‘Impeachment de Jair Bolsonaro pelo crime de Ecocídio’, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“Impeachment de Jair Bolsonaro pelo crime de Ecocídio”
“Ah! um povo que iniciasse a destruição dos marcos e deixasse intactas as florestas!“
Henry Thoreau (1817-1862)
“O Ecocídio é um crime contra a humanidade e a vida na Terra”
Tribunal Penal Internacional
[EcoDebate] No mês passado participei de uma manifestação no Largo do Machado, no bairro Flamengo, no Rio de Janeiro (local tradicional de reunião e reivindicação), no âmbito das atividades preparatórias da Greve Global pelo Clima.
Uma proposta me chamou a atenção. Em decorrência do posicionamento do Governo Federal do Brasil de atuar contra o meio ambiente e os povos das florestas, diante da generalização da degradação dos ecossistemas, do avanço do desmatamento e do aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEE) que provocam danos ambientais irreparáveis, foi lançada para discussão a campanha: “Impeachment de Jair Bolsonaro pelo crime de Ecocídio”.
Achei que a proposta fazia todo o sentido, mas confesso que fiquei na dúvida sobre as bases jurídicas de um impeachment pelo crime de ecocídio. Mas, na discussão, foi apresentado o argumento de que o Tribunal Penal Internacional (TPI) decidiu, no final de 2016, reconhecer o ecocídio (destruição em larga escala do meio ambiente) como crime contra a Humanidade. Advogados e especialistas em Direito Penal Internacional consideram o Ecocídio um delito de escopo local e global que justifica criminalizar as agressões contra o meio ambiente.
Por exemplo, os juristas franceses, Jessica Finelle e François Zimeray, chamavam atenção para a gravidade dos “projetos antiecológicos” de Bolsonaro e para os riscos que trazem para o Brasil e o mundo. Eles consideram que o presidente brasileiro pode ser responsabilizado por crime ecológico e por crime contra a humanidade.
O Art. 225 da Constituição Federal diz: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Inquestionavelmente, é dever dos governantes respeitar a Constituição defendendo a sustentabilidade da natureza.
A principal ameaça à humanidade e à vida na Terra é o aquecimento global que pode tornar as o Planeta inabitável. Por isto o Acordo de Paris, assinado por cerca de 200 países propõe a redução das emissões de GEE. Em 2016, o presidente Michel Temer entregou ao secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Ban Ki-moon, o documento em que o Brasil ratifica o Acordo de Paris, que trata de mudanças climáticas.
Portanto, o Brasil é signatário do Acordo de Paris e assumiu o compromisso de reduzir as emissões de GEE conforme as metas mencionadas na Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC). As metas principais são: 1) Redução de 37% nas emissões até 2025, tendo como ponto de partida as emissões de 2005; 2) Possível redução de 43% das emissões até 2030.
Para alcançar essas metas o governo precisa seguir uma série de indicações em diversos setores da gestão pública dos recursos naturais até 2030:
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Aumentar a participação da bioenergia sustentável na matriz energética para 18%;
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Fortalecer o cumprimento do Código Florestal;
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Restaurar 12 milhões de hectares de florestas;
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Alcançar desmatamento ilegal zero na Amazônia brasileira;
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Chegar a participação de 45% de energias renováveis na matriz energética;
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Obter 10% de ganhos de eficiência no setor elétrico;
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Promover o uso de tecnologias limpas no setor industrial;
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Estimular medidas de eficiência e infraestrutura no transporte público e áreas urbanas.
Mas as emissões brasileiras de GEE continuam subindo especialmente devido à redução da cobertura vegetal e às queimadas. Em agosto, houve até “Dia do Fogo”, no desafio mais surreal promovido pelos inimigos da floresta. Segundo dados do Deter, o desmatamento em julho, foi 278% maior do que o observado em julho de 2018. De acordo com o sistema gerenciado pelo Inpe, a devastação de florestas neste período corresponde a cerca de 2.000 quilômetros quadrados, área maior do que o município de São Paulo. O desmatamento já tinha crescido 88% no mês de junho, na comparação com o mesmo mês de 2018.
Todavia, ao invés de tomar medidas para reduzir o desmatamento, o governo questionou os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e exonerou o Diretor Ricardo Galvão. O ministro da Ciência e Tecnologia Marcos Pontes anunciou o novo presidente interino do INPE: Darcton Policarpo Damião, que declarou desconfiar da real existência do aquecimento global e questiona se, caso exista, seja realmente causado pelo ser humano. Damião destacou que todos os informes e dados sobre desmatamento da Amazônia serão encaminhados ao Palácio do Planalto e aos ministérios do Meio Ambiente e da Ciência e Tecnologia, em primeira mão.
O quadro é grave. Na avaliação de integrantes do Greenpeace, do SOS Mata Atlântica e do Observatório do Clima, há um desmonte nas políticas públicas que pode ter como impacto desde tragédias urbanas a dificuldades no comércio exterior. Como diz o Jornal El País (29/07/2019):
“Bolsonaro colocou a líder da bancada parlamentar ruralista, Tereza Cristina Dias, como ministra da Agricultura, não declarou novas áreas de proteção ambiental nem demarcou novas reservas de terras indígenas (e ameaça desmantelar umas e outras), pretende desvirtuar o Fundo Amazônia (um fundo milionário impulsionado e financiado principalmente pela Noruega para frear o desmatamento), pôs em dúvida os dados oficiais sobre a destruição de florestas tropicais, elaborados por órgãos do próprio Governo por meio do Inpe, e acelerou a aprovação de novos pesticidas, incluindo alguns com substâncias proibidas na União Europeia. Uma série de medidas que fez com que os ex-ministros do Meio Ambiente ainda vivos acusassem em uníssono o Governo de desmontar todos os avanços conquistados nos últimos 25 anos”.
Portanto, o presidente Jair Bolsonaro se tornou uma ameaça para o meio ambiente do Brasil e do mundo.
Assim, durante a manifestação, foi explicado que o aumento do desmatamento e das queimadas no Brasil pode ser considerado um crime, nacional e internacional, contra a natureza e a humanidade. O lema deveria ser: meio ambiente acima de tudo e a estabilidade climática acima de todos. Desta forma, comecei a ler sobre o assunto e percebi que a discussão já estava avançada na mídia.
O não cumprimento das metas do Acordo de Paris – por motivos torpes – e o descumprimento da Constituição são considerados motivos suficientes para o impeachment do presidente brasileiro. Como disse Janio de Freitas (FSP, 25/08/2019):
“Duas obviedades de dimensão amazônica em Jair Bolsonaro e seu governo. Uma, o descumprimento de obrigações determinadas pela Constituição, para o meio ambiente e outros fins; outra, o desrespeito a tratados internacionais. Daí resultante, a permissividade concedida à exploração ilegal da Amazônia, cerceada até a aferição científica do dano territorial, tem relação íntima com crime de responsabilidade. Ou lesa-pátria”.
De fato, como disse o Dalai Lama: “A natureza sustenta a vida universal de todos os seres”. Sem natureza não há como manter a humanidade. A ECOlogia precisa estar acima de tudo, especialmente acima do desenvolvimento e da ECOnomia. A destruição da Amazônia está atingindo um ponto de não retorno e vai impactar o meio ambiente do Brasil e do Mundo. É preciso salvar a Amazônia e não deixar acontecer o que aconteceu com a Mata Atlântica. Destruir as florestas é destruir o futuro. O ecocídio é também um suicídio. Portanto, evitar o colapso ambiental requer ações imediatas.
Auspiciosamente, começa a tomar corpo no Brasil o movimento “Rebelião da Extinção”, que inspirado nas ideias de Henry Thoreau, utiliza a resistência pacífica (não-violenta) e a desobediência civil para engajar as pessoas na luta contra o colapso climático e ambiental, evitando o holocausto ecológico e o risco de extinção da raça humana e demais espécies. O objetivo da “Rebelião da Extinção” é exercer pressão sobre os governantes e fortalecer a sociedade civil no sentido de enfrentar o caos climático e a degradação dos ecossistemas.
Evitar a ampliação do desmatamento e o espraiamento das queimadas é uma emergência ecológica que a sociedade brasileira precisa resolver rapidamente. Inclusive, o Brasil pode perder o título de “potência agrícola” e pode ter suas commodities agropecuárias boicotadas em todo o mundo (até o agronegócio pode sair perdendo). Não só a biodiversidade, mas a segurança alimentar está em jogo.
Segundo o site DW, diante do avanço do desmatamento e das queimadas na Amazônia, um grupo de juristas brasileiros prepara desde 23 de agosto uma denúncia contra o presidente Jair Bolsonaro por crime ambiental contra a humanidade, a ser apresentada ao Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, na Holanda. Os juristas argumentam que Bolsonaro pode ser responsabilizado pelo aumento dos danos na Amazônia em 2019 devido à demora da resposta contra as queimadas na região e à atual política ambiental do governo. A ação está sendo articulada por especialistas em direitos humanos, direito ambiental e internacional. “Estudamos o caso e vemos que os danos ocorridos neste ano na Amazônia podem ser vistos como consequência de declarações irresponsáveis de Bolsonaro, assim como do desmonte de órgãos ambientais e das políticas de Estado de proteção a direitos socioambientais”, afirma a jurista Eloísa Machado, que iniciou a articulação da denúncia”.
Desta forma, a luta contra a degradação ambiental, contra a destruição das florestas e contra a aceleração das mudanças climáticas ocupará o centro das bandeiras das jornadas da Greve Global pelo Clima que acontecerá em todo o mundo entre 20 e 27 de setembro de 2017.
No Brasil, além das bandeiras gerais, provavelmente, a bandeira do “Impeachment de Jair Bolsonaro pelo crime de Ecocídio” será uma das propostas debatidas pelos participantes e que pode ser uma luz para este período de “fumaças” que o país vive e que precisa, urgentemente, superar. Trata-se de uma proposta a ser discutida de maneira democrática e visando o bem geral do Brasil, pois o mais importante é salvar a natureza que é a base da vida.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
Rebelião de Extinção – Rebeldes pela Vida https://rebeldespelavida.climaximo.pt/
Global Week For Future 20-27 sept https://fridaysforfuture.org/
Global Climate Strike: https://globalclimatestrike.net/
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 11/09/2019
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Nesse artigo, o autor faz uma exposição clara e extremamente detalhada da problemática ambiental que atualmente atinge a Amazônia brasileira, e apresenta, com grande riqueza de detalhes, as medidas que estão sendo adotadas para conter os desmandos governamentais que permitem a destruição de tão importante ecossistema, e que são conceituados como crimes contra a humanidade.
Parabenizo o Doutor José Eustáquio Diniz Alves.
Ótimo artigo, Doutor José Eustáquio Diniz Alves.
A denúncia no Tribunal de Haia talvez faça efeito, especialmente considerando que o julgamento provavelmente só virá depois do final do governo. Mas impeachment com base em legislação internacional, acho extremamente improvável, e até impróprio. Existem crimes de responsabilidade que Jair Bolsonaro já cometeu , é melhor para o país inclusive que o impeachment seja pedido com base na legislação brasileira.