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Artigo

A população do Japão de 1950 a 2100

 

A população do Japão de 1950 a 2100, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

Com o decrescimento da população e as mudanças no padrão de consumo, a Pegada Ecológica do Japão já está diminuindo, mas está longe de zerar o déficit

A presença humana no Japão aconteceu há 35 mil anos, quando os povos do leste da Ásia chegaram ao arquipélago japonês. A população cresceu e a cultura se desenvolveu com grande influência da China e da filosofia de Confúcio. A religião xintoísta se expandiu a partir da influência do taoísmo.

O budismo (original da Índia) chegou ao Japão somente no ano de 552 trazido por sacerdotes da China e da Coreia. Os portugueses chegaram a ter influência no Japão no século XVI e conseguiram converter muitos japoneses ao catolicismo. Neste período o Japão, com cerca de 26 milhões de habitantes, era uma sociedade feudal relativamente bem desenvolvida com tecnologia pré-industrial. No início do século XVII, O Xogum Tokugawa unificou o país e expulsou os portugueses, fechando o país aos estrangeiros por cerca de 250 anos.

Mas em 1854, os navios da Marinha dos Estados Unidos, liderados por Matthew C. Perry, forçaram a abertura do país ao comércio internacional, enfraquecendo o xogunato Tokugawa. Em 1868, houve a chamada restauração Meiji, quando o poder foi centralizado nas mãos do imperador Mutsuhito.

Reconhecendo que o Japão estava atrasado em relação aos países ocidentais a revolução Meiji iniciou um processo acelerado de desenvolvimento econômico e fortalecimento do poderio japonês para fazer frente às ameaças externas. O Japão surpreendeu o mundo ao vencer a Rússia na guerra de 1904-1905. Mas em seguida optou pelo empoderamento militar e conquistou a Coreia, Taiwan e a ilha de Sacalina.

Nos anos 1930 invadiu a Manchúria, na China, cometendo uma série de barbaridades e se aliou ao Eixo fascista/nazista na Segunda Guerra Mundial. Em 7 de dezembro de 1941, o Japão atacou a base naval de Pearl Harbor e declarou guerra aos Estados Unidos. Somente depois dos bombardeios atômicos de Hiroshima e Nagasaki, em 1945, o Japão concordou com a rendição incondicional de suas forças em 15 de agosto de 1945. A derrota na Segunda Guerra obrigou o Japão a seguir um caminho de paz e a ocupação americana proibiu a formação de um exército ofensivo e o uso de armas nucleares.

Portanto, o Japão não tinha muitas outras alternativas e optou por uma solução de paz e de desenvolvimento de tecnologia civil para sair da situação de destruição e de pobreza deixada pela herança militarista. Os grandes conglomerados japoneses – que participaram da aventura do imperialismo de guerra e de colonização – passaram a atuar para a conquista de mercados para a crescente indústria de bens e serviços. O setor produtivo do Japão aperfeiçoou suas vantagens comparativas e buscou todas as oportunidades possíveis para vender seus produtos e garantir divisas para comprar alimentos e matérias-primas para as quais o país era carente. O Japão deixou para trás as políticas pronatalistas da época imperialista e seguiu o caminho da transição demográfica.

O Japão com uma área de 378 mil km2, tinha uma população de 84,4 milhões de habitantes em 1950, com uma densidade demográfica de 224 habitantes por km2. Como tinha uma estrutura etária jovem, a população cresceu bastante nas décadas seguintes, mas em ritmo cada vez mais lento, pois houve uma profunda queda das taxas de fecundidade. A população japonesa atingiu o pico populacional em 2009, com 128,1 milhões de habitantes e uma densidade demográfica de 340 habitantes por km2. Em 2022, a população já tinha caído para 123,9 milhões e deve chegar em 2100 com 73,6 milhões e uma densidade demográfica de 195 habitantes por km2, segundo a projeção média da Divisão de População da ONU (como mostra o gráfico abaixo, do painel da esquerda). O Japão terá no final do atual século uma população menor do que tinha em meados do século passado.

A população japonesa de 15-59 anos aumentou durante quase toda a segunda metade do século passado, mas atingiu o pico de 80 milhões de pessoas na década de 1990, já diminuiu para 65 milhões em 2022 e deve ficar em torno de 35 milhões em 2100 (conforme mostra o gráfico abaixo, no painel da direita). Ou seja, o Japão tem uma oferta quantitativa de força de trabalho em declínio e tem investido na robotização e automação da produção para garantir a produtividade da economia e a qualidade educacional e tecnológica da mão-de-obra.

população total e população em idade ativa no japão

 

Os gráficos abaixo mostram a evolução da taxa de fecundidade total (TFT) e a expectativa de vida. A Rússia já tinha uma fecundidade baixa no fim da Segunda Guerra. A taxa de fecundidade estava em torno de 5 filhos por mulher logo após o fim da Segunda Guerra e caiu para 2,06 filhos por mulher em 1959. A partir da década de 1970 a TFT ficou abaixo do nível de reposição e chegou na virada do milênio com apenas 1,3 filho por mulher. A perspectiva é que a TFT fique em torno de 1,5 filho no restante do século (como mostra o gráfico abaixo, painel da esquerda). Como as taxas de imigração são baixas no Japão, a perspectiva é que realmente haja decrescimento demográfico no restante do século.

taxa de fecundidade e expectativa de vida no japão

 

O Japão sempre teve uma expectativa de vida maior do que seus vizinhos, pois tinha uma população com hábitos alimentares mais saudáveis e uma grande interação entre a comunidade para reduzir os riscos de morte e investir no saneamento básico. A expectativa de vida ao nascer era de 60 anos em 1950 e chegou a 80 anos em 1996 (por exemplo, os EUA até hoje não chegou aos 80 anos). Desta forma, a população japonesa tem a mais alta expectativa de vida do mundo, chegando a 84,8 anos em 2022 e com estimativa de 94,2 anos em 2100 (como mostra o gráfico acima, painel da direita).

O aprofundamento da demográfica implica diminuição dos grupos jovens e de aumento da proporção dos grupos mais idosos. O gráfico abaixo (da esquerda) mostra que a população de 0 a 14 anos do Japão era de 30 milhões em 1950 e deve ficar abaixo de 10 milhões em 2100. O número de idosos (gráfico da direita) era de 6,4 milhões de pessoas de 60 anos e mais de idade e deve atingir o pico em 2039 com 47,3 milhões e decrescendo para 32,9 milhões em 2100. Em termos relativos o Japão atual é o país mais envelhecido do mundo, com estimativa de chegar a 45% de idosos na população total no final do atual século. Neste sentido, o Japão está investindo no aproveitamento do 3º bônus demográfico, o chamado bônus da longevidade.

população jovem e população idosa no japão

 

As mudanças da estrutura etária, provocada pelo avanço da transição demográfica se expressa na transformação da pirâmide populacional, conforme mostrado nos gráficos abaixo. A pirâmide etária japonesa de 1950 tinha vários “dentes” que registram os efeitos na mortalidade e na natalidade durante a 1ª e a 2ª Guerras Mundiais. A pirâmide de 1950 mostra uma entrada na faixa de 30 a 40 anos que é resultado da queda da natalidade durante a 1ª Guerra Mundial. A base larga indica o aumento da natalidade na segunda metade da década de 1940.

A redução da fecundidade nos últimos 50 anos fica evidente na pirâmide japonesa de 2022 e os efeitos das guerras aparecem nos “dentes” do topo da pirâmide. Já na pirâmide de 2100 aquelas fortes entradas desaparecem e a pirâmide passa a ter uma forma mais parecida com um retângulo, refletindo a longa permanência das taxas de fecundidade abaixo do nível de reposição.

pirâmides populacionais do japão

 

A razão de dependência japonesa caiu antes da Segunda Guerra, chegou ao menor nível entre 1970 e 1990, já tem subido nos últimos 30 anos e deve chegar ao patamar de 130 pessoas dependentes para cada 100 pessoas em idade ativa no final do século. Esta realidade demográfica tem colocado grande desafio para a sociedade japonesa que precisa aumentar a produtividade da população de 15-59 anos e elevar o nível de inserção da população idosa nas atividades produtivas.

221123e taxa de dependência no japão

 

O alto crescimento econômico do Japão ocorrido entre 1950 e 1990, conhecido como milagre japonês, fez do país uma potência econômica, mas passou a ter um ritmo lento quando a população em idade ativa (PIA) começou a diminuir (gráfico abaixo, do lado esquerdo). O Japão chegou a ser a 2ª maior economia do mundo na década de 1980, mas depois perdeu espaço no cenário internacional nas últimas décadas e foi superado pela China e pela Índia. A renda per capita japonesa (em preços correntes em poder de paridade de compra) estava em torno de US$ 10 mil em 1980 e superou US$ 350 mil atualmente, bem acima da renda média mundial (gráfico do lado direito).

participação do pib do japão no pib global

 

Por ter uma alta densidade demográfica e um alto crescimento econômico, o Japão sempre teve déficit ambiental. Segundo o Instituto Global Footprint Network, em 1961, o Japão tinham uma Pegada Ecológica per capita de 2,97 hectares globais (gha) e uma Biocapacidade per capita de 1,01 gha. Mas a Pegada Ecológica per capita subiu para 4,61 gha, com uma Biocapacidade de somente 0,59 gha em 2018. Assim, o déficit ecológico per capita passou para 4,02 gha, representando um déficit relativo de 681%, conforme mostra a figura abaixo.

pegada ecológica e biocapacidade per capita do japão

 

Com o decrescimento da população e as mudanças no padrão de consumo, a Pegada Ecológica do Japão já está diminuindo, mas evidentemente está longe de zerar o déficit. A redução das emissões de CO2 pode ser alcançada se o Japão avançar na transição energética e na transição da indústria automobilística do motor à combustão interna para os veículos elétricos.

Se o Japão cumprir as Contribuições Voluntárias Nacionalmente Determinadas (INDCs) prometidas na COP-21, haverá redução da Pegada Ecológica, com a vantagem de o Japão ser um dos países com maior cobertura florestal. O lado positivo é que o déficit ambiental está diminuindo, mas é necessário que esta redução seja mais veloz e a restauração ecológica seja mais rápida.

José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382

Referências:

ALVES, JED. A população do Japão em 2100, Ecodebate, 21/09/2012
http://www.ecodebate.com.br/2012/09/21/a-populacao-do-japao-em-2100-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

ALVES, JED. Prosperidade e decrescimento demoeconômico no Japão, Ecodebate, 13/07/2016
https://www.ecodebate.com.br/2016/07/13/prosperidade-e-decrescimento-demoeconomico-no-japao-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

 

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