Reducionismo e holismo, artigo de Roberto Naime
[EcoDebate] HOEFLICH (2007) afirma que a teoria de sistemas, holismo e o enfoque holístico, se disseminaram nos mais variados campos do conhecimento e de atividades sociais. Tais abordagens nem sempre carregam um significado preciso, claro e de utilidade.
As duas grandes abordagens daquilo que se denominou como o método científico, ou seja, os procedimentos que vem sendo utilizados pelo homem para adquirir, tratar, organizar e transmitir o conhecimento são a reducionista ou reducionismo e a holística ou holismo, cada uma delas com os seus procedimentos, conceitos e instrumentos específicos, mas ambas com um mesmo objetivo de avanço do conhecimento humano.
Como o reducionismo e o holismo possuem finalidades semelhantes, a compreensão dos fenômenos da natureza e do homem, e estas abordagens são complementares. Tal proposição é evidente, embora ainda possa parecer que haja competição entre holistas e reducionistas e seus processos de aquisição de conhecimento.
O reducionismo adota a premissa de que a natureza pode ser explicada com resultante de fenômenos físicos e químicos. A natureza é entendida como o comportamento dos seres vivos e suas relações com o ambiente, incluindo o comportamento humano. Essas bases conceituais foram inicialmente introduzidas por Galileu e Newton, sendo incorporadas posteriormente na essência do método científico (SARAVIA, 1986).
O entendimento é buscado pela decomposição dos fenômenos e entidades complexas em partes cada vez menores e isoladas, de forma a se adquirir o conhecimento de como são feitas e funcionam (CASTRO et al., 1998). Como estratégia de pesquisa e base para planejamento de experimentos, cujo objetivo seria o entendimento do funcionamento dos componentes de um sistema, o reducionismo tem sido muito mais bem-sucedido, sendo um complemento indispensável para o avanço do conhecimento da natureza.
Nesse caso, o reducionismo complementa o enfoque sistêmico ou holismo, consubstanciado pela Teoria Geral dos Sistemas (BERTALANFFY, 1950) de desenvolvimento recente e cuja aplicação na pesquisa é recente. O reducionismo tem desempenhado papel importante no avanço do conhecimento, em todos os campos do saber.
Associando técnicas experimentais e instrumentos de análise desenvolvidos no âmbito da estatística, forjaram-se poderosos instrumentos que inegavelmente permitiram progressos científicos e tecnológicos notáveis. Porém, o reducionismo não é suficiente para explicar todos os fenômenos, notadamente aqueles que envolvem a atuação concomitante de mais de cada causa, que são multifatoriais e polivariáveis, chamados de “complexos”.
Assim é a natureza e o meio ambiente, por isso se aborda transgênicos deforma diferenciada. Porque um fator pode interferir no outro e fazer emergir nova propriedade como já previa Eugene Odum.
Por isso se reconhece que não faz sentido exercer qualquer condenação prévia e apriorística da biotecnologia ou de qualquer substância química. Mas análises de curto prazo podem estar sendo omissas sobre efeitos multivariados emergentes. O planeta tem 4,5 bilhões de anos e o fator tempo talvez só seja bem apropriado em geologia.
Qualquer inovação tecnológica tem como estimulação, os benefícios que podem ser gerados. Embora possam ter trajetória tão diferenciada quanto são as intenções e predisposições de toda humanidade.
Assim, todos os procedimentos merecem isenção e avaliações em cada caso, e não condenações gerais de qualquer natureza, que respondam a anseios dogmáticos ou políticos. Mas é preciso considerar as multifatorialidades, as novas emergências que resultam destas sobreposições de variáveis e o fator tempo.
Algo que se pode afirmar, com certeza, que não está sendo realizado com transgênicos e agrotóxicos. Isto não é crítica vazia ou apenas por criticar. É exercer o princípio da precaução.
Mesmo que não se apregoe qualquer restrição às evoluções científicas que são representadas por incrementos na transgenia ou por aprimoramentos de moléculas na indústria química, não custa nada exercer o princípio de bom senso da precaução. Tanto em relação a multivariância, quanto em relação a emergência e ao fator tempo.
Procedimentos que podem interferir na seleção natural, são temerários, sem compreender todas as relações implícitas ou explícitas, e não lineares ou cartesianas da homeostase dos ecossistemas.
É um exercício de soberba e financeirização ambiental, na atual fase de conhecimentos da civilização humana, implementar estes incrementos sem considerar os princípios de precaução e sem mobilizar tentativas mais sistêmicas e holísticas de se apropriar da realidade.
A existência de interações entre múltiplos fatores causais têm sido uma das dificuldades enfrentadas pela escola reducionista na busca do conhecimento dos fenômenos.
Por outro lado, há a premissa de que tudo na natureza poderia ser explicado apenas pelas leis físico-químicos sobre no campo da filosofia da ciência. Essa postura tem contribuído para a criação de disciplinas estanques e isoladas, dificultando o relacionamento das áreas de conhecimento.
Tal situação impede que determinados fenômenos mais abrangentes, como os que envolvem conhecimentos de ciências humanas, biológicas e exatas, possam ser compreendidos na sua plenitude. Foi dessa insatisfação com as limitações do reducionismo que nasceu a motivação para o enfoque sistêmico, a aplicação do conceito de sistemas e das suas ferramentas analíticas na ciência.
As leis mecanicistas ou newtonianas do reducionismo não eram consideradas adequadas para explicar as relações entre as entidades sociais e econômicas, ou as complicadas interações de variáveis biológicas. Começaram a surgir novos princípios, que auxiliavam no entendimento das complexas relações e interações da natureza.
Foi um biólogo, o alemão Ludwig von Bertalanffy, quem inicialmente estabeleceu a chamada Teoria Geral dos Sistemas (BERTALANFFY, 1950; 1972) e posteriormente, em diversos artigos e foros científicos, ajudou a consolidar esta nova ferramenta do método científico.
A motivação principal era a busca de novas princípios, que fossem mais aplicáveis ao estudo dos seres vivos, menos contaminadas pela rigidez das leis da física clássica newtoniana, e portanto mais favoráveis ao conhecimento da suas complexas relações e interações. As interfaces entre as ciências sociais, a física e a biologia, que não eram consideradas.
Os campos não físicos do conhecimento não estavam suficientemente cobertos pelos conceitos e ferramentas do reducionismo. A obra genial de Fritjof Capra se apóia em religiões tradicionais e holísticas, quando não recorre à sistematização para argumentar.
Os sistemas são um conjunto de partes inter-relacionadas, com finalidade convergente, explícita ou implícita. Os pressupostos básicos da teoria geral dos sistemas são que existe uma tendência para a integração das várias ciências naturais e sociais e esta integração se orienta em direção à teoria dos sistemas.
Que a teoria dos sistemas pode ser uma maneira mais abrangente de estudar os campos não físicos do conhecimento científico e que ao desenvolver princípios unificadores que transcendam aos universos particulares das diversas ciências, a teoria dos sistemas se aproxima dos objetivos da ciência (BERTALANFFY, 1950).
Referências:
BERTALANFFY, L. von. An outline of general systems theory. British Journal for the Philosophy and Science, Aberdeen, v.1, p. 134-65, 1950.
BERTALANFFY, L. von. General systems theory: a crítical review. In: BEISHON, J.; PETERS, G. H. Systems behavior. London: Open University, 1972.
BROCKINGTON, N. R. Computer modeling in agriculture. Oxford: Clarendon, 1979. 156p.
CASTRO, A. M. G. de; COBBE, R. V.; GOEDERT, W. J. Prospecção de demandas tecnológicas: manual metodológico para o SNPA. Brasília, DF: EMBRAPA-DPD, 1995. 82 p.
CASTRO, A. M. G.; PAEZ, M. L. A.; LIMA, S. M. V.; GOEDERT, W. J.; FREITAS FILHO, A. de; CAMPOS, F. A. de A.; VACONCELOS, J. R. P. Prospecção de demandas tecnologias no Sistema Nacional de Pesquisa Agropecuária (SNPA). In.: CASTRO, A. M. G.; LIMA, S. M. V.; CAMPOS, F. A DE A; VASCONCELOS, J. R. P. Cadeias produtivas e sistemas naturais: prospecção tecnológica. Brasília, DF: EMBRAPA/DPD, 1998.
JOHNSON, B. B.; MARCOVITCH, J. Uses and applications of technology futures in national development: the Brazilian. Experience. Technological Forecasting and Social Change, New York, v.45, p. 1-30, 1994.
SARAVIA, A. Un enfoque de sistemas para el desarrollo agrícola. San Jose, CR: Editorial IICA, 1986. 265 p.
ZYLBERSZTAJN. D. Políticas agrícolas e comércio mundial: “Agribusiness”: conceito, dimensões e tendências. In: FAGUNDES. H. H. (Org.). Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas. Brasília, DF: IPEA, 1994. (Estudos de Política Agrícola, n. 28).
HOEFLICH, V. A. Agronegócio: enfoque sistêmico na agricultura. In: HOEFLICH, V. A. Cadeia produtiva do negócio florestal. Curitiba: UFPR; Colombo: Embrapa Florestas, 2007. 17. Apostila do Curso de Pós-Graduação em Gestão Florestal.
Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 11/10/2018
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