A expansão da mancha urbana e a perda de biodiversidade em Porto Seguro, Bahia
A expansão da mancha urbana e a perda de biodiversidade em Porto Seguro, Bahia, artigo de Elissandro Santana
O avanço dos condomínios ocorre por diversos pontos na cidade, interferindo na dinâmica de ecossistemas, dentre eles, manguezais e isso pode gerar uma série de problemas, além dos que já existem
Imagem capturada a partir do Google Earth, em 09 de outubro de 2021.
São muitos os entraves à conservação da biodiversidade em Porto Seguro, no Extremo Sul da Bahia, e a expansão da mancha urbana, a partir da cultura da construção de condomínios e outras formas de moradia na cidade, de forma insustentável, é uma delas.
A cada ano, em muitas partes do município, em especial, no perímetro urbano da sede, as fronteiras do verde são rompidas para a instalação de grandes condomínios – complexos de moradia fixa ou para fins de veraneio – e outros conjuntos habitacionais.
Existem muitas explicações para esse fenômeno, mas, com certeza, o fator que mais sustenta essa expansão, principalmente, a cultura do condomínio, com a consequente redução das áreas verdes, é a noção equivocada, ainda alicerçada na perspectiva colonial, que se vende de Porto Seguro como um paraíso a ser explorado, imagética que se dá por várias vias pelos atores econômicos que lucram com o turismo predatório na região e são muitos esses personagens.
A cada complexo levantado, há a redução da vegetação, principalmente, no perímetro urbano da sede municipal. Isso se dá com a destruição de áreas naturais, por mais que quase tudo ocorra de forma “legal”, ou seja, historicamente, com o aval dos órgãos de fiscalização. Nesse ínterim, cabe destacar que, à medida que as construções avançam, morre-se não somente a flora, como também cursos d’água como riachos e rios, problemas esses que, por si, já seriam um grave problema ambiental, a curto e longo prazo. Na natureza, como tudo se dá em rede e a conservação deve ser entendida, pelo menos, a partir de três pilares, diversidade de espécies, diversidade genética e diversidade de ecossistemas, com a perda de áreas naturais, a fauna que antes ocupava esses espaços, ou migra para remanescentes de mata que estejam próximos, caso existam e seja possível, ou morre, pois com a destruição de habitats, populações inteiras de animais podem entrar em declínio.
O avanço dos condomínios ocorre por diversos pontos na cidade, interferindo na dinâmica de ecossistemas, dentre eles, manguezais e isso pode gerar uma série de problemas, além dos que já existem. Com isso, tem-se que o preço pelo avanço dessa cultura insustentável de construção será pago ao longo dos anos, inclusive por aqueles que não alimentam-retroalimentam essas culturas de moradias insustentáveis, sejam condomínios ou outras construções.
Acerca da importância ecológica dos mangues, para fins de fundamentação da discussão, pode-se ressaltar que o manguezal está associado às margens de baías, de barras, enseadas, desembocaduras de rios, lagunas e reentrâncias costeiras, onde haja encontro de águas de rios com a do mar, ou diretamente expostos à linha da costa1. A cobertura vegetal, ao contrário do que acontece nas praias arenosas e nas dunas, instala-se em substratos de vasa de formação recente, de pequena declividade, sob a ação diária das marés de água salgada ou, pelo menos, salobra. A riqueza biológica dos ecossistemas costeiros faz com que essas áreas sejam os grandes “berçários” naturais, tanto para as espécies características desses ambientes, como para peixes e outros animais que migram para as áreas costeiras durante, pelo menos, uma fase do ciclo de sua vida.2.
Somente por esses serviços ecológicos, este ecossistema deveria ser conservado e preservado, mas, infelizmente, já existem pequenos pontos na cidade com o avanço dessas construções. Sabe-se que o avanço ainda não é grande por este ecossistema, mas não demorará muito para que isso se avolume.
Imagem capturada a partir do Google Earth, em 09 de outubro de 2021.
A culpa pela destruição não pode ser atribuída somente aos empresários que lucram com a cultura do condomínio, mas também aqueles que alimentam o sistema, comprando os produtos desse processo. Quem compra uma residência que foi construída em torno da perda de flora e de fauna deveria assumir o preço da destruição ambiental, mas fica difícil responsabilizar esses atores, haja vista que toda esta problemática é fruto de um longo processo de desligamento do natural e reforçado pelas próprias políticas nacionais. Regionais, locais que facilitam a destruição ambiental.
Dentre os paradoxos para a destruição de espaços verdes em uma cidade como Porto Seguro, apresento a ideia que se vende de cidade com belezas naturais em choque com a exploração insustentável do patrimônio natural municipal. Essa noção, conforme exposto, se esbarra com a destruição de espaços naturais na cidade e, em algum momento, diante da redução e perda de biodiversidade no município, se inviabilizará o marketing semiótico de Porto Seguro como lugar de encantos, pois em tempos de conexão, virtualidades e de informação, a depredação dos espaços será visível para todos e não somente para ambientalistas, cientistas ambientais e outros estudiosos preocupados com o que vem ocorrendo há décadas na cidade.
Diante de tudo o que fora exposto, é importante sinalizar que a questão aqui não é ser contrário à construção de moradias e, até mesmo de condomínios, mas isso deve ser feito de forma responsável-sustentável com justiça socioambiental. A construção desses complexos ou conglomerados habitacionais, seja para o turismo, veraneio ou moradia fixa poderia ocorrer em espaços em que o natural já não mais existe ou pela revitalização de espaços urbanos já existentes, contanto que isso não signifique gentrificação, outro processo tão violento quanto a destruição de espaços naturais para a construção desenfreada de moradias.
Por Elissandro Santana
Mestrando em Conservação da Biodiversidade e Desenvolvimento Sustentável – pela ESCAS – Instituto IPÊ
1 http://ecologia.ib.usp.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=70&Itemid=409
2 http://ecologia.ib.usp.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=70&Itemid=409
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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