O fracasso do Licenciamento Ambiental no Brasil, artigo de Millos Augusto Stringuini
O fracasso do Licenciamento Ambiental no Brasil, artigo de Millos Augusto Stringuini
[EcoDebate] Quando se observam os desastres ambientais de Mariana e Brumadinho e os riscos (quase perigo) de muitas outras barragens; os elevadíssimos níveis de contaminação ambiental das águas pluviais do Brasil; a enorme quantidade de rios poluídos; o caos existente na maioria da coleta e disposição final de resíduos sólidos e outras centenas de passivos ambientais, vemos que os processos de licenciamento ambiental no país, como instrumento de gerenciamento territorial e de qualidade ambiental, fracassaram.
Agravando o quadro, os Governos, Federal, Estaduais e Municipais são os maiores poluidores do país. Fundamentalmente o são pela inação e incapacidade de gestão e geração de processos de saneamento básico integrado. Além disso, os maiores poluidores nacionais não são integralmente atingidos pelos processos de licenciamento, pois esse instrumento administrativo não possui poder eficaz de coerção sobre os entes públicos.
As barragens que se romperam estavam com licenças ambientais válidas. Os exemplos de empreendimentos estatais e públicos licenciados ambientalmente são inúmeros, mas isso não significa que eles estejam protegendo o meio ambiente de forma eficaz.
Os processos de Licenciamento Ambiental são peças intrincadas de baixo valor gerencial ambiental (resultados obtidos), mas de alta complexidade burocrática, induzidos pela praga nacional do Legalismo – Fiscalismo e do Comando Controle. Baseados em Estudos de Impacto Ambiental que, em sua imensa maioria (mais de 90%) são fraudes científicas por serem incompletos e desprovidos de análises dinâmicas, se fossem auditados hoje, demonstrar-se-iam um verdadeiro fracasso como instrumento de gestão e proteção ambiental.
O Licenciamento Ambiental é atualmente um instrumento sem credibilidade pública e política.
Gera muitos empregos públicos e privados, pois existe uma enorme massa de pessoas comprometidas com o processo de licenciamento por si só, todavia, o comprometimento com a solução dos problemas ambientais é muito baixo. Por exemplo, faz mais de 40 anos que os pluviais do Brasil estão contaminados. Raras são as tentativas de resolver esse problema e a poluição não só persiste com se agrava.
De forma intermitente, a mídia informa que Governadores e dirigentes nacionais reclamam da morosidade do processo de licenciamento ambiental no Brasil. Procuram sempre encontrar meios de simplificar o licenciamento para estimular o desenvolvimento de novos empreendimentos. Ficam tentando reinventar a roda. Cada vez que isso acontece o sistema de licenciamento perde credibilidade.
Tentando fazer o processo de gestão ambiental mais eficaz, durante nossa vida profissional demonstramos reiteradamente que aquilo que é considerado uma equação administrativa de difícil solução, ou seja, diminuir o tempo do processo de licenciamento sem perda de qualidade pode ser realizado. A simplificação com aumento da eficácia do processo de administração ambiental é factível.
Sem necessitar produzir nenhuma lei nova é possível celebrar Contratos de Gestão Ambiental (CGA) entre o Poder Público e as empresas Privadas e mesmo com outros entes públicos (por exemplo; Prefeituras Municipais) para a realização de processos de Gestão Ambiental.
Esses Contratos Administrativos, possuem como Cláusula Objeto o Gerenciamento Ambiental em seus termos de referência, os quais deverão ser realizados pelos empreendedores contratantes com o Poder Público.
Também possui Cláusula Penal para os casos de descumprimento do contrato (multas e obrigatoriedade de recuperar o dano e, principalmente, em casos de reincidência do contratante faltoso (tanto público como privado), a impossibilidade de contratar novamente com o Poder Público por tempo determinado no CGA.
As cláusulas de obrigatoriedade de Contratação de Seguros Ambientais e Auditorias Ambientais, ex ante e ex post contrato, bem como a recuperação de passivos ambientais passados, presentes e futuros também estarão presentes.
Não são contratos de adesão, mas possuem uma formulação geral a qual será adaptada caso a caso.
Sem possuir caráter opressor – ameaçador, os Contratos de Gestão Ambiental (CGA) são instrumentos dotados de alta eficácia ambiental, baixa burocracia e menores custos para a administração pública. Nos países Europeus onde são utilizados os resultados são visíveis a olho nu.
Infelizmente ainda não são adotados no Brasil, tendo em vista que muitos dos burocratas e políticos envolvidos não desejam simplificar a tarefa de licenciamento ambiental. Querem manter crescente o poder discricionário de seus cargos públicos a qualquer custo.
Triste realidade. Se o Brasil não implantar administrativamente, de forma rápida, os Contratos de Gestão Ambiental (CGA), o já fracassado sistema de Licenciamento Ambiental irá entrar em colapso em poucos anos.
Existe no presente momento uma linha de confiança da população (janela de oportunidade) nas mudanças das relações do Estado com o Povo. O momento nacional é propício para acabar com os pensamentos equivocados de que o gerenciamento territorial é antieconômico.
Com mais de 40 anos de experiência profissional trabalhando tecnicamente com questões ambientais, deixo nesse artigo um alerta.
Sem gerenciamento ambiental tecnicamente correto, muito em breve o país terá problemas ambientais muito maiores que aqueles que atualmente estamos vivenciando.
Precisamos urgentemente de menos burocracia e maior eficácia.
Millos Augusto Stringuini, Dr. Sc.
Especialista em Ecologia e Doutor em Ciências do Meio Ambiente.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 15/02/2019
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Até quando, no final da gestão de órgãos ambientais (antevéspera de mudança de Governo) licenças que estavam pendentes há muito tempo são rapidamente concedidas / renovadas?
Roosevelt. São situações como as citadas por ti que conduziram o Licenciamento Ambiental no Brasil ao fracasso como instrumento de gestão e proteção ambiental.
O Dr. Millos levanta uma questão interessante: a elevada contaminação das águas pluviais.
Infelizmente, nas grandes cidades, não são poucas as ligações clandestinas de esgoto nos coletores de água pluvial, comprometendo o caráter de separador absoluto que os sistemas sanitários devem ter.
Em Belo Horizonte, a COPASA faz a operação caça-esgoto, pois a esperada descontaminação do ribeirão Arrudas, após a inauguração da ETE Arrudas, não aconteceu. Trata-se de um trabalho difícil, pois as ligações clandestinas são, muitas vezes, tão antigas que passam debaixo de vias públicas de grande fluxo.
Mas, como afirma o Dr. Millos, o Poder Público não é inocente nessa questão. Durante muito tempo, a coleta de esgoto foi relegada a segundo plano e, até hoje, diversas ruas não dispõem de coletores públicos de esgoto.
Cunhou-se a frase: O esgoto não dá votos, porque fica debaixo da terra.
SEM GENERALIZAR, em grande parte o licenciamento ambiental se tornou, ao invés de um correto instrumento de gestão ambiental, uma ladainha burocrática que inferniza o empreendedor.
Caro Paulo Afonso. A contaminação dos pluviais é maior. Neles são encontradas toneladas de resíduos sólidos (plásticos de todos os tipos) e uma enorme quantidade de metais pesados. A poluição dos pluviais é enorme. Todavia, os órgãos ambientais estão perdidos na papelada burocrática dos licenciamento. A postura das administrações ambientais no país é reativa. É mais fácil ser reativo e burocrata do que ser proativo.