfrentamento dos desafios urbanos, como as mudanças climáticas, a gestão das águas e do uso do solo, bem como o próprio desenvolvimento urbano.
Por exemplo, pode-se planejar a restauração da vegetação às margens de um rio no trecho urbano com o objetivo de minimizar os riscos de enchentes e alagamentos ou a restauração da vegetação em áreas de morro em uma cidade com fins de diminuir o risco de deslizamentos de terra.
Segundo o relatório, “Nature-based solutions in nationally determined contributions: synthesis and recommendations for enhancing climate ambition and action by 2020”, publicado pela IUCN e Universidade de Oxford, as SBN podem ajudar a minimizar os impactos induzidos pelas mudanças climáticas e servir como opções de adaptação proativa, ou seja, estratégias voltadas a lidar com as consequências, moderar os prejuízos, reduzir as vulnerabilidades ou explorar as oportunidades. Alguns conceitos relacionados são “adaptação baseada em ecossistemas (AbE)”, “infraestrutura verde”, “redução de risco de desastres baseada em ecossistemas”, entre outros. Na maioria dos casos, essas abordagens são complementares, têm considerável sobreposição e também podem ser usadas no contexto não urbano.
Quais são os benefícios?
Diante das incertezas que ainda existem acerca dos riscos climáticos, das vulnerabilidades e exposição futuras, questiona-se: como planejar ações e estratégias de adaptação e resiliência? Nesse cenário, as SBN ganham destaque por se caracterizarem como medidas do tipo ‘baixo arrependimento’, ou seja, que se provarão viáveis mesmo na ausência dos riscos climáticos projetados e seus impactos, além de possuírem um custo relativamente baixo em comparação aos benefícios de seus resultados esperados.
Por exemplo, os corredores ecológicos, porções de ecossistemas que promovem a ligação entre áreas fragmentadas, podem ser planejados com objetivo de minimizar os riscos decorrentes dos extremos de temperatura. Contudo, os benefícios de tal intervenção vão além do objetivo inicial.
Em decorrência da regulação da temperatura, há economia de energia. Além disso, os corredores podem promover a melhora da qualidade do ar e, consequentemente, da saúde da população. Eles também ajudam a ampliar o habitat para espécies e promover a manutenção da diversidade genética. Ainda, podem se configurar como espaços de recreação e lazer, geração de conhecimento e turismo.
A perspectiva multinível e multiagentes
Planejar Soluções baseadas na Natureza nas cidades com vistas a responder ao desafio climático envolve um esforço proporcional ao tipo de problema. As mudanças climáticas se configuram como um desafio multinível, multidimensional, multissetorial e multiagentes. Portanto, para planejar e implementar soluções eficientes é imprescindível o envolvimento e articulação entre agentes governamentais e não governamentais, como as organizações da sociedade civil, da iniciativa privada, universidades, instituições de pesquisa, redes de cooperação nacionais e internacionais, entre outros.
Além de ampliar e fortalecer os mecanismos democráticos, a participação social é também uma forma de garantir a execução eficiente das políticas públicas. Assim, o processo participativo desde o início do planejamento pode garantir o atendimento às necessidades e vulnerabilidades dos diversos grupos e segmentos; facilitar a construção de parcerias na etapa de implementação das SBN e garantir a sua execução e continuidade, mesmo com mudanças de gestão. O envolvimento dos agentes – um grupo heterogêneo – pode acontecer por meio de arranjos institucionais criados ou reformulados a partir de arranjos preexistentes e, pela natureza do desafio. Esses arranjos precisam abranger os níveis regional e estadual, bem como os diversos setores de atividade envolvidos e as diferentes disciplinas.
SBN nas cidades brasileiras
Diante dos desafios climáticos já vivenciados, Santos, cidade do litoral paulista, deu início à implementação de uma de suas ações do Plano de Ação Climática. A Adaptação baseada em Ecossistemas no Monte Serrat, um dos principais morros da cidade, onde residem mais de 1.600 pessoas, propõe a recuperação da vegetação do morro, entendida como “solução para ampliar a resiliência local, reduzindo o risco climático e oferecendo e ampliando os serviços ambientais e ecossistêmicos do remanescente de Mata Atlântica do morro aos moradores da região”. A principal motivação para essa estratégia é a minimização dos deslizamentos de terra e seus impactos.
A vegetação do Monte Serrat, em Santos, está sendo recuperada para ampliar a resiliência local e reduzir o risco climático. Crédito: Paulo Carmona Sanches Neto/Wikipedia
Essa iniciativa do governo local, por meio da Comissão Municipal de Adaptação à Mudança do Clima, que reúne diversas secretarias municipais, conta com a participação dos moradores do Monte Serrat, da Comissão Consultiva Técnica Acadêmica, que reúne pesquisadores e cientistas, e da agência de cooperação internacional do governo alemão, a GIZ (Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit GmbH), que financia o projeto “Apoio ao Brasil na Implementação da Agenda Nacional de Adaptação à Mudança do Clima” (ProAdapta), do qual Santos faz parte.
Já no município de Campinas, interior de São Paulo, o que começou como um planejamento de criação de corredores ecológicos e de parques lineares como parte do Plano Municipal do Verde, com objetivo de minimizar o déficit de áreas verdes, ganhou escala e resultou na consolidação de uma Área de Conectividade para promover iniciativas de conservação da biodiversidade e recuperação da paisagem de forma integrada e em nível regional. Essa estratégia de SBN, consolidada como “Reconecta RMC”, conta com os demais municípios da região metropolitana, no âmbito da Agência Metropolitana de Campinas (Agemcamp) e tem o apoio da rede ICLEI-Governos Locais pela Sustentabilidade, com a participação no Projeto INTERACT-Bio e da parceria da Frente Nacional de Prefeitos com o WRI Brasil (World Resources Institute).
Inovação social
A iniciativa de Santos possui um potencial de inovação social a partir de uma mudança significativa nas políticas ao envolver a população mais vulnerável aos impactos das mudanças climáticas no desenvolvimento da estratégia de enfrentamento. Durante o processo, por exemplo, houve o esforço de inserir a percepção de risco de homens e mulheres no planejamento da ação.
Em Campinas, também houve uma mudança significativa nas políticas com maior compreensão acerca do conceito de serviços ecossistêmicos e dos cobenefícios das SBN por parte dos gestores públicos municipais. Inicialmente, entendia-se um parque linear como um meio de conservar a área de preservação permanente (APP), mas esta noção de suprir o déficit de verde foi ampliada, transcendendo o limite do parque. Passando a considerar os benefícios para os moradores do bairro, do município e da região.
Embora as SBN sejam necessárias e relevantes no enfrentamento dos impactos das mudanças climáticas, elas ainda são incipientes no caso brasileiro e estão aquém dos desafios resultantes dessas mudanças. De toda forma, as SBN têm aberto novos caminhos para a governança climática nas cidades brasileiras, o que traz a necessidade de se ampliar o conhecimento sobre elas.
*Fabiana Barbi Seleguim é cientista social e ambiental, pesquisadora de pós-doutorado no Nepam (Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais), participa do Laboratório LabGec (Social Dimensions of Global Environmental Changes in the Global South) e integra as redes de pesquisadores do Earth System Governance Project e Urban Climate Change Research Network.
Texto: Fabiana Barbi Seleguim
Fotos: Divulgação
Edição de imagem: Paulo Cavalheri
Jornal da UNICAMP
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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