Economia na Amazônia Legal cresce mais sem desmatamento
Economia na Amazônia Legal cresce mais sem desmatamento
Manter a floresta em pé e descarbonizar a economia é a grande oportunidade para o desenvolvimento econômico e social da Amazônia e do Brasil.
Um modelo econômico que gere crescimento e empregos para a Amazônia Legal, reduza desigualdades e valorize as culturas tradicionais sem desmatar é a melhor maneira de colocar isso em prática.
É o que comprova o relatório Nova Economia da Amazônia (NEA-BR), elaborado pelo WRI Brasil e pela The New Climate Economy, em parceria com mais de 75 pesquisadores e organizações de diversas regiões do país.
Por Izabela Sanchez, Ingrid Ferreira e Silvia Dias
O estudo mostra que com desmatamento zero, agropecuária de baixa emissão de carbono e matriz energética apoiada sobretudo em energia solar, a Amazônia Legal registraria um crescimento econômico maior, mais qualificado e mais inclusivo até 2050. Neste cenário, em três décadas, a economia da região teria um saldo de 312 mil empregos a mais e geraria um PIB regional de pelo menos R$ 40 bilhões a mais a cada ano a partir da metade do século. Serão 81 milhões de hectares de florestas adicionais e estoque de carbono 19% maior em comparação com o modelo atual de desenvolvimento baseado em atividades intensivas em desmatamento e emissões. Ao final de 2050 o PIB da Amazônia Legal seria de R$ 1,34 trilhão, com 23,2 milhões de empregos.
“Um novo modelo econômico na Amazônia, pautado pela valorização dos atributos naturais e sociais da região, pode gerar inúmeras oportunidades e empregos inclusivos. Esse formato, que tornará a Amazônia a grande catalisadora da descarbonização de toda a economia brasileira, é, sem dúvida, a maior oportunidade de desenvolvimento econômico e social da história contemporânea do país”, destaca Rafael Feltran-Barbieri, economista sênior do WRI Brasil e um dos autores do estudo.
Acesse aqui o relatório completo aqui.
O estudo descreve uma rota de desenvolvimento para o território compreendido pela Amazônia Legal: uma área de 500 milhões de hectares, correspondente a 59% do território nacional, onde vivem cerca de 28 milhões de pessoas, sendo quase 600 mil indígenas de 198 etnias. Um dos grandes benefícios do modelo proposto é justamente o potencial de inserção social e econômica de diferentes populações. O crescimento de setores e atividades como bioeconomia e restauração florestal geraria mais empregos e renda especialmente para negros e indígenas que em 2050 ocupariam 18,7 milhões de postos de trabalho na Amazônia Legal – 345 mil vagas a mais que no cenário de referência.
Para identificar essa capacidade de inserção social e econômica, os pesquisadores da Nova Economia da Amazônia realizaram uma análise inédita de todas as atividades já desenvolvidas na região e cadeias produtivas para as quais o bioma tem vocação, tais como bioeconomia, conservação e expansão dos ativos naturais por meio da restauração florestal. O cenário considerou a adequação da agropecuária e da matriz energética da região a modelos de produção de baixa emissão de carbono, intensivos em trabalho e capital, e orientados pelo desmatamento zero.
Além do crescimento econômico e da geração de empregos para a população local, a reestruturação da economia proposta no relatório permite que o Brasil atinja a meta de manter as emissões acumuladas líquidas, entre 2020 e 2050, em 7,7 GtCO2 – patamar necessário para o cumprimento dos compromissos assinados pelo Brasil no Acordo de Paris. “Conseguimos demonstrar que a economia da Amazônia Legal pode crescer e gerar impacto positivo para as pessoas da região sem nenhum novo desmatamento. Também ficou claro que é impossível alcançar as metas climáticas do Acordo de Paris sem acabar com a degradação da Amazônia, e que só o desmatamento zero não basta. É preciso restaurar áreas degradadas e investir pesado na agricultura e pecuária de baixa emissão de carbono”, explica Barbieri. “Fizemos uma análise econômica qualitativa que vai muito além do PIB e da geração de empregos, como se costuma fazer. O estudo mostra que priorizar a Amazônia traria benefícios para todos os brasileiros”, completa.
Duas inovações são importantes na análise: a junção de modelos econômicos desenvolvidos por diferentes instituições brasileiras de pesquisa, e uma visão integrada das atividades econômicas e desmatamentos pela ótica da demanda.
A primeira inovação permitiu olhar a economia da Amazônia Legal como um sistema com 69 setores produtivos, e como esses setores interagem entre si, dentro da própria região e entre ela e o restante do Brasil e comércio exterior. O estudo quantificou as trocas econômicas, mas também como desmatamentos e emissões são estimulados por essas trocas. Foi possível enxergar também as opções tecnológicas e de substituição do fator terra por capital e trabalho a fim de manter a economia crescendo sem desmatamento e com diminuição drástica de emissões. Com isso, foi possível constatar que, atualmente, a região é um grande depositário de terras que fornece insumos de baixo valor agregado para a economia nacional e internacional, exportando produtos primários e comprando bens e serviços qualificados e de maior agregação de valor.
A outra inovação permite enxergar essas mudanças pela ótica da demanda. Frequentemente desmatamentos são analisados pela ótica da oferta, ou seja, quais setores produtivos estão promovendo a substituição de florestas por outros usos do solo. A Nova Economia da Amazônia adota uma metodologia que permite avaliar o desmatamento também pela demanda, identificando de onde vêm os estímulos para os setores produtivos desmatarem.
Constatou-se que mais de 83% do desmatamento da Amazônia Legal se origina das demandas do restante do Brasil e do comércio exterior. O estudo calculou também que o comércio da região com o restante do Brasil resultou em um déficit de R$ 114 bilhões.
Em conclusão, a Amazônia Legal tem déficit comercial, mas superávit em desmatamento e emissões, com produtos de baixo valor adicionado e altamente intensivos em carbono.
Para reverter esse quadro é preciso investir em uma economia livre de desmatamento, que intensifique a produção, aumente os empregos locais e fortaleça a economia circular e de proximidade. Os investimentos necessários para financiar essa Nova Economia da Amazônia foram estimados em 1,8% do PIB nacional ao ano, contra 1% ao ano na manutenção do crescimento baseado na lógica econômica atual.
A diferença entre os investimentos necessários para financiar a Nova Economia da Amazônia ou manter o crescimento referencial foi calculada em R$ 2,56 trilhões, sendo R$ 152 bilhões a mais para a agricultura, R$ 290 bilhões adicionais à pecuária, R$ 217 bilhões para bioeconomia e restauração florestal, além de R$ 410 bilhões nas mudanças na matriz energética e outros R$ 1,49 trilhão em infraestruturas induzidas. Vale destacar que esse valor não seria aplicado exclusivamente na região, visto a necessidade de harmonização das normas, produtos e processos de baixa emissão transacionados entre a Amazônia e o restante do Brasil.
Por outro lado, o custo de não fazer a transição para a NEA pode ser muito mais alto. Análise com base em estudos que calculam a penalização do PIB em um contexto de eventos extremos e impactos agudos das mudanças climáticas mostrou que os investimentos adicionais de R$ 2,56 trilhões para a transição seriam, nas estimativas econômicas mais conservadoras, menos da metade dos custos gerados por esses impactos.
O estudo também apresenta recomendações importantes para se viabilizar a transição para uma Nova Economia da Amazônia. O setor público deve fazer valer suas funções alocativa e distributiva para sinalizar os rumos a serem tomados pela economia. Zerar subsídios aos fósseis promove justa competição entre as fontes energéticas alternativas; redirecionar linhas de financiamento para atividades de baixa emissão, como a paulatina substituição do Plano Safra pelo Plano ABC, desonera a intensificação produtiva calcada em boas práticas agropecuárias; comando e controle e retomada da lei e da ordem, especialmente no ordenamento territorial da Amazônia Legal é imprescindível para a transição econômica.
O setor privado, por sua vez, precisa aumentar sua capacidade de inovação e exercer seu papel de propulsor da nova economia, aproveitando as oportunidades sinalizadas pelo setor público e enxergando além.
Precisa, também, assumir o compromisso ético de não financiar, não comprar nem vender insumos e produtos a pessoas ou empresas em desconformidade com as leis ambientais, trabalhistas, sanitárias e fiscais.
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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