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No Mato Grosso, agrotóxicos considerados altamente tóxicos contaminam a água da chuva e de poços artesianos

 

No Mato Grosso “chove” agrotóxicos, apontam pesquisadores

Por Hara Flaeschen sob supervisão de Vilma Reis | Informações da Rede Brasil Atual

No Mato Grosso, agrotóxicos considerados altamente tóxicos contaminam a água da chuva e de poços artesianos

Mato Grosso, estado que mais consome agrotóxicos no Brasil, apresenta vestígios de venenos – como atrazina, metolacloro e metribuzim – na água de chuva e em poços artesianos de escolas rurais e urbanas, em quatro municípios. A Rede Brasil Atual abordou a pesquisa que comprovou a contaminação, conduzida por Lucimara Beserra, durante seu mestrado em Saúde Coletiva na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). A orientação foi de Wanderlei Pignati, pesquisador da instituição e integrante do GT Saúde e Ambiente da Abrasco. Leia, abaixo:

Agrotóxicos considerados altamente tóxicos, como a trifluralina, e cancerígenos, como a atrazina, metolacloro e metribuzim, contaminam a água da chuva e de poços artesianos de escolas rurais e urbanas nos municípios de Campo Novo do Parecis, Sapezal e Campos de Júlio, na bacia do rio Juruena, no Mato Grosso.

Em quatro de seis amostras de poços foram detectados resíduos dos herbicidas atrazina e metolacloro. Mais da metade (55%) das amostras de chuva continham resíduos de pelo menos um tipo de agrotóxico entre os detectados (metolacloro, atrazina, trifluralina, malationa e metribuzim). O metolacloro foi o mais frequente, detectado em 86% das amostras contaminadas.

A conclusão é de uma pesquisa conduzida por Lucimara Beserra para seu mestrado em saúde coletiva, sob orientação de Wanderlei Antonio Pignati, professor e pesquisador do Núcleo de Estudos Ambientais e Saúde do Trabalhador da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).

Alunos e professores de três escolas rurais e três urbanas desses municípios participaram do estudo, coletando amostras da água da chuva e do poço em cada unidade escolar, como mostra o vídeo no final desta reportagem.

Exceto o poço da escola urbana de Sapezal, localizada no meio da cidade, os demais tinham no entorno plantações de soja, milho, algodão e girassol, em um raio de distância variando de 50 a 1.000 metros.

A maioria de todas essas amostras contaminadas foi coletada em maio de 2015 e fevereiro de 2016, meses do período chuvoso, que favorece a infiltração de diversas substâncias no solo e nos lençóis freáticos. Maio coincide com o fim da safra agrícola de milho e de algodão, na qual ainda há pulverização de diversos agrotóxicos.

E fevereiro, com o início da colheita da soja e o plantio/colheita da safra de milho e o plantio de algodão, com intensas pulverizações de agrotóxicos. Agosto corresponde à entressafra da soja, período entre uma safra e outra, com descanso e preparação do solo, com pouca ou nenhuma pulverização. E a localização dos poços artesianos foi escolhida próxima a áreas de lavouras com uso desses produtos.

O estado é o maior consumidor brasileiro de agrotóxicos, e o Brasil, o maior consumidor mundial. Em  2012, o Brasil despejou sobre suas lavouras 1,05 bilhão de litros de herbicidas, inseticidas e fungicidas. Só em Mato Grosso foram 140 milhões de litros, segundo o relatório de consumo de agrotóxicos em Mato Grosso, de 2005 a 2012, do Instituto de Defesa Agropecuária (Indea) de Mato Grosso.

Nuvem

Ao comparar a contaminação conforme a localização das áreas, Lucimara Beserra constatou que a escola rural de Campo Novo do Parecis apresentou um número maior de amostras contaminadas (76,9%) em relação as demais escolas.

Mas isso não quer dizer que a área rural seja a mais contaminada. Uma nuvem de chuva pode ser deslocada pelo vento do seu local inicial de formação, e os agrotóxicos depois de suspensos no ar também podem sofrer deslocamento pelo vento, podendo contaminar outros lugares nos quais não houve a utilização desses produtos. Há pesquisas mostrando, por exemplo, contaminação por agrotóxicos em regiões do Ártico e da Antártica – onde não há atividade agrícola.

Independente do local, a contaminação depende da persistência de cada agrotóxico. O herbicida metolacloro, princípio ativo que teve maior frequência de detecção nas amostras de chuva, também encontrado nas amostras de água de poços artesianos, é uma substância de alta persistência, além de ser considerado muito perigoso ao ambiente (risco ambiental II).

O tempo de meia-vida do metolacloro na água é de 365 dias e no solo, 90 dias. Tais características, somadas ao alto consumo de agrotóxicos nos municípios, indica os motivos da detecção das substâncias nas três amostras do poço da escola urbana de Campo Novo do Parecis e na alta frequência de detecção nas amostras de chuva contaminadas dos três municípios.

A persistência da atrazina no ambiente é menor, bem como seu índice de solubilidade e volatilidade são menores se comparados ao metolacloro. Entretanto ainda possui potencial de contaminação de águas subterrâneas e chuva, sendo encontrado na água de quatro poços artesianos. Foi o segundo agrotóxico mais detectado nas amostras de chuva. O inseticida malationa, que teve maior concentração detectada nas amostras de chuva, também possui alta volatilidade e é considerado perigoso ao ambiente (risco ambiental III).

O projeto de pesquisa integrado sobre agrotóxicos, saúde, trabalho e ambiente na bacia do rio Juruena foi realizado em parceria com pesquisadores do Departamento de Química e da Faculdade de Nutrição da UFMT, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), com apoio financeiro do Ministério Público do Trabalho de Mato Grosso (MPT-MT), por meio da Procuradoria Regional da 23ª Região.

A pesquisa atende assim à demanda do MPT por uma avaliação dos impactos do uso desses produtos à saúde e ambiente nessa região de alto número de ocorrências de violações aos direitos trabalhistas relacionadas ao agronegócio e agrotóxicos.

Para Lucimara Beserra, a contaminação da água da chuva e de poços artesianos expõem relações e processos que tornam a população e o meio ambiente vulneráveis, o que exige atenção e atuação da Vigilância em Saúde nesses territórios.

Fonte: Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 28/02/2019

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