A fala do Presidente eleito, artigo de Montserrat Martins
[EcoDebate] A fala de um Presidente da República eleito é de grande importância, embora muitos contestem que são “apenas palavras”. Palavras são importantes, sim, pois também são gestos, apontam caminhos, nos relacionamentos – e na vida pública, mais ainda.
Depois de uma eleição conturbada com acusações recíprocas, contundentes, a fala do Presidente eleito foi como deveria ser, prometendo respeito à Constituição e as leis e sua dedicação a governar para todos, em busca da prosperidade do país.
Dizendo inclusive que “não sou (o Duque de) Caxias, mas quero pacificar o país”, e num momento posterior citando Churchill, sinaliza que as falas polêmicas do passado ficariam para trás, pois agora é o Presidente eleito de todos os brasileiros.
É famosa uma frase de FHC ao assumir, diferenciando o sociólogo do Presidente, ao afirmar que “esqueçam o que escrevi”. Das complexidades teóricas, partiu para um pragmatismo político bem diverso da sua carreira acadêmica.
De Bolsonaro, dizem muitos analistas que seu perfil polêmico era proposital e uma forma de marketing para se destacar, ao se opor frontalmente ao “politicamente correto”, o que lhe rendeu várias eleições a deputado e, mais ainda, a fama nacional que o projetou como candidato a Presidente.
Já nas entrevistas durante as eleições se vislumbrou um Bolsonaro mais moderado, chegando em alguns casos a se desculpar por quem tenha se sentido atingido por alguma declaração sua no passado. Claro que, com seu modo militar de se expressar, tais momentos de reconsiderar são mais raros e sutis, nada que pareça um arrependimento de um homem culpado, pois na maioria das vezes justifica as próprias declarações em função do “contexto”.
Tal como Churchill, político conservador que era antipatizado por muitos britânicos e se consagrou como estadista durante a guerra, Bolsonaro tem esperança de surpreender até mesmo a seus críticos, com um governo eficaz contra os males do país, a começar reforço nas forças de segurança – um dos principais motivos de sua escolha pela maioria dos eleitores.
A primeira semana do Presidente eleito, no entanto, não foi só de notícias alvissareiras, mas também de algumas polêmicas não resolvidas. Suas críticas à Folha de S.Paulo, ameaçando não destinar verbas à imprensa que “mentir”, a fusão de Ministérios como o da Agricultura absorvendo o do Meio Ambiente e o da Economia englobando o da Indústria e Comércio, são três situações que preocupam setores da sociedade.
A cada situação polêmica, a boa vontade do discurso do Presidente Bolsonaro será posta à prova, bem como sua fala de governar “para todos”.
Montserrat Martins, Colunista do EcoDebate, é Psiquiatra, autor de “Em busca da alma do Brasil”
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 01/11/2018
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