O Butão conseguiu vencer a covid-19
Por José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] O Ministério da Saúde informou que Brasil atingiu 1.668.589 pessoas infectadas pelo SARS-CoV-2 e 66.741 mortes até o dia 07 de julho de 2020. Somente em 24 horas foram 45.305 casos e 1.254 óbitos. A pandemia se espalha por todo o país e atualmente Brasília (DF), com 63 mil casos e 2,3 mil vidas perdidas têm o maior coeficiente de incidência do país com 21 mil casos por milhão de habitantes. Tem um coeficiente de mortalidade de 254 mortes por milhão. A pandemia já chegou até ao Palácio da Alvorada.
Enquanto isto, do outro lado do mundo, o Butão é um exemplo de país que conseguiu vencer a pandemia do novo coronavírus com um mínimo de impacto. Até o dia 07 de julho de 2020 o pequeno país asiático tinha apenas 80 pessoas infectadas (104 casos por milhão) e nenhuma morte. Por conseguinte, o coeficiente de mortalidade é zero. E estes números são ainda mais significativos se consideramos que a pandemia afetou bastante os seus vizinhos.
O Butão conseguiu se proteger a despeito do grande impacto da pandemia em seus vizinhos. A Índia tem cerca de 740 mil infectados e mais de 20 mil mortes. A China tem cerca de 84 mil casos e quase 5 mil mortes. Bangladesh tem quase 170 mil casos e mais de 2.000 mortes. E o Nepal 16 mil casos e 35 mortes.
O Butão tem uma área de 38.394 km2, uma população de 772 mil habitantes e uma densidade demográfica de 20 hab/ km2. Está localizado nos Himalaias, faz fronteira com a China ao norte e com a Índia ao sul, leste e oeste, mas também está próximo do Nepal e de Bangladesh. A pirâmide populacional do Butão mostra que o país tem uma baixa proporção de idosos na população e que vem experimentando uma grande queda nas taxas de fecundidade nos últimos 25 anos.
Alguém poderia dizer que o sucesso do Butão é devido ao seu pequeno tamanho e pequena população. Mas isto seria uma explicação simplista. Por exemplo, Luxemburgo que é um pequeno país europeu rico e com uma população de 626 mil habitantes teve 4,6 mil casos e 110 mortes. Niterói – que tem 514 mil habitantes – é uma das cidades fluminenses que melhor conseguiu conter a pandemia, mesmo assim teve 6,7 mil casos e 232 mortes (06/07).
Na verdade, o Poder Público butanês tomou medidas rápidas, eficientes e baseadas na ciência e não buscou remediar, mas sim prevenir e isto foi reforçado pelos valores comunitários da sociedade civil butanesa.
Existia um alto risco de uma tragédia, pois o Butão está cercado de países com alto número de casos da covid-19 e o país tem escassez de médicos e equipamentos de saúde. A Organização Mundial da Saúde (OMS) forneceu uma rodada inicial de kits de testes, mas ainda restam escassez e falta de ventiladores e equipamentos de proteção individual (EPI). E, embora o país seja escassamente povoado, cerca de um quinto vive em suas três áreas urbanas mais populosas, incluindo a capital Thimphu.
Contra todos os prognósticos, a nação budista está emergindo como um caso de sucesso para lidar com o surto pandêmico com uma sinergia muito grande entre o rei, o governo e os cidadãos do país. Como mostraram Sonam Ongmo and Tej Parikh (08/05/2020), o primeiro caso no Butão foi relatado em 6 de março, quando um turista norte-americano de 76 anos deu positivo. Ele recebeu considerável atenção e cuidado com uma grande preocupação do público – e até uma visita pessoal do rei. Seu parceiro, também norte-americano, teve um resultado positivo, e ambos permaneceram sob cuidados com testes frequentes até se recuperarem.
Apesar de depender fortemente da ajuda externa, a provisão de assistência universal à saúde gratuita do Butão – um pilar essencial da filosofia da Felicidade Nacional Bruta (GNH na sigla em inglês) do país – provou ser sua primeira linha de defesa para o seu “paciente zero”, juntamente com seu compromisso com testes regulares para quem é sintomático ou entrou em contato com casos confirmados.
A rápida mobilização subsequente do país foi fortemente orientada pela ciência, com o Primeiro-Ministro Lotay Tshering e o Ministro da Saúde Dechen Wangmo, ambos funcionários da saúde pública antes de entrar na política. Um plano nacional de preparação e resposta e um comitê de emergência já haviam sido montados no final de fevereiro. Enquanto isso, atualizações diárias, boletins e entrevistas à imprensa foram feitas para manter os cidadãos informados sobre o status das infecções.
Após seus dois primeiros casos, o Butão imediatamente começou a rastrear e testar qualquer pessoa que tivesse entrado em contato com os turistas. Quarentenas de 14 dias foram inicialmente implementadas para quem entra no país em 120 instalações que foram rapidamente configuradas; o período de quarentena foi posteriormente prorrogado por uma semana para tranquilizar o público. Bloqueios em larga escala implementados em outros lugares foram evitados. As escolas foram fechadas em Thimphu, os turistas foram impedidos de entrar no país e as normas de distanciamento social foram incentivadas.
Enquanto isso, o forte senso de comunidade do Reino Budista surgiu. Hotéis particulares ofereceram suas instalações gratuitamente, empresas ofereceram contribuições em dinheiro, agricultores e cooperativas agrícolas ofereceram produtos agrícolas e restaurantes forneceram comida gratuitamente. Colaborando com o governo, os locais ajudaram a estabelecer as zonas de quarentena nas aldeias, com cabanas de isolamento improvisadas, construídas em bambu.
Os gráficos abaixo mostram como o Butão está avançando na transição demográfica. O ritmo de crescimento populacional está diminuindo e na segunda metade do atual século o país terá um decrescimento populacional.
Ou seja, o Butão conseguiu montar uma eficiente barreira sanitária para evitar a invasão do vírus em seu território e, nos casos das pessoas infectadas, foi montado um sistema de rastreamento e monitoramento que evitou a propagação comunitária do Sars-CoV-2. São soluções simples, mas que só podem ser realmente implementadas em países que tiveram uma sinergia entre o Poder Público e a sociedade civil, com respeito pela ciência e pelas orientações epidemiológicas.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referência:
Sonam Ongmo and Tej Parikh. What Explains Bhutan’s Success Battling COVID-19? The Diplomat, 08/05/2020
https://thediplomat.com/2020/05/what-explains-bhutans-success-battling-covid-19/
Nota da redação: sobre o tema “Covid-19 no Mundo” sugerimos que leia, também:
A Pandemia De Covid-19 Vai Acelerar A Passagem Do Centro Do Mundo Para A Ásia
Sucesso E Fracasso No Combate À Covid-19: Brasil, República Dominica, Cuba E Jamaica
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 08/07/2020
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