População da Etiópia de 1950-2100
População da Etiópia de 1950-2100, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
Os desafios da Etiópia são enormes e o rápido crescimento demográfico tende a aumentar as dificuldades para o desenvolvimento do país com sustentabilidade ambiental
A Etiópia é o berço do Homo sapiens e uma das principais nações da África. O país tem uma área de 1,1 milhão de km2 e uma densidade demográfica de 123 habitantes por km2 em 2022, menor do que a densidade da China (149 hab/km2) e bem superior à densidade brasileira (26 hab/km2).
A Etiópia tinha 17,5 milhões de habitantes em 1950, saltou para 123,4 milhões em 2022 e deve atingir 324 milhões em 2100 (como mostra o gráfico abaixo do painel da esquerda). A população etíope em idade ativa, de 15-59 anos, deu um salto de cerca de 9 milhões de pessoas em meados do século passado para cerca de 100 milhões em 2022 e deve atingir cerca de 200 milhões de pessoas no final do atual século. Portanto, a Etiópia terá uma grande necessidade de geração de emprego nas próximas 8 décadas (conforme mostra o gráfico abaixo, no painel da direita).
Os gráficos abaixo mostram a evolução das taxas de fecundidade e a expectativa de vida. A Etiópia tinha uma média acima de 6 filhos por mulher durante quase toda a metade do século passado. A transição da fecundidade começou tardiamente e a taxa de fecundidade ainda é elevada, em torno de 4 filhos por mulher. A taxa de reposição deve ser alcançada somente no final do século XXI (como mostra o gráfico abaixo, painel da esquerda).
A expectativa de vida ao nascer, que estava em torno de 35 anos em 1950, variou nos anos seguintes e teve uma grande queda na década de 1980 e chegou a 65 anos em 2020. Houve uma queda em decorrência da pandemia. Na projeção média da Divisão de População da ONU a expectativa de vida ao nascer, para ambos os sexos, deve ficar em torno de 80 anos em 2100 (como mostra o gráfico acima, painel da direita).
Mesmo com uma lenta transição demográfica já se nota uma alteração na estrutura etária da Etiópia, pois a população jovem de 0-14 anos vai apresentar um decrescimento na segunda metade do século XXI, como mostra o gráfico abaixo (painel da esquerda). Já o número de idosos (gráfico da direita) cresceu lentamente entre 1950 e 2050 e deve acelerar o crescimento na segunda metade do século XXI. No final do atual século, a Etiópia terá mais idosos do que o Brasil.
A lenta mudança da estrutura etária tem mantido as pirâmides etárias da Etiópia com uma base larga, conforme mostrado nos gráficos abaixo. A pirâmide etária de 1950 tinha o modelo clássico de estrutura rejuvenescida e se manteve mais ou menos assim até 2022. Assim, o país mantém uma alta razão de dependência de jovens e uma baixa proporção de pessoas em idade ativa. Se a queda da fecundidade se aprofundar poderá haver o aproveitamento do 1º bônus demográfico, que é uma condição essencial para a redução da pobreza e o a melhoria do padrão de vida da população. A pirâmide de 2100 já apresentar uma leve redução da base e um crescimento do meio da distribuição etária.
A Etiópia terá uma situação demográfica favorável à oferta de força de trabalho no restante do século XXI, pois a razão de dependência vai diminuir de cerca de 100 na década de 1980 para menos de 60 entre 2060 e 2090, como mostra o gráfico abaixo. Se a economia reagir e conseguir gerar grande quantidade de emprego, a Etiópia poderá avançar no processo de desenvolvimento humano. Mas se a economia fracassar, o país terá uma bolha de jovens, que na falta de perspectivas de mobilidade social ascendente, poderá criar instabilidade política e anomia social.
A Etiópia manteve uma participação no PIB global em torno de 0,05 e 0,1% nas duas últimas décadas do século passado. Nos anos 2000 houve um maior crescimento econômico e o PIB da Etiópia alcançou o patamar de 0,2% do PIB global em 2020, conforme mostra o gráfico abaixo (lado esquerdo). A renda per capita da Etiópia (em preços correntes em poder de paridade de compra) era de apenas US$ 305 em 1980, bem abaixo da renda per capita mundial. Nos anos 2000 a renda cresceu até US$ 3,4 mil em 2022 e deve chegar a US$ 5 mil em 2026, conforme mostra o gráfico abaixo (lado direito).
A Etiópia tem um padrão de consumo baixo. Mesmo assim o país tem um déficit ecológico. Segundo o Instituto Global Footprint Network a Etiópia tinha, em 1993, uma Pegada Ecológica per capita de 1 hectare global (gha) e uma Biocapacidade per capita de 0,58 gha. Portanto havia déficit ambiental que se manteve nestas 3 últimas décadas. Em 2018, a Pegada Ecológica per capita passou para 1,02 gha e a Biocapacidade per capita caiu para 0,56 gha em 2018. Assim, o déficit ecológico per capita ficou em 0,46 gha, o que representa um déficit relativo de 82%, conforme mostra a figura abaixo.
A Etiópia tem apresentado um crescimento acima da média nos anos 2000. O país é berço de uma civilização antiga e que teve um estado-nação relativamente maduro bem cedo, como o Reino Aksumita, datando do século I DC. Os regimes subsequentes, através dos tempos medievais e além, exerceram uma boa quantidade de poder. Mais importante, os etíopes de hoje veem seu país como uma extensão direta dessas unidades políticas anteriores. Alguns etíopes influentes afirmaram traçar sua linhagem até o rei Salomão dos tempos bíblicos. O país tem vínculos entrelaçados com as três maiores religiões abraâmicas do mundo. A Etiópia divide com a África do Sul o posto de maior número de Patrimônios Mundiais da UNESCO na África.
Os etíopes costuma expressar um notável grau de entusiasmo pelo seu país e cultura, incluindo seu papel na história bíblica. Eles se consideram uma civilização e não apenas um país. Eles se separam de forma autoconsciente das linhas mais amplas da história e cultura africanas. Quando o continente africano foi dividido politicamente entre as potências europeias na Conferência de Berlim, a Etiópia foi um dos dois únicos países que mantiveram sua independência. Addis Abeba é sede da União Africana e da Comissão Econômica das Nações Unidas para a África.
Em 2022, começou a funcionar a Grande Barragem do Renascimento Etíope que é a maior usina hidrelétrica no continente africano e a sétima maior do mundo. Mas como a barragem foi construída no principal afluente do rio Nilo – o Nilo Azul – o projeto tem gerado tensões com os países vizinhos que sofrem com o estresse hídrico, mas especialmente com o Egito que não quer ter a sua vazão de água restringida.
Enquanto a Etiópia busca garantir o seu abastecimento de água e de energia, o Egito ameaça até a entrar em guerra com a Etiópia pelo acesso à água. O governo egípcio afirma que a barragem irá reduzir os mais de 56 mil milhões de metros cúbicos de água por ano que utiliza do Nilo. Com um custo estimado em US$ 4,2 bilhões, o projeto foi financiado inteiramente por verbas nacionais e pela emissão de obrigações junto da comunidade etíope na diáspora.
Mas a Etiópia, localizada no leste da África, perto do Mar Vermelho, convive com uma sangrenta disputa que ameaça engolir também a capital do país, Addis Abeba. O conflito já deixou milhares de mortos e mais de dois milhões de desalojados. Algo surpreendente, pois o primeiro-ministro Abiy Ahmed recebeu o prêmio Nobel da Paz em 2019 pela resolução de um conflito antigo com a vizinha Eritreia.
Portanto, os desafios da Etiópia são enormes e o rápido crescimento demográfico tende a aumentar as dificuldades para o desenvolvimento do país com sustentabilidade ambiental.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referência:
ALVES, JED. Crescimento demoeconômico da Etiópia: a “China da África”? Ecodebate, 30/01/2019
https://www.ecodebate.com.br/2019/01/30/crescimento-demoeconomico-da-etiopia-a-china-da-africa-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
Vinicius Assis. Na Etiópia, a guerra que ninguém vê, #Colabora, 15/03/2022
https://projetocolabora.com.br/ods16/na-etiopia-a-guerra-que-ninguem-ve/
[ Se você gostou desse artigo, deixe um comentário. Além disso, compartilhe esse post em suas redes sociais, assim você ajuda a socializar a informação socioambiental ]
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
A manutenção da revista eletrônica EcoDebate é possível graças ao apoio técnico e hospedagem da Porto Fácil.
[CC BY-NC-SA 3.0][ O conteúdo da EcoDebate pode ser copiado, reproduzido e/ou distribuído, desde que seja dado crédito ao autor, à EcoDebate com link e, se for o caso, à fonte primária da informação ]