A sustentabilidade segundo Lester Brown, Parte 1 / 2, artigo de Roberto Naime
A sustentabilidade segundo Lester Brown, Parte 1 / 2, artigo de Roberto Naime
[EcoDebate] Para Lester Brown, um dos mais importantes pensadores ambientais do mundo, a injeção de recursos dos governos norte-americano e europeus não será suficiente para tornar mais sustentável a combalida economia internacional. O momento urgente sugere um plano B.
A transição para a sustentabilidade passa, segundo ele, por taxar atividades baseadas na queima de combustíveis fósseis, incentivar o desenvolvimento e uso de energias renováveis criando novos empregos. Em seu livro, “Plan B 3.0: mobilizing to save civilization” (Plano B 3.0: mobilização para salvar a civilização, ainda sem tradução para o português), Brown mostra que evitar o declínio da economia significa impedir o colapso da civilização.
Afirma Lester Brown “as corporações precisam reconhecer que seu futuro é inseparável do futuro da civilização e que elas também são responsáveis pela manutenção da vida na Terra. Devem, portanto, contribuir com a construção de uma economia global sustentável. Sem isso, vamos enfrentar um colapso. Nenhuma companhia terá lucro avançando na escalada rumo à destruição. Precisamos rever rapidamente a economia global e particularmente a matriz energética por meio de políticas econômicas que reestruturem taxas e pressionem o mercado a contar a verdade ambiental”, ressalta o especialista.
A “verdade ambiental” a que se refere Brown diz respeito à inabilidade do mercado em incorporar impactos indiretos, também conhecidos em economia como externalidades, que são causados ao meio ambiente e à sociedade pelas atividades econômicas. A inversão dessa lógica, que seria favorecer as tecnologias e práticas mais limpas em detrimento das baseadas na queima de combustíveis fósseis, representa uma oportunidade para criar novos postos de trabalho.
Apresentar a visão de um futuro sustentável e também os meios práticos para construí-la tem sido a missão de Brown ao longo de 40 anos dedicados à militância ambiental. Em 1974, ele fundou o “Worldwatch Institute”, uma organização sem fins lucrativos especializada na análise das questões ambientais globais. Em 1984, lançou a série de relatórios “O Estado do Mundo”. Traduzido para as principais línguas, os documentos alcançaram status semioficial, tornando-se uma espécie de “Bíblia” do movimento ambiental. Em 2001, Brown criou a “Earth Policy Institute”, do qual ainda hoje é presidente. A organização passou a disseminar informações na área ambiental utilizando, como suporte, uma rede mundial de editores, principalmente na Internet.
Apesar de entusiasta do termo desenvolvimento sustentável, Brown acredita que ele não seja muito empolgante. Em sua opinião, a associação de aspectos sociais e políticos à discussão, inicialmente apenas ecológica e esvaziou o sentido do conceito. “Ao se tornar tão ampla, a sustentabilidade passou a significar pouco. O termo não mobiliza as pessoas”, ressalta Brown.
Perguntado sobre como avalia a evolução do conceito da sustentabilidade, se manifestou, “o conceito de desenvolvimento sustentável evoluiu nos últimos 35 anos. A princípio, falávamos apenas de sustentabilidade ecológica, mas o termo tem sofrido mutações para incluir a sustentabilidade social e política. Em alguns pontos, isso é tão amplo que não chega a significar muito.
Embora intelectualmente útil, o termo sustentabilidade parece não empolgar e mobilizar as pessoas.
isso, no “Earth Policy Institute”, começamos a falar sobre salvar a civilização em vez de desenvolvimento sustentável porque é disso que realmente se trata. Assim, a discussão adquire um senso de urgência muito maior quanto ao que está em jogo.
Provocado a opinar de que maneira a crise econômica, ambiental e social que vivemos atualmente está relacionada com a teoria econômica de base mecanicista, argumentou que “o modelo mental por trás da crise financeira é o mesmo que criou a crise ambiental e a insustentabilidade da economia em termos ambientais.
Esse modelo valoriza o presente em vez de se expandir para o futuro. Isso nos leva não apenas a déficits econômicos e a parte central dessa crise que são os déficits ecológicos, que são parte central da crise ambiental hoje vivida. Mudança climática, desmatamento, erosão do solo, colapso de algumas indústrias de pesca ou a queda de aquíferos dizem respeito, de um jeito ou de outro, a déficits ecológicos. Em suas origens, a crise econômica mundial está muito ligada à crise ambiental que estamos experimentando já há algum tempo.
Indagado sobre quais deveriam ser a base de novos modelos econômicos e mentais capazes de nos conduzir para uma sociedade sustentável asseverou “na verdade, o único modelo que pode salvar a civilização é aquele que satisfaz as necessidades atuais sem prejudicar a capacidade das futuras gerações atenderem as suas próprias. Se continuarmos, por exemplo, a queimar combustíveis fósseis em larga escala, aumentando a temperatura da atmosfera, as camadas de gelo da Groenlândia e da Antártida derreterão. Com isso, veremos um aumento enorme no nível do mar e, por consequência, um enorme caos. Em uma região como a Ásia, por exemplo, o derretimento dos glaciais nas montanhas do Himalaia, ao norte da Índia, ou do planalto do Tibete, alimentará os rios da região fora dos períodos das monções. Se essas camadas de gelo derreterem completamente com o aumento da temperatura, os rios desaparecerão na época de seca, prejudicando fazendeiros que dependem desses cursos d’água para irrigação. Isso não é apenas importante para países como a Índia e China, mas para todo o mundo, na medida em que poderemos viver a escassez de alimento em uma escala inimaginável.
Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Aposentado do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.
Referência:
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 08/10/2019
[cite]
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