Quando o mundo chegará ao patamar de 1,5º Celsius?
Quando o mundo chegará ao patamar de 1,5º Celsius? artigo de José Eustáquio Diniz Alves
A janela de oportunidade para limitar o aquecimento global a níveis relativamente seguros está se fechando rapidamente, de acordo com o IPCC
“Nosso mundo está em uma encruzilhada e nosso planeta está na mira.
Estamos chegando a um ponto, sem retorno, de ultrapassar o limite
acordado internacionalmente de 1,5º C de aquecimento global.”
António Guterres, 2023
O aquecimento global é uma grande ameaça existencial à humanidade e precisa ser controlado, como já alertado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Mas há muita curiosidade e preocupação sobre o limite “mágico” de 1,5º Celsius da temperatura global. Qual é o horizonte temporal do limite mínimo estabelecido no Acordo de Paris?
Para responder a essa pergunta precisamos saber se o limite de 1,5º Celsius é mensal, anual, decenal ou outro período de referência. O site do Copernicus Climate Change Service mostra que o limite de 1,5º C já foi atingido nos meses de fevereiro e março de 2016. Contudo, a temperatura do ano de 2016 (período de 12 meses) ficou em 1,25°C acima do período pré-industrial, tendo como base as décadas de 1850-1900. Em fevereiro de 2023, a temperatura global ficou em 1,21º C acima do período pré-industrial. Segundo a Organização Meteorológica Mundial (OMM), a marca de 1,5º C pode ser atingida até 2025.
Contudo, se considerarmos a média da tendência de 30 anos, o patamar de 1,5º C poderá ser atingido até abril de 2035 e o patamar de 2º C até 2060, conforme mostra o gráfico abaixo. Os anos de 2021 e 2022 foram menos quentes do que 2016 e 2020 em função do fenômeno La Niña, que esfriou as águas do oceano Pacífico nos últimos dois anos.
Mas há grande probabilidade do ressurgimento do fenômeno El Niño, que aquece as águas do Pacífico e acelera o aquecimento global, aumentando a inclinação da reta de tendência de longo prazo. A Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera dos Estados Unidos (NOAA) anunciou em meados de março de 2023 que o fenômeno La Niña chegou ao fim e destacou a possibilidade de volta do El Niño. É provável que o El Niño ocorra durante o pico da temporada de furacões no hemisfério norte – agosto, setembro e outubro (ASO) – voltando a atuar pela primeira vez em cinco anos.
O provável retorno do El Niño levanta o alerta sobre como ele pode acelerar o aquecimento global e causar eventos climáticos extremos. Os últimos grandes episódios do El Niño foram em 1998 e em 2015/2016, o que elevou as temperaturas médias globais a recordes e contribuiu para a perda devastadora de florestas tropicais, branqueamento de corais, derretimento do gelo polar e incêndios florestais.
Mesmo sem os efeitos do fenômeno El Niño, tudo indica que o mês de março de 2023 apresentará temperatura alguma coisa próxima de 1,5º C em relação ao período pré-industrial, pois diversas áreas do Planeta registram temperaturas acima da média, sendo que em enormes regiões do globo a temperatura está muitíssimo acima do normal com ondas de calor em pleno inverno astronômico em países do Hemisfério Norte, conforme mostra o mapa abaixo do MetSul. O Brasil está em uma situação neutra e o Rio Grande do Sul é o estado brasileiro com maior anomalia de calor em março de 2023.
Sem dúvida, a humanidade continua na autoestrada do inferno climático, como disse o Secretário-geral da ONU, António Guterres. Perguntei ao Chat GPT quais as consequências de o mundo ultrapassar o limite de 1,5 graus celsius da temperatura global? Segue a resposta, que pode não ser completa, mas é suficientemente direta para mostrar o enorme perigo que a humanidade enfrenta:
“Se o mundo ultrapassar o limite da temperatura global de 1,5 graus Celsius, podemos esperar consequências significativas em muitas áreas da vida humana e do meio ambiente, incluindo:
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Aumento do nível do mar: À medida que as temperaturas globais aumentam, os mantos de gelo polares derretem, o que aumenta o nível do mar e pode inundar áreas costeiras.
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Eventos climáticos extremos: O aquecimento global pode aumentar a frequência e intensidade de eventos climáticos extremos, como ondas de calor, secas, inundações e tempestades, o que pode ter um impacto significativo na agricultura, na biodiversidade e em comunidades inteiras.
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Escassez de água: O aquecimento global pode afetar a disponibilidade de água doce em todo o mundo, uma vez que as mudanças climáticas alteram os padrões de chuva e aumentam a evaporação. Isso pode levar a escassez de água em muitas regiões, exacerbando conflitos sobre recursos naturais.
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Perda de biodiversidade: O aumento da temperatura global pode alterar os habitats naturais, levando à perda de espécies animais e vegetais. Isso pode ter um efeito cascata na cadeia alimentar e afetar a produção de alimentos.
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Problemas de saúde: O aumento da temperatura pode levar a um aumento das doenças transmitidas por vetores, como malária e dengue, bem como doenças respiratórias devido à poluição do ar.
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Deslocamento de populações: Com o aumento do nível do mar e a intensificação de eventos climáticos extremos, milhões de pessoas podem ser forçadas a deixar suas casas e comunidades em busca de abrigo seguro e recursos básicos.
Essas são apenas algumas das consequências possíveis do aquecimento global acima do limite de 1,5 graus Celsius. É importante lembrar que os efeitos do aquecimento global não são isolados e podem interagir e se amplificar, tornando o cenário futuro ainda mais imprevisível”.
Portanto, a janela de oportunidade para limitar o aquecimento global a níveis relativamente seguros está se fechando rapidamente, de acordo com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Para haver 50% de chance de evitar o limite de 1,5°C de aquecimento ao longo do século 21, as emissões globais de carbono terão que atingir o zero líquido (onde não há mais carbono liberado na atmosfera do que removido) no início da década de 2050. As emissões de todos os gases de efeito estufa devem atingir o pico até 2025 e a oferta e a demanda de combustíveis fósseis devem ser reduzidas rapidamente.
O IPCC divulgará a última parte de seu 6º Relatório de Avaliação (AR6) neste 20 de março de 2023, após a sessão plenária presencial realizada de 13 e 19 de março. O relatório Síntese captura as últimas descobertas dos três Relatórios de Avaliação (Physical Science Basis, Impacts, Adaptation and Vulnerability e Mitigation of Climate Change) e dos três Relatórios Especiais anteriores (Global Warming of 1.5C, Climate Change and Land, The Ocean and Cryosphere in a Change Climate). A Síntese abrangerá o estado atual e as tendências das mudanças climáticas, as respostas a curto prazo entre 2030-2040 e os impactos a longo prazo no clima e no desenvolvimento social.
Sem dúvida, a humanidade está trilhando de maneira acelerada a autoestrada da emergência climática e precisa reverter o processo de crescimento demográfico e econômico para evitar que amplas partes da Terra fiquem inabitáveis.
O decrescimento pode ser o caminho para mitigar o aquecimento global e para a civilização se adaptar aos cenários mais inóspitos da crise climática e ambiental.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. A dinâmica demográfica global em uma “Terra inabitável”. RELAP, Vol. 14 – Número 26, janeiro de 2020: https://revistarelap.org/index.php/relap/article/view/239/350
ALVES, JED. Crescimento demoeconômico no Antropoceno e negacionismo demográfico, Liinc em Revista, RJ, v. 18, n. 1, 2022 https://revista.ibict.br/liinc/article/view/5942/5595
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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