Justiça Federal multa Norte Energia e União em R$ 1,8 mi por atraso em condicionante indígena de Belo Monte
Belo Monte – Condenação da Norte Energia e da União ocorre pela demora em cumprir quesito da licença ambiental que previa reestruturação da Funai para atender os povos indígenas atingidos
Adalton Munduruku observa o canteiro de obras paralisado da casa de força principal de Belo Monte, durante ocupação indígena, em maio de 2013. Foto: Letícia Leite/ISA
A Justiça Federal em Altamira (PA) multou a Norte Energia e a União em R$ 900 mil cada pela demora em cumprir os prazos previstos no licenciamento ambiental da usina hidrelétrica de Belo Monte para a reestruturação da Fundação Nacional do Índio (Funai) na região. A sentença refere-se à ação judicial do Ministério Público Federal (MPF) de 2014, que apontava um verdadeiro caos no funcionamento do órgão indigenista, responsável por atender todas as demandas dos nove povos indígenas atingidos pelas obras.
A Justiça reconheceu que a demora provocou graves danos aos indígenas. Para o MPF, a situação dos povos atingidos por Belo Monte chegou ao colapso e isso se deve muito à completa falta de estrutura da Funai durante os anos de maior impacto das obras, o que a impediu de acompanhar os programas de compensação e mitigação previstos no licenciamento. Muitos programas acabaram sendo implementados com desvios, agravando as consequências em vez de evitá-las.
A previsão de reestruturação da Funai na região do médio Xingu, como condição para que Belo Monte pudesse se instalar, constava já da primeira licença concedida ao projeto, em 2010. Mesmo assim, entre 2010 e 2014, quando o MPF buscou o Judiciário, o que se viu foi a desestruturação total da instituição. Sem sede própria, todos os postos retirados das aldeias e com 72% menos funcionários para atender os indígenas do que antes das obras da usina.
Em janeiro de 2015, considerando grave a situação, a Justiça Federal em Altamira deu prazo de 60 dias para que fosse apresentado um plano para a reestruturação. Um ano depois, em janeiro de 2016, nada tinha sido feito e o plano sequer tinha sido elaborado, o que levou a juíza Maria Carolina Valente do Carmo a determinar a paralisação das obras. Passados dois anos da ordem de paralisação, a reestruturação está sendo efetivada e a sede da Funai está quase finalizada para inauguração em Altamira.
Mesmo assim, pela demora e pelo descumprimento de liminar judicial, a sentença declara o “descuprimento pelo empreendedor do termo de compromisso pactuado entre Funai e Norte Energia para ações emergenciais, bem como da condicionante prevista no parecer Técnico 21/FUNAI/BeloMonte/2009, referente à necessária estruturação do órgão indigenista para que pudesse ser implementada a obra da UHE Belo Monte”. Foi decretado igualmente “o descumprimento pelo Poder Público da condicionante prevista do Parecer Técnico 21/FUNAI/BeloMonte/2009, referente à necessária estruturação do órgão indigenista para que pudesse ser implementado a obra da UHE Belo Monte”.
O valor das multas destina-se a um fundo nacional para ações em defesa do meio ambiente.
Entenda o caso – A situação das populações indígenas atingidas por Belo Monte no médio rio Xingu ficou insustentável com o atraso na obrigação de reestruturação da Funai. Os compromissos e obrigações previstos desde 2010 para evitar e compensar os impactos não foram cumpridos até pelo menos 2016.
“Presença constante dos índios na cidade, em locais provisórios e degradantes; ruptura completa da capacidade produtiva e alimentar; conflitos sociais, divisão de aldeias e deslegitimação das lideranças; vulnerabilidade extrema, com aumento do alcoolismo, do consumo de drogas e da violência sexual contra menores; modificação radical dos hábitos alimentares; surgimento de novas doenças, como diabetes, obesidade e hipertensão; super produção de lixo nas aldeias; vulnerabilidade das terras indígenas; diminuição da oferta de recursos naturais; conflitos interétnicos; impedimento do usufruto de seus territórios e desestímulo às atividades tradicionais. Esses são apenas alguns exemplos do que Belo Monte representou aos povos indígenas do médio Xingu”.
Para o MPF, a inação do poder público diante da necessidade de obrigar o cumprimento das condicionantes e de, nos casos de descumprimento, aplicar as punições necessárias levou a Norte Energia a controlar totalmente o processo de licenciamento ambiental. “O empreendedor reescreve suas obrigações e implementa políticas anômalas, sem o devido controle da Funai, incapacitada que está de cumprir sua missão institucional e de fazer valer as normas deste licenciamento”, constatou o MPF.
Processo nº 2694-14.2014.4.01.3903 – Justiça Federal em Altamira
Fonte: Ministério Público Federal no Pará
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 22/11/2018
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