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Recorde máximo de temperatura e de degelo na Antártida

 

Recorde máximo de temperatura e de degelo na Antártida, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

O degelo da Antártida tem se acelerado e apenas 5% de perda será suficiente para inundar grandes áreas urbanas e rurais. A maior parte do litoral brasileiro está ameaçado pelas inundações

Os primeiros três meses de 2022 foram marcados por recordes de calor e de degelo nos polos. Na Antártida, os registros indicaram temperatura de 40º C acima do normal, em 18/03/2022, conforme mostra o gráfico abaixo, que apresenta a curva climatológica anual da estação Dome C, no Leste da Antártida, com os extremos diários de mínima e máxima desde o começo dos registros em 1990. A máxima de 2022 chegou a tornar irrelevante os recordes anteriores.

recordes de calor e de degelo nos polos

O gelo marinho ao redor da Antártida apresentou, no início de 2022, o menor nível de todos os tempos, desde que começaram as medições por satélite. A camada de gelo que congela sobre o Oceano Antártico estava aumentando nas últimas décadas do século XX, enquanto o gelo no resto do mundo diminuía devido às mudanças climáticas. Mas no final de fevereiro de 2022, pela primeira vez, a extensão do gelo marinho ficou abaixo de 2 milhões de km2.

A despeito das variações anuais, a reta de tendência dos dados mensais estava sempre direcionada para cima e a inclinação era positiva. Os gráficos abaixo mostram os dados relativos aos meses de fevereiro e março. Nota-se que entre 1979 e 2017 a inclinação da reta de fevereiro era de 3,0 + ou – 3,8% por década, mesmo considerando que em 2016 e 2017 a anomalia ficou abaixo da média do período. Mas considerando o período 1979 e 2022 a inclinação da reta ficou negativa, marcando -0,4 + ou – 3,4%. Nota-se que entre 1979 e 2017 a inclinação da reta de março era de 3,3 + ou – 3,8% por década, mesmo considerando que em 2017 a anomalia ficou abaixo da média do período. Mas considerando o período 1979 e 2022 a inclinação da reta caiu para 0,9 + ou – 3,4%.

evolução do gelo marinho antártida

O gráfico abaixo, também da National Snow & Ice Data Center (NSIDC), mostra que a extensão de gelo marinho na Antártida na média do período 1981-2010 e o ano 2022. O mês de março de 2022 apresenta o menor nível de todos os tempos, o que provocou a inclinação negativa da reta de tendência de longo prazo.

extensão do gelo marinho da antártida

A temperatura da Terra já aumentou 1,2º Celsius desde o período pré-industrial e a meta estabelecida no Acordo de Paris, em 2015, era limitar o aquecimento global a 2º C, com esforços para que ele não ultrapasse os 1,5º C. Mas, as gerações que estão nascendo agora e que terão muitas pessoas sobreviventes no ano de 2100, vão passar por quatro vezes mais extremos climáticos do que passam agora, no cenário de 1,5º C. Mas se as temperaturas aumentarem por volta de 2º C, elas terão cinco vezes mais inundações, tempestades, secas e ondas de calor do que agora.

Segundo o IPCC, pelo menos 3,3 bilhões de pessoas são altamente vulneráveis às mudanças climáticas e 15 vezes mais propensas a morrer por condições climáticas extremas.

O degelo da Antártida tem se acelerado e apenas 5% de perda será suficiente para inundar grandes áreas urbanas e rurais. A maior parte do litoral brasileiro está ameaçado pelas inundações, como mostrei em artigo do Ecodebate (Alves, 19/03/21). Assim, o degelo da Antártida é uma péssima notícia para a humanidade.

O nível do mar deve subir dezenas de centímetros no século XXI, dependendo dos níveis das emissões futuras e da aceleração do aquecimento global. As gerações que ainda nascerão vão herdar um mundo mais complicado e mais inóspito, podendo haver uma mobilidade social descendente em um mundo com muitas injustiças ambientais, apartheid climático e conflitos de diversas ordens.

Uma plataforma de gelo, com área mais de duas vezes maior que a da cidade de Porto Alegre, desmoronou completamente no Leste da Antártida Oriental. A plataforma de gelo Conger, que tinha uma superfície aproximada de 1.200 quilômetros quadrados, desabou por volta de 15 de março.

Nem tudo o que acontece na natureza se deve apenas ao aquecimento global. A Antártida perde massa através da descarga de icebergs e plataformas de gelo crescentes e minguantes como parte de um ciclo natural. Mas o que se vê agora, com o colapso da plataforma de gelo Conger e outras, é a continuação de uma tendência preocupante pela qual as plataformas de gelo da Antártida sofrem colapso em toda a área uma após a outra.

degelo na antártida

O fato é que o degelo dos polos, da Groenlândia e dos glaciares já começou e tende a se acelerar nas próximas décadas. Os indicadores da crise climática e ambiental estão piores do que previsto por modelos anteriores. Toda a vida na Terra é vulnerável ao aquecimento global, incluindo os ecossistemas e a civilização humana. Mitigação e adaptação são fundamentais.

Todavia, se a humanidade não alterar o estilo de vida e a maneira de produzir e consumir, as mudanças podem inviabilizar a capacidade de adaptação e o colapso ecológico seria inevitável. Para salvar a humanidade é preciso salvar a natureza e garantir a estabilidade climática.

José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382

Referências:

ALVES, JED. A inflexão da Antártida: aquecimento e aceleração do degelo, Ecodebate, 10/02/2020
https://www.ecodebate.com.br/2020/02/10/a-inflexao-da-antartida-aquecimento-e-aceleracao-do-degelo-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

ALVES, JED. A elevação do nível do mar e o impacto no litoral brasileiro, Ecodebate, 19/03/21
https://www.ecodebate.com.br/2021/03/19/a-elevacao-do-nivel-do-mar-e-o-impacto-no-litoral-brasileiro/

National Snow and Ice Data Center (NSIDC) https://nsidc.org/data/seaice_index/

Hilmar Gudmundsson et. al. Conger ice shelf has collapsed: what you need to know, according to experts, The Conversation, 28/03/2022
https://theconversation.com/conger-ice-shelf-has-collapsed-what-you-need-to-know-according-to-experts-180077

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

 

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