Relatório do IPCC e o efeito perverso entre produção de alimentos e mudanças climáticas, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
Relatório do IPCC e o efeito perverso entre produção de alimentos e mudanças climáticas, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“De pé ó vítimas da fome; De pé famélicos da terra”
Hino da Internacional Socialista
[EcoDebate] O relatório “Climate Change and Land”, do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU, publicado dia 08 de agosto de 2019, trata da conexão entre o uso da terra e seus efeitos sobre a mudança climática. Existe um efeito perverso de retroalimentação, pois a produção de alimentos aumenta o aquecimento global, enquanto as mudanças climáticas decorrentes ameaçam a produção de alimentos.
O relatório mostra, de forma inquestionável, que o crescimento da população mundial e o aumento do consumo per capita de alimentos (ração, fibra, madeira e energia) têm causado taxas sem precedentes de uso de terra e água doce, com a agricultura atualmente respondendo por cerca de 70% do uso global de água doce.
O aumento da produção e consumo de alimentos contribuíram para o aumento das emissões líquidas de gases de efeito estufa (GEE), perda de ecossistemas naturais e diminuição da biodiversidade. O sistema alimentar responde por cerca de 30% de todas as emissões de gases de efeito estufa (GEE) e 80% do desmatamento global. A humanidade ocupa cada vez mais espaço no mundo, com as áreas ecúmenas deslocando e minguando as áreas anecúmenas, conforme mostra a figura abaixo (FSP, 08/08/2019), com base no relatório do IPCC. A agricultura e a pecuária ocupam cada vez mais espaço no mundo e ao acelerar o aquecimento global afeta as florestas virgens, as áreas de savana e contribui para o aumento do degelo e a elevação do nível dos oceanos.
O relatório do IPCC foi resultado de dois anos de trabalho de 103 cientistas de 52 países, que participaram voluntariamente do estudo. Antes do seu lançamento, o relatório foi discutido com os governos no início de agosto em Genebra, na Suíça, e aprovado por consenso por todos os países que participam do IPCC.
Segundo o site DW (08/08/2019): “O relatório aponta que, se o aquecimento global ultrapassar o limite de 2ºC estabelecido pelo Acordo de Paris, provavelmente as terras férteis se transformarão em desertos, as infraestruturas vão se desmoronar com o degelo do permafrost, e a seca e os fenômenos meteorológicos extremos colocarão em risco o sistema alimentar. É um quadro sombrio, mas os autores do IPCC enfatizam que as recomendações do relatório poderiam ajudar os governos a prevenir os piores danos, reduzindo a pressão sobre a terra e tornando os sistemas alimentares mais sustentáveis, enquanto atendem às necessidades de uma população crescente”.
O fato é que o progresso da “revolução verde” e a maior disponibilidade de alimentos – incluindo proteína animal – viabilizaram o crescimento da população mundial, mas, ao mesmo tempo, aceleraram a degradação dos solos e das fontes de água e agravaram o problema do aquecimento global. O mundo consegue alimentar quase 8 bilhões de pessoas, mas o custo ambiental é terrível. Por exemplo, a contribuição da pecuária para a emissão de GEE é cada vez maior. Diminuir o consumo de carne é fundamental para mitigar as emissões e também para a defesa dos direitos dos animais.
O relatório do IPCC adverte que a demanda global por solo e água já acontece de forma insustentável e o acréscimo de mais 3 bilhões de pessoas até o fim do século vai trazer desafios ainda maiores.
Ao desmatar e eliminar animais e plantas a um ritmo impressionante, os seres humanos estão acelerando o colapso climático.
A seguir, as principais conclusões (segundo o site Página 22) :
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“Caso as emissões não sejam controladas, uma crise alimentar estará próxima, especialmente nas regiões tropicais e subtropicais. O aumento das temperaturas também pode afetar o valor nutricional das culturas e reduzir significativamente o rendimento das culturas.
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Os impactos climáticos já são severos. Ondas de calor e secas tornaram-se mais frequentes e intensas em algumas regiões, e a segurança alimentar já foi prejudicada por afetar o rendimento das colheitas e a produção animal, entre muitas outras mudanças como resultado da crise climática.
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Projeta-se que uma combinação de elevação do nível do mar e ciclones mais intensos ponha em risco vidas e meios de subsistência em áreas propensas a ciclones. O aquecimento já criou risco de incêndios florestais e estes devem se tornar um alto risco a partir de 1,5 grau de aquecimento.
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A agricultura, a produção de alimentos e o desmatamento são fatores significativos da mudança climática e produzem cerca de 23% das emissões de gases de efeito estufa induzidas pelo homem.
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Diferentemente do setor de combustíveis fósseis, a agricultura sustentável poderia ser parte da solução para o aquecimento global, ao retirar carbono da atmosfera e colocá-lo no solo. Mas a janela de oportunidade está se fechando rapidamente, pois a capacidade dos solos de realizar essa função diminui à medida que a temperatura aumenta.
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O progresso inicial em direção a uma ampla transformação da agricultura, silvicultura e uso da terra é necessário para alcançar as metas do Acordo de Paris. Essa transformação precisa estar bem encaminhada até 2040.
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Existem muitas soluções em que todos ganham no setor da terra, particularmente na agricultura e silvicultura, mas algumas soluções terrestres para o aquecimento global, como BECCS (bioenergia com captura e sequestro de carbono) podem forçar trade-offs com produção de alimentos se não forem feitas com cautela ou em escalas inadequadas.
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A escassez de água em regiões secas será um desafio cada vez mais urgente, além de um aumento global de temperatura de 1,5 grau.
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Mudanças climáticas e eventos climáticos extremos relacionados podem intensificar a migração através das fronteiras e dentro dos países”.
Em síntese, o avanço científico e tecnológico aliado ao uso generalizado dos combustíveis fósseis reduziu a fome no mundo, que atingiu o nível mais baixo da história. Porém, a insegurança alimentar e a desnutrição global aumentou nos últimos 3 anos e pode aumentar muito no futuro próximo. A biocapacidade da terra está diminuindo e os meios naturais para o sustento da humanidade estão definhando.
Por isto é preciso levar em conta que o progresso humano está levando o mundo para a beira de um precipício em função de uma catástrofe ambiental cada vez mais provável. Para satisfazer a gula de poucos e matar a fome de muitos, destrói-se a vida no Planeta.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
DW. Mudança climática ameaça produção de alimentos, alerta ONU, 08/08/2019
Rafael Garcia. Crise do clima vai acirrar disputa por terra, diz IPCC. FSP, 08/08/2019
Página 22. Segurança alimentar depende do corte urgente de emissões, alerta IPCC, 08/08/2019 http://pagina22.com.br/2019/08/08/seguranca-alimentar-depende-do-corte-urgente-de-emissoes-dos-gases-de-efeito-estufa-alerta-ipcc/
IPCC. Climate Change and Land. An IPCC Special Report on climate change, desertification, land
degradation, sustainable land management, food security, and greenhouse gas fluxes in terrestrial ecosystems, 08/08/2019
https://www.ipcc.ch/site/assets/uploads/2019/08/4.-SPM_Approved_Microsite_FINAL.pdf
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 12/08/2019
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Enquanto ‘desviam’ para canudinhos e sacolas plásticas, vão queimando 170 milhões de barris de petróleo por dia! Quando raramente se fala em Combustão, vem o absurdo de trocar carro por bicicleta. As boas motos estáveis (reverse trike) chinesas (250) são ‘escondidas’.