Testemunho de Laura Lupi, enfermeira italiana na linha de frente contra a Covid-19
ONU News
A Organização Mundial da Saúde, OMS, conversou com uma das enfermeiras que combate a pandemia do novo coronavírus em Itália, onde mais de 16 mil pessoas já perderam a vida; Laura Lupi, de 24 anos, trabalha num hospital de Teramo, na região de Abruzo; leia o testemunho na íntegra.
A maneira como colocamos nossos equipamentos de proteção no início de cada turno determina o nosso destino.
Os primeiros 20 minutos de uso do equipamento de proteção são cruciais para evitar a infecção. Eu já trabalhei com doenças infecciosas antes, mas esse vírus é diferente porque simplesmente não sabemos o suficiente.
Desafios
Eu me formei em enfermagem há um ano e trabalhei em um departamento de cirurgia geral e geriatria, mas nada poderia ter me preparado para os desafios profissionais e emocionais que estou enfrentando agora.
Faço turnos de sete ou 10 horas, durante os quais não posso comer ou beber. Não podemos tirar nosso equipamento de proteção depois de colocá-lo.
Às vezes fica difícil respirar e, mesmo que abra a janela, não consigo sentir o ar fresco.
Talvez o maior desafio seja o fato de que devemos manter uma distância física de nossos pacientes, o que é agravado pelo fato de estarmos totalmente cobertos. Grande parte da conexão humana está perdida, o que é uma das coisas que me fez apaixonar por essa profissão em primeiro lugar.
Medo
Tudo que eu queria era um abraço de minha mãe, mas, é claro, isso não era possível
No primeiro dia no hospital dedicado à covid-19, entrei em uma sala onde um paciente estava chorando. Quando perguntei o que havia acontecido, ele me disse que sua sogra havia morrido e ele não podia consolar sua esposa. Tudo o que pude fazer para aliviar sua dor foi colocar a mão em seu peito, mas ele não podia nem ver meu rosto.
Esse primeiro dia foi particularmente desafiador, mas consegui superar.
Quando voltei para casa, estava fisicamente e emocionalmente esgotada. Tudo que eu queria era um abraço de minha mãe, mas, é claro, isso não era possível. No começo, tive que lutar contra o instinto de desistir, mas não posso fazer isso com meus colegas de enfermagem. Eu tenho que fazer o meu trabalho, e sei que posso fazer a diferença na vida dos meus pacientes.
Mudanças
Meu trabalho mudou profundamente, mas também como passo o resto do meu dia. Moro com meus pais e irmão, mas não passo tempo com eles desde que comecei nesta posição. Não posso arriscar infectá-los. Não podemos sentar na mesma mesa para jantar.
No passado, gostava de pensar em minha jornada de trabalho, sabendo que momentos desafiadores poderiam ser oportunidades de crescimento. Agora vivo com o terror constante de infectar outras pessoas e prefiro evitar pensar em trabalho depois de um turno. Em vez disso, tento me distrair, para evitar pensar em ter sido infectado ou infectar meus entes queridos.
Esperança
Sempre soubemos que nosso trabalho, como enfermeiros, traz algum risco. A diferença agora é que os outros também o sabem. Sinto-me recompensada pela expressão de solidariedade de todos. É gratificante ler que as pessoas reconhecem nosso papel. Elas realmente nos veem e nosso trabalho agora.
No futuro, espero ver os pacientes se recuperarem e deixarem o hospital. Eu sei que podemos vencer esse vírus. Podemos lutar juntos. Quero ouvir os pacientes que recebem alta dizerem “sobrevivi à covid-19”.
É isso que me motiva e me faz continuar. Faremos tudo o que é humanamente possível para superar essa situação juntos e teremos sucesso. Precisamos ter sucesso. Nunca subestime enfermeiras.
A única coisa que estamos pedindo é que fique em casa por nós. Nós continuaremos no trabalho por você.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 13/04/2020
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