Defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil não são adequadamente protegidos pelo Estado
Defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil não são adequadamente protegidos pelo Estado
Em risco, defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil não são adequadamente protegidos pelo Estado, aponta Dossiê
Publicação de articulação de organizações sociais e movimentos populares destaca papel do Estado em incitar violência contra defensores dos direitos das mulheres, da população negra, LGBTQI, dos povos tradicionais e do meio ambiente
Conselho Indigenista Missionário – Cimi
Indivíduos, comunidades ou coletivos que defendem direitos humanos no Brasil e atuam a fim de cessar as violações de direitos não estão protegidos adequadamente pelo Estado brasileiro. Esta é uma das denúncias presentes no Dossiê do Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos (CBDDH) lançado no próximo dia 08 (terça-feira), às 18h. O material se debruça sobre os anos de 2018 ao primeiro semestre de 2020.
Nesta terceira edição a articulação composta por 42 organizações, movimentos populares e associações de atuação nacional traz uma sistematização das violações de direitos de quem defende direitos humanos, como reflete também sobre as causas estruturais que resultam numa violência ainda mais intensa contra defensoras mulheres, população negra, LGBTQI, povos tradicionais. O aumento da violência contra ativistas ambientais também recebe atenção.
Fruto de reivindicação popular, o Programa Nacional de Proteção às Defensoras e Defensores de Direitos Humanos no Brasil (PNPDDH) instituído em 2004 e efetivado após assassinato da missionária Dorothy Stang, em 2005, sofre de descontinuidades de execução e sua ampliação é pouco significativa, aponta o Dossiê. Atualmente encontra-se vigente apenas em Minas Gerais, Pernambuco, Ceará, Maranhão, Pará, Rio de Janeiro e Equipe Federal, que atende os outros 20 estados e o Distrito Federal. De acordo com o Comitê, o salto orçamentário de 2018 não resultou em implantação efetiva do Programa em mais estados ou melhoria na efetividade da proteção de pessoas e grupos que estão ameaçados.
A descontinuidade do Programa e os impactos na proteção de defensores e defensoras também são apontados como grandes fragilidades. Desde que foi implantada em 2004, a política de proteção vem passando por várias descontinuidades em relação à sua execução nos Estados Federados. Inicialmente implantada nos estados do Pará, Espírito Santo e Pernambuco, nos anos subsequentes foi ampliada para os estados do Rio de Janeiro, Bahia, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Ceará e Maranhão. No entanto, por longos períodos, a política deixou de ser executada no Rio de Janeiro, Bahia, Pará, Espírito Santo e Rio Grande de Sul. A partir de julho de 2018, Rio de Janeiro, Pará e Bahia voltaram a executar a política em âmbito estadual. Os estados do Espírito Santo e Rio Grande do Sul não retomaram até o momento.
Outro fator relevante é que a permanente incitação à violência pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e sua base contra específicos segmentos da população – mulheres, profissionais de imprensa, indígenas, quilombolas e outros – gera um ambiente de legitimação de atos de violência pela população contra estes grupos, e de insegurança dos defensores na inserção em um Programa de proteção executado por um governo que se posiciona contrário à afirmação de direitos destas populações.
“Hoje, temos à frente do poder executivo um governo declaradamente contrário à luta por direitos, um presidente que quando eleito prometeu “acabar com toda forma de ativismo”, que ofende publicamente os povos indígenas e quilombolas, e se declara inimigo das organizações da sociedade civil.”, destaca a assessora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), organização integrante do Comitê, Milena Argenta.
Uma das organizadoras da publicação, Milena ainda destaca a violência contra mulheres defensoras apresenta especificidades. Além dos riscos decorrentes da denúncia sobre a atuação de agentes violadores – empresas, grileiros, latifundiários, o próprio Estado, milícias – as violências mais frequentes contra defensoras são de ordem sexual, de invisibilização e deslegitimação da ação no espaço público e contra sua família.
“As mulheres defensoras, em especial, sofrem um processo de difamação ainda pior, já que subvertem a ordem patriarcal que restringe a sua existência ao espaço doméstico e ao trabalho reprodutivo e de cuidados, seja o de sua própria família ou o das famílias da elite branca, que se sustenta até hoje na exploração do trabalho doméstico de mulheres negras”, destaca.
O material também busca visibilizar as violações de direitos e valorizar a atuação de quem defende direitos humanos no país.”A visibilidade dessas violências tem sido uma ação muito importante, pois visam enfrentar a estigmatização que sofrem as pessoas que lutam por seus direitos e que muitas vezes são acusadas de bandidas ou cometendo alguma ação fora da lei só por estarem defendendo seus direitos. Romper os muros da desinformação é uma importante arma para que as violências vividas sejam conhecidas.”, destaca o pesquisador da Justiça Global e também organizador do Dossiê, Antônio Neto.
Realidades presentes para defensoras e defensores e dos direitos humanos no Brasil
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Os problemas estruturais são os grandes responsáveis pela violência sofrida por defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil, tais como a não demarcação de terras indígenas e de territórios quilombolas, a não realização da reforma agrária e urbana, os grandes empreendimentos, mercantilização da terra e da floresta, racismo, machismo e a LGBTQfobbia;
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Com recordes de queimadas e desmatamento nos anos de 2019 e 2020 (Crescimento desmatamento de 9,5% em relação a 2019 – Inpe), povos que residem nestes biomas e defensores ambientais são obstáculos ao modelo de exploração;
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De janeiro de 2019 a agosto de 2020, foram feitas ao menos 449 declarações e agressões contra jornalistas e comunicadores(as) pelo presidente da República, seus ministros ou familiares que exercem mandatos, (Dados Artigo 19);
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Somente nos primeiros oito meses de 2020 os assassinatos de pessoas trans aumentaram 70% se comparados ao mesmo período do ano anterior, totalizando 129 assassinatos. Entre esse grupo, parte significativa foi de pessoas de referência na luta LGBTQI (Dados Antra);
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Na pandemia, as maiores vítimas da Covid-19 concentram-se na população negra (42,4%). Houve aumento em todos os estados de feminicídio. Indígenas e quilombolas também sofrem com a ausência de ações integradas pelo Estado;
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Segundo dados da campanha Despejo Zero, entre 1º de março e 31 de agosto de 2020, mais de 6 mil famílias brasileiras foram despejadas;
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A população em situação de rua totaliza 220 mil pessoas, em março de 2020, um crescimento de 140% em relação a 2012 (Dados IPEA);
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A taxa de homicídios entre jovens negros é quase quatro vezes maior do que a verificada entre os brancos. Nesse contexto, mães de filhos assassinados e comunicadores populares são defensores em alto risco;
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Defensoras e defensores dos territórios tradicionais são alvos da ação de empreendimentos e da grilagem. Um exemplo é o número de 108 processos que visam à exploração minerária em terras indígenas amazônidas (Dados Agência Pública);
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Mulheres defensoras são mais suscetiveis a sofrerem violência sexual, agressão física na esfera privada, violência contra familiares, exposição online e silenciamento público
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O total de conflitos em 2019 foi 23% maior que em 2018. Conflitos relacionados à disputa por terra aumentaram 11,5% e pela água em 77%, (Dados CPT).
Fonte: Conselho Indigenista Missionário – Cimi
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 10/12/2020
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