A Convenção da Biodiversidade será capaz de reverter o ecocídio?
A Convenção da Biodiversidade será capaz de reverter o ecocídio? artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“A humanidade se tornou uma arma de extinção em massa”
António Guterres (06/12/2022)
A população humana era de apenas 4 milhões de habitantes no início do Holoceno, há 12 mil anos. No ano 1 da Era Cristã já estava em torno de 200 milhões de habitantes, chegou a 1 bilhão de habitantes por volta de 1800 e atingiu 8 bilhões de habitantes em 2022. Nos últimos 250 anos, a economia global cresceu 135 vezes, a população mundial cresceu 9,2 vezes e a renda per capita cresceu 15 vezes. Este crescimento demoeconômico foi maior do que o que ocorreu em todo o período dos 200 mil anos anteriores, desde o surgimento do Homo sapiens.
Mas todo o crescimento e enriquecimento humano ocorreu às custas do encolhimento e empobrecimento do meio ambiente e da biodiversidade.
Segundo Ron Patterson (2014): “Há 10.000 anos os seres humanos e seus animais representavam menos de um décimo de um por cento da biomassa dos vertebrados da terra. Agora, eles são 97 por cento”. A jornalista Elizabeth Kolbert, no livro “The Sixth Extinction”, documentou o processo de extinção das espécies que ocorre com o avanço da civilização.
O Relatório Planeta Vivo 2022, divulgado pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF), em 14 outubro de 2022, mostra que o crescimento das atividades antrópicas tem provocado uma degradação generalizada dos ecossistemas globais e gerado um ecocídio da vida selvagem do planeta: as populações de vertebrados silvestres, como mamíferos, pássaros, peixes, répteis e anfíbios, sofreram uma redução de 69% entre 1970 e 2018.
O relatório da WWF é baseado no acompanhamento de 31.821 populações de 5.230 espécies, utilizando câmeras, análise de pegadas, programas de investigação e ciências participativas. Da vida marinha às florestas tropicais, da abundância de pássaros, peixes, anfíbios e répteis – toda a riqueza da vida selvagem – está em queda livre, diminuindo em média mais de dois terços nos últimos 50 anos, como mostrado no gráfico abaixo. Enquanto isto os humanos continuam a se avolumar e a desmatar florestas, consumindo além dos limites do planeta e poluindo em escala agropecuária e industrial.
Para tentar reverter o processo de ecocídio da 6ª extinção em massa das espécies, mais de 190 Estados participantes da Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas para a Diversidade Biológica (COP15) chegaram a um acordo histórico em Montreal, no Canadá. O chamado pacto de paz com a natureza visa impedir a continuidade do sistema de destruição da biodiversidade. Os países concordaram com um roteiro visando proteger 30% do planeta até 2030 e libertar 30 mil milhões de dólares em ajuda anual à conservação ecológica para os países em desenvolvimento. Além desta garantia de 30% da superfície protegida e das metas de financiamento, o Acordo Kunming-Montreal propõe restaurar 30% das terras degradadas, cortar pela metade os riscos ligados ao uso de agentes químicos e pesticidas e reduzir em 50% o desperdício global de alimentos até 2030.
Diversas organizações ambientalistas festejaram o acordo depois de uma década de esforços fracassados para acabar com a devastação da natureza e dos ecossistemas. A experiência de condução conjunta entre Canadá (como anfitrião) e China (presidindo a cúpula) apresentou resultados positivos na COP15, apontando um avanço na governança global para o ambiente.
Atualmente, apenas 17% da terra e 8% dos mares estão protegidos. No início da COP15, o secretário-geral da ONU, António Guterres disse que a humanidade se tornou uma “arma de extinção em massa” e pediu às partes que aprovassem o “pacto de paz com a natureza”. Como disse a ministra Sônia Guajajara: “A luta pela Mãe Terra é a mãe de todas as lutas”.
Reconhecer a necessidade de reverter a degradação ecológica é um passo fundamental. Mas a grande dificuldade é implementar a proteção à biodiversidade. O grande desafio colocado é que a humanidade já superou a capacidade de carga da Terra e continua aumentando a Pegada Ecológica global. Sem um decrescimento demoeconômico em nível internacional será difícil garantir espaço para as outras espécies vivas do Planeta.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. Erradicar o Ecocídio, Ecodebate, 31/10/2012
http://www.ecodebate.com.br/2012/10/31/erradicar-o-ecocidio-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
WWF. Living Planet Report 2022 – Building a nature-positive society. Almond, R.E.A., Grooten, M., Juffe Bignoli, D. & Petersen, T. (Eds). WWF, Gland, Switzerland, 2022
https://wwflpr.awsassets.panda.org/downloads/lpr_2022_full_report.pdf?fbclid=IwAR1mrCK2hJSzyM8rt92CAkQuf_G2v1V-ov8w-pyIceI2bQNfWcAPkSzmJac
PATTERSON, Ron. Of Fossil Fuels and Human Destiny, May 7, 2014
http://peakoilbarrel.com/natural-resources-human-destiny/
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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