Concentração de CO2 bate recorde em 2020 mesmo com pandemia
Concentração de CO2 bate recorde em 2020 mesmo com pandemia, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“Nossa casa ainda está pegando fogo e vocês estão jogando gasolina nas chamas!”
Greta Thunberg
[EcoDebate] A concentração de CO2 na atmosfera ficou abaixo de 280 partes por milhão (ppm) durante todo o Holoceno (últimos 12 mil anos). Mas após a grande arrancada do crescimento demoeconômico global propiciado pela Revolução Industrial e Energética – que iniciou a queima de combustíveis fósseis e o desmatamento das florestas em larga escala – a concentração de CO2 chegou a 300 ppm em 1920, atingiu 317 ppm em março de 1960 e pulou para 417 ppm em maio de 2020, conforme mostra a curva de Keeling do gráfico abaixo.
As emissões globais de CO2 estavam em 2 bilhões de toneladas em 1900, passaram para 6 bilhões de toneladas em 1950, chegaram a 25 bilhões de toneladas no ano 2000 e atingiram 37 bilhões de toneladas em 2019. Em consequência do efeito estufa, as temperaturas do Planeta estão subindo e acelerando as mudanças climáticas e seus efeitos danosos sobre a vida na Terra.
Como disse a ativista adolescente sueca, Greta Thunberg, a “nossa casa está pegando fogo” e a juventude foi para as ruas para protestar, mas a governança global continua perdendo tempo com palavras vazias e grande inação climática na prática.
Depois de tantas Conferências, Acordos e Tratados a curva de Keeling continua subindo e o ritmo do efeito estufa aumentando. Na década de 1960, o ritmo de aumento da concentração de CO2 estava abaixo de 1 ppm ao ano. Na primeira década do século XXI, a concentração de CO2 passou a aumentar a 2 ppm ao ano e na segunda década (2010-2019) passou a aumentar 2,5 ppm ao ano, conforme mostra o gráfico abaixo. Enquanto a população mundial cresce cerca de 1 bilhão de habitantes a cada 12 ou 13 anos (e o consumo cresce ainda mais rápido), o mundo caminha para uma situação inusitada e dramática de agravamento do efeito estufa.
A desaceleração industrial e a recessão mundial do primeiro semestre de 2020, devido à pandemia COVID-19, não reduziu significativamente os níveis recordes de gases de Efeito Estufa durante o ano de 2020, segundo a Organização Meteorológica Mundial (OMM). Em coletiva de imprensa realizada, os meteorologistas explicaram que houve um surto de crescimento de emissões de dióxido de carbono (CO2) em 2019 e que a concentração continuou aumentando em 2020. Segundo a OMM, as quarentenas impostas pelos governos para frear a transmissão do SARS-CoV-2 ajudaram a reduzir as emissões de muitos poluentes e gases de Efeito Estufa, como o dióxido de carbono. Todavia, o impacto nas concentrações de CO2 na atmosfera (que é o acúmulo das emissões passadas e atuais) não foi significativamente percebido – na verdade houve um aumento dentro das flutuações normais do ciclo de carbono.
Normalmente, a concentração de CO2 aumenta de setembro a maio e tem uma queda entre maio e setembro de cada ano, como mostra o gráfico abaixo da NOAA. Entre outubro de 2019 e outubro de 2020 o aumento da concentração foi de 2,76 ppm, mesmo com as quarentenas e a redução das atividades econômicas globais.
O desafio da contemporalidade é reduzir as emissões de GEE e reduzir, o mais rápido possível, a concentração de CO2 na atmosfera de 417 ppm em maio de 2020 para menos de 350 ppm, o que é o nível minimamente seguro para evitar o descontrole do aquecimento global.
Não existem mais dúvidas que o aquecimento global é provocado pela emissão de gases de efeito estufa decorrentes das atividades antrópicas.
Os últimos 7 anos (2014-20) foram os mais quentes já registrados e a década 2011-20 é a mais quente desde 1880. A atmosfera do Planeta está ficando mais quente e isto tem um impacto devastador em diversos aspectos, pois vai deixar amplas áreas da Terra inapropriadas para a vida humana e não humana. Ainda não temos os dados definitivos de 2020, mas o ano passado de igualar a temperatura de 2016, sendo que novembro de 2020 bateu todos os recordes da série, conforme mostra o gráfico abaixo.
Sob o Acordo de Paris adotado em 2015, praticamente todas as nações do mundo se comprometeram a limitar o aquecimento global a um patamar “bem abaixo” de 2º C em relação aos níveis pré-industriais e também, se possível, “buscar” esforços para limitar o aquecimento a 1,5C. Contudo, no momento, o mundo não está nem perto do caminho certo para atingir essas metas.
Segundo análise do Carbon Brief, baseado na última geração de modelos climáticos – conhecidos como “CMIP6” (consulte o explicador do Carbon Brief), que estão sendo executados na preparação para o sexto relatório de avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), previsto para 2021-22, os cenários são os seguintes:
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O mundo provavelmente excederá 1,5º C entre 2026 e 2042 em cenários onde as emissões não são reduzidas rapidamente, com uma estimativa central em 2031;
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O limite 2º C provavelmente será excedido entre 2034 e 2052 no cenário de emissões mais altas, com um ano mediano de 2043;
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Em um cenário de mitigação modesta – onde as emissões permanecem próximas aos níveis atuais – o limite 2º C seria excedido entre 2038 e 2072, com uma mediana em 2052.
A crise climática significa clima instável e com variações extremas. Mais furacões, mais secas, mais inundações, mais incêndios e queimadas, mais mortes relacionadas ao calor, etc. Desta forma, haverá mais doenças infecciosas à medida que os insetos se deslocarem para o norte. O Ártico poderá ficar sem gelo no verão e a passagem do Norte poderá ficar aberta a maior parte do ano, agravando a situação do ecossistema. O nível do mar aumentará alguns metros à medida que as prateleiras de gelo dos polos derretem, produzindo maiores tempestades e inundações mais intensas em áreas baixas ao redor do mundo. Milhões de pessoas serão forçadas a mudar de área ou país. A agricultura terá perda de produtividade e a insegurança alimentar deve aumentar.
Como disse Greta Thunberg, mais um ano se passou e nada de significativo foi feito para deter a emergência climática. A governança global não tem apresentado soluções efetivas e a inação só sinaliza para um futuro mais quente e uma Terra cada vez mais inóspita e inabitável.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. A vida na Terra tem duas ameaças vitais: mudanças climáticas e ecocídio, Ecodebate, 19/06/2019 https://www.ecodebate.com.br/2019/06/19/a-vida-na-terra-tem-duas-ameacas-vitais-mudancas-climaticas-e-ecocidio-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. Decrescimento demoeconômico com prosperidade e regeneração ecológica, Ecodebate, 14/08/2020 https://www.ecodebate.com.br/2020/08/14/decrescimento-demoeconomico-com-prosperidade-e-regeneracao-ecologica/
ALVES, JED. O ‘Green New Deal’: a luta contra a degradação ambiental e o aquecimento global, Ecodebate, 25/02/2019
ALVES, JED. Antropoceno é um conceito mais correto do que Capitaloceno, Ecodebate, 18/09/2020 https://www.ecodebate.com.br/2020/09/18/antropoceno-e-um-conceito-mais-correto-do-que-capitaloceno/
UNDRR. The human cost of disasters: an overview of the last 20 years (2000-2019), United Nations Office for Disaster Risk Reduction, 13/10/2020
https://www.undrr.org/publication/human-cost-disasters-overview-last-20-years-2000-2019
Jorgen Randers & Ulrich Goluke. An earth system model shows self-sustained melting of permafrost even if all man-made GHG emissions stop in 2020, Scientific Reports volume 10, Article number: 18456, 12/11/2020 https://www.nature.com/articles/s41598-020-75481-z
TEMPERATURE 4 December 2020 18:06
Analysis: When might the world exceed 1.5C and 2C of global warming?, Carbon Brief, 04/12/20
Série Taliba de Meio Ambiente | EP 02 | Luiz Marques, José Eustáquio Alves e Cristina Serra
https://www.youtube.com/watch?v=QQHTDs2tBCQ
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 06/01/2021
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