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Artigo

Consórcios de recursos hídricos, rumo a governança na gestão, parte 2/2 (Final), artigo de Roberto Naime

 

escassez de água

 

[EcoDebate] MATOS (2013) assinala sobre a caracterização dos consórcios pesquisados, que possuem grande disparidade em relação ao tamanho da bacia hidrográfica.

Questionados sobre quais seriam os fatores que dificultam a consolidação dos consórcios, os responsáveis do consórcio assinalam que a articulação entre os municípios foi o fator que obteve o maior número de indicações.

Em seguida vêm as dificuldades estruturais, como a captação de recursos e apoio técnico, com 19% das indicações, dificuldades internas de planejamento de organização com 15% e dificuldades de implementação de projetos com 11%. As dificuldades de articulação com o governo estadual e com as empresas e sociedade civil, receberam 7% cada, enquanto outras dificuldades receberam 11%.

Outros fatores citados foram a falta de equipe própria, tanto administrativa, quanto técnica, e falta de “continuidade de governança”, ou seja, falta de continuidade dos dirigentes políticos nos cargos e a ausência de meritocracia na ocupação dos mesmos e a prioridade dada para as bacias hidrográficas citadas por outra entidade.

Os dados da pesquisa corroboram a explanação de BARROS (1995), que afirma que a associação das variáveis, legislação, organização, captação de recursos, apoio administrativo, apoio técnico e divulgação são as principais dificuldades estruturais e funcionais dos consórcios.

Com relação aos fatores facilitadores para a consolidação dos consórcios, os representantes públicos também apontaram a cooperação municipal no total de 27% do total, seguido por liderança unificada com 23%, atualização permanente, com 18%; facilidade de acesso a recursos, com 14% e outros, com 18%.

Os outros fatores destacados foram a “atuação forte e divulgação das ações”, e interesse comuns por parte dos membros.

Os representantes, ao serem questionados sobre o que poderia ser feito para melhorar ou apoiar a cooperação intermunicipal, apontaram várias ações.

Dos fatores indicados pelos representantes que contribuem para a cooperação intermunicipal, os que obtiveram o maior número de indicações foram a conscientização e capacitação, com 25% do total cada um.

Visando aumentar a cooperação, os representantes indicaram a necessidade de se desenvolver a conscientização dos gestores ambientais e os gestores públicos, tanto prefeitos, quanto dos funcionários públicos, para com a causa do consórcio e buscar uma participação mais efetiva, bem como fomentar a ideia de trabalhos em conjunto.

Com relação à capacitação os representantes destacam a necessidade de aumentar a capacidade técnica e elaboração de projetos das equipes do consórcios. Sendo destacada também a capacitação dos “prefeitos e funcionários públicos em gestão associada de serviços públicos”, bem como, a importância da gestão das águas na bacia.

O fator “divulgação”, ou seja, a comunicação eficaz obteve 17% das indicações dos representantes. Para os mesmos, deve haver maior divulgação das ações desenvolvidas pelos consórcios, servindo como incentivo.

A necessidade de articulação aparece logo em seguida, com 8% das indicações dos representantes dos consórcios que indicaram a necessidade de articulação entre os municípios, e também, com outras esferas de poder.

O apoio governamental também aparece com 8% das indicações. Para os representantes, é preciso mais apoio do governo, principalmente o federal. É preciso mais empenho, por parte do governo em “estimular a criação de consórcios entre os municípios e demais entes federados, ou seja, divulgar esta possibilidade de maneira ampla aos interessados”.

Aqui também ocorre identidade com as afirmações de BARROS (1995) ao afirmar que o estado possui a função primordial de estimular os consórcios mediante políticas consistentes e duradouras, bem como a função complementar de colaborar com os mesmo financeiramente.

MATOS (2013) assevera que ao abdicar dessas funções, o estado causa alterações significativas na capacidade dos consórcios definirem e programarem seus compromissos prioritários “para com políticas públicas básicas e políticas sociais, não apenas de subtrair sua eficácia virtual, mas principalmente determinando sua falência irremediável (BARROS, 1995 p. 82)”.

Os comitês e consórcios desenvolvem um novo modelo de gestão de políticas públicas a partir da ampliação de oferta de serviços, flexibilização da contratação de pessoal, cooperação técnica e a realização conjunta de obras, serviços e atividades temporárias ou permanentes.

Os consórcios surgem como uma estrutura técnica capaz de demandar mais eficientemente os recursos, bem como possibilitar a ampliação da capacidade política dos municípios.

O fato de se constituírem em unidades territoriais de gestão facilita a articulação intermunicipal, pois os municípios transferem a um órgão de governança somente uma parte de sua autonomia, permitindo a gestão de um recurso que não é exclusivo, mas compartilhado por uma comunidade mais ampla.

É indispensável que os consórcios busquem maior apoio e mobilização por parte da população e principalmente dos representantes públicos, fazendo-os compreender a importância do gerenciamento dos recursos hídricos, tendo em vista os múltiplos usos da água, um recurso imprescindível.
É necessário que se mostre aos atores sociais os tipos de decisões que eles podem tomar e quais instrumentos estão ao seu alcance para contribuir, bem como os benefícios que podem ser obtidos.

Torna-se oportuno o aprofundamento de estudos sobre as razões da pouca adesão dos municípios aos consórcios. E não precisa esperar estiagem ou hecatombe hídrica para isso.

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Aposentado do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.

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Nota da redação: para acessar a primeira parte deste artigo, clique aqui.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 15/08/2019

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