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Mortes em conflitos por terra disparam em 2021

 

Mortes em conflitos por terra disparam em 2021

Dados parciais da CPT: Violência contra ocupação e a posse, assassinatos de sem-terras e mortes em consequência disparam em 2021

Os dados de “Violência contra a Ocupação e a Posse” nos mostram que a Destruição de Casa, Destruição de Pertences, Expulsão, Grilagem, Pistolagem e Impedimento de acesso a Área de Uso Coletivo alcançou um número de famílias atingidas até 31 de agosto de 2021, maior do que o verificado em todo o ano de 2020. 418 territórios no país foram alvo desse tipo de violência nos primeiros 8 meses de 2021. 28% deles são território indígenas.

Entre janeiro e novembro de 2021, foram registrados 26 assassinatos em conflitos no campo. Um aumento de 30% em relação a todo o ano anterior, quando foram registrados 20 assassinatos [1]. O número de sem-terras assassinados passou de 2, em 2020, para 6, em 2021. Mortes em consequência de conflitos dispararam, tendo um aumento de 1.044%, passando de 09, em todo o ano de 2020, para 103 registradas até o momento. Dessas 103, 101 foram de indígenas Yanomamis.

O Centro de Documentação da Comissão Pastoral da Terra (CPT) – Dom Tomás Balduino (Cedoc/CPT) apresenta neste Dia Internacional dos Direitos Humanos (10), os Dados Parciais dos Conflitos no Campo referentes ao período de 01 de janeiro a 31 de agosto de 2021. Com exceção das categorias de assassinatos e de mortes em consequência, que dizem respeito às violências contra a pessoa, e que aqui apresentamos as ocorrências até o presente momento.

Em 2021, de acordo com os dados parciais, houve um aumento no número de famílias envolvidas nos Conflitos por Terra em 3,55%, apesar de haver diminuição do número de conflitos deste tipo. As ações de resistência dos povos, comunidades tradicionais e movimentos sociais, voltaram a subir, após o descenso do primeiro ano de pandemia. Os acampamentos passaram de 2, entre os meses de janeiro e agosto de 2020, para 3, no mesmo período de 2021, com um aumento de 291% no número de famílias envolvidas. O número de famílias em ocupações e retomadas registrado em 2021, teve um aumento de 558,57%, passando de 519 para 3.418, o que já corresponde a mais que o dobro do número total de famílias registrado em todo o ano de 2020 (1.391). Isso mostra que mesmo com o receio de contaminação pela Covid-19, essas famílias precisaram resistir para manter-se vivas e nos territórios tradicionalmente ocupados. A ofensiva contra os povos do campo, das águas e das florestas não entrou em quarentena.

Em 2021, 418 territórios sofreram “Violência Contra Ocupação e a Posse”. Desses, 28% são territórios indígenas; 23% quilombolas; 14% são territórios de posseiros; 13% são territórios de sem-terras, entre outros. A “destruição de casa” aumentou 94%, “destruição de pertences” 104%, “expulsão” 153%, “grilagem” 113%, “pistolagem” 118% e “impedimento de acesso às áreas de uso coletivo” aumentou 1.057%. Todos esses dados, registrados entre janeiro e agosto deste ano, já ultrapassam os dados de todo o ano de 2020.

Entre as categorias que mais causaram Violências Contra a Ocupação e a Posse: Fazendeiro (23%), Empresário (18%), Governo Federal (14%), Grileiro (13%). A categoria Garimpeiro passou de 3% em 2020 para 6% em 2021. O salto desta categoria também foi registrado em Conflitos pela Água, tendo passado de menos de 1%, em 2020, para 5% em 2021.

violência contra ocupação e posse

Violência contra a Pessoa: triplica o assassinato de sem-terras e mortes em consequência disparam

Em 2021, foram registrados até o momento 26 assassinatos relacionados a conflitos no campo. Comparado com todo ano de 2020, já representa um aumento de 30% de assassinatos no campo.

assassinatos relacionados a conflitos no campo

Das 26 vítimas de assassinatos, 8 eram indígenas, 6 sem-terra, 3 posseiros, 3 quilombolas, 2 assentados, 2 pequenos proprietários e 2 quebradeiras de coco babaçu. Em relação a 2020, o número de indígenas e quilombolas assassinados se manteve igual. O número de sem-terras triplicou, passou de 2 em 2020 para 6 em 2021. Todos os quilombolas assassinados em 2021 (3) eram do Maranhão, o estado com o maior número de assassinatos no ano (9), cerca de um terço do total registrado até o momento.

Todos os 6 sem-terra assassinados foram mortos na Amazônia, dentre os quais, 5 foram mortos em Rondônia. Todos integrantes da Liga dos Camponeses Pobres. 3 deles foram mortos em um Massacre no dia 13 de agosto [2], pelo Batalhão de Operações Especiais (BOPE) da PM de Rondônia e pela Força de Segurança Nacional, no Acampamento Ademar Ferreira, em Nova Mutum, distrito de Porto Velho. Esse foi o único massacre registrado pela CPT, até o momento, em 2021. O conflito na região continua muito tenso [3]. O número de posseiros assassinados passou de 1 em 2020, para 3 em 2021, e de assentados de 1 em 2020 para 2 em 2021.

assassinatos relacionados a conflitos no campo

Além disso, houve um aumento de 50% nas agressões, 200% nas ameaças de prisão, 1.100% nas humilhações, 14% na intimidação e 1.044% nas mortes em consequência.

assassinatos relacionados a conflitos no campo

Das 103 mortes em consequência registradas até o momento em 2021, 101 foram de indígenas yanomamis. Dessas 101 mortes, não é possível extrair, de acordo com as fontes, o número exato de crianças, mulheres e homens que morreram em consequência de conflitos no campo. Isso ocorre pois a fonte de pesquisa não fornece tais informações especificadas. Mas, das 101 mortes, temos informações de que pelo menos 45 eram crianças. A maior parte destes dados foi apresentada no II Fórum de Lideranças Yanomami e Ye’Kwuana, ocorrido entre 4 e 7 de setembro de 2021, na região da Tabalascada, município do Cantá, ao norte de Roraima. Há, inclusive, grande dificuldade em estabelecer as datas exatas de ocorrência destas mortes.

Acompanhamos durante o ano de 2021, diversas invasões de garimpeiros ao território Yanomami, resultando em assassinatos, agressões, ameaças, ameaça ao território, contaminação da água, desmatamento, além de serem vetores de doenças diversas, incluindo a Covid-19. Vimos também crianças sendo sugadas por dragas [4] e morrendo afogadas ao fugirem dos tiros [5] disparados pelos criminosos. A falta de políticas públicas de saúde e alimentação expôs o alto índice de desnutrição que acomete as crianças yanomamis, muitas vezes mortalmente, e também expôs como doenças, a exemplo de malária, leishmaniose e pneumonia, ainda matam esses indígenas em nosso país.

Manifestações e Ações de Solidariedade

Nos primeiros oito meses de 2020, foram registradas 768 Manifestações de Luta, com a presença de 365.526 pessoas. No mesmo período em 2021, foram 1278 Manifestações de Luta, com a presença de 360.781 pessoas. Comparando os dois anos observa-se o aumento de 66,40% no número de Manifestações de Luta e uma redução de 1,29% do número de pessoas presentes em tais manifestações. Compreende-se que o aumento das Manifestações de Luta aconteceu, principalmente, pela participação dos povos do campo, das florestas e das águas nos atos pró vacinação e contra o governo Bolsonaro, e também pelas ações de solidariedade realizadas, principalmente, pelas famílias assentadas e acampadas, que doaram alimentos à população urbana. A redução do número de pessoas se justifica pelo fato de muitas das informações contidas nas fontes não trazerem este número, o que impossibilita um registro preciso dos participantes das manifestações. Em 2020 tivemos, durante todo o ano, um total de 1.348 Manifestações de Luta com a presença de 408.176 pessoas.

Ações de Solidariedade representaram 382 “Manifestações de Luta”, que corresponde a 29,89% do total de Manifestações de Luta realizadas em 2021. O Paraná foi o estado em que mais ocorreram ações de solidariedade (91), seguido de Pernambuco (55), Alagoas (33), São Paulo (27), entre outros.

As Manifestações de Luta que abordaram a Questão Indígena tiveram um aumento de 146% em comparação com 2020. De janeiro a agosto de 2020 foram registradas 46, já no mesmo período de 2021 foram registradas 113 Manifestações de Luta com essa temática. Aqui destacamos o “Acampamento Terra Livre”, o “Levante pela Terra” e o “Acampamento Luta Pela Vida”, todos realizados em Brasília pelos povos indígenas. Os acampamentos também tiveram adesão nacional, com manifestações e atos realizados nos territórios indígenas.  A resistência ao julgamento do Marco Temporal foi a principal pauta das ações dos indígenas. A tese desrespeitaria o direito fundamental dos povos indígenas, que se concretiza no direito originário sobre as terras que tradicionalmente ocupam.

violência pela questão indígena

Amazônia Legal

Os indígenas continuam sendo as maiores vítimas dos Conflitos por Terra na Amazônia Legal. Porém, eles passaram de 42% das vítimas em 2020, para 33% em 2021. Da mesma forma, os quilombolas passaram de 24% em 2020, para 19% em 2021. Em contrapartida, aumentou a violência contra posseiros, sem-terras e assentados na região. Em 2020, 13% das vítimas de violência em conflitos por terra eram posseiros, 10% sem-terra e 4% assentados. Em 2021, passa a ser 19,5% de posseiros, 12% de sem-terra e 7% assentados. Fazendeiros (30%) e grileiros (14%) são os maiores causadores dessas violências na Amazônia Legal.

Dos 26 assassinatos registrados em 2021, 20 ocorreram na Amazônia Legal. 77% do total. Em relação à violência contra a ocupação e a posse na região, os números são alarmantes. 93% do total de famílias vítimas de grilagem de janeiro a agosto de 2021 foram na Amazônia. Além disso, mesmo com uma leve redução de 3% nos dados de desmatamento ilegal, a região ainda responde por 92% das famílias impactadas por esse tipo de crime. 91% do total de famílias que tiveram seus territórios invadidos foi na Amazônia, bem como 80% das famílias impedidas de acessarem as áreas de uso coletivo e 78% das famílias vítimas de pistolagem. As famílias vítimas de contaminação por agrotóxicos na Amazônia, mesmo com uma redução de 11% em relação ao ano anterior, ainda correspondem a 80% do total de famílias vítimas desse tipo de crime no Brasil.

violência contr a ocupação e a posse na amazônia legal

[1] Na publicação “Conflitos no Campo Brasil 2020”, lançada em maio deste ano, a tabela de assassinatos trouxe um total de 18 assassinatos. Após a publicação ser lançada, o Cedoc da CPT recebeu mais 2 assassinatos no estado do Amazonas, que foram atualizados no banco de dados e, por isso, aqui trazemos um total de 20 assassinatos em conflitos no campo no ano de 2020.

[2] https://www.cptnacional.org.br/noticias/acervo/massacres-no-campo/112-rondonia/5779-porto-velho-2021

[3] https://www.cptnacional.org.br/publicacoes/noticias/conflitos-no-campo/5868-maior-acao-de-reintegracao-de-posse-em-rondonia-repete-os-rastros-do-massacre-de-corumbiara

[4] https://www.cptnacional.org.br/publicacoes/noticias/geral/5832-draga-de-garimpeiros-sugou-criancas-indigenas-que-brincavam-no-rio-diz-lideranca-yanomami

[5] https://www.cptnacional.org.br/publicacoes/noticias/conflitos-no-campo/5647-ataques-de-garimpeiros-provocaram-a-morte-de-duas-criancas-yanomamis

Fonte: CPT

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

 

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