A China continua tendo superávits recordes a despeito da guerra comercial de Trump, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[Ecodebate] A China continua vencendo a guerra comercial com os Estados Unidos e apresentando superávits recordes. Os dados da balança bilateral de comércio entre os dois países, divulgados pelo US Census Bureau, mostram que o superávit comercial da China com os EUA foi de US$ 261,1 bilhões nos 8 primeiros meses de 2018, número bem superior aos US$ 239,8 bilhões de 2017 e os US$ 225 bilhões de 2016 (governo Obama). No ritmo atual, o superávit chinês pode chegar aos US$ 400 bilhões no final do ano de 2018.
De fato, o desequilíbrio comercial entre os dois países é muito grande e não contribui para relações comerciais saudáveis. Contudo, os conflitos deveriam ser resolvidos por meio de negociações e não por táticas de guerra. Mas para Donald Trump “As guerras comerciais são boas, e fáceis de vencer”. O presidente dos EUA comemorou a vitória comercial sobre o Canadá e o México ao renegociar o acordo anterior (NAFTA).
Numa perspectiva histórica, o presidente Trump não diz nada de novo, mas apenas recoloca uma velha postura mercantilista que prevaleceu no mundo antes de Adam Smith e antes do capitalismo liberal. Ele acredita que se o país compra mais bens de um parceiro comercial do que vende bens a ele, pode ter vantagem na guerra protecionista, porque o lado superavitário tem mais a perder.
Todavia, a Teoria das Vantagens Comparativas, desenvolvida de forma mais abrangente por David Ricardo (1772-1823), mostra que o comércio internacional não é um jogo de soma zero, ao contrário, todos os parceiros tendem a ganhar quando o comércio aumenta e cada país se especializa naquilo que tem mais vantagem comparativa.
Diversos estudos mostram que os EUA e a China ganharam muito com o aumento do fluxo de comércio entre os dois países. Os ganhos foram tão grandes que todo o mundo ganhou, pois diversos avanços tecnológicos feitos nos EUA só se transformaram em bens comercializados globalmente devido à máquina de produção barata e em massa realizada na China.
Quarenta anos depois da abertura promovida por Deng Xiaoping, em 1978, a China se tornou, de forma excepcional, no país a apresentar o maior crescimento do PIB por um período tão longo, possibilitando que cerca de um bilhão de chineses saíssem da situação de extrema pobreza. O plano atual de Xi Jinping é eliminar a extrema pobreza até 2020.
Mas a China não ficou limitada à produção de bens e serviços de baixa densidade tecnológica e de baixo preço. O gigante asiático conseguiu avançar na estrutura produtiva e se tornar uma potência exportadora também na área de produtos sofisticados (computadores, celulares, etc.) a ponto de superar o tamanho da economia americana (quando medido em poder de paridade de compra).
Por conta disto, uma vitória de Donald Trump sobe a China não parece um jogo simples a ser vencido com medidas punitivas. O país de Xi Jinping tem muitos instrumentos para se contrapor às ações americanas. Por enquanto, o lado oriental está apenas administrando as jogadas comerciais e o aumento das tarifas alfandegárias. O déficit fiscal dos Estados Unidos em 2018 atingiu US$779 bilhões e a dívida interna continua crescendo de forma acelerada. Isto torna os EUA dependentes de empréstimos externos e dos investimentos chineses.
Como mostra o gráfico acima, a China continua ampliando os seus superávits de comércio, apesar de toda a retórica protecionista de Donald Trump. Mas no fundo a guerra é muito maior. A China está no caminho para se tornar uma potência econômica em todas as áreas importantes da competição produtiva.
O plano “Made in China 2025” já está movimentando bilhões de dólares com o objetivo de transformar o país em uma potência industrial e tecnológica. O governo chinês diz abertamente que quer deixar para trás a etapa de fornecedora de sapatos, roupas e brinquedos baratos, superando a era de país de mão-de-obra de baixo custo a um país de engenheiros e produtor de bens sofisticados e de alto valor agregado.
Tudo indica que a China está mais bem posicionada para vencer não só a guerra comercial, mas também a guerra pela hegemonia da liderança econômica e tecnológica global. Mas, sem dúvida, uma guerra aberta e sem controle, pode ser prejudicial não só à China, mas também aos EUA e aos demais países.
O mundo precisa de sinergia e negociação, pois existe a possibilidade de uma grande crise financeira e também uma crise ambiental. Uma solução para o desequilíbrio comercial seria uma forma de diminuir as tensões e evitar uma ampliação dos conflitos e evitar uma explosão de problemas que poderiam surgir com a eclosão de uma nova crise mundial.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 22/10/2018
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