Especialistas avaliam que números da violência no Brasil já equivalem aos de um país em guerra
Especialistas avaliam que números da violência no Brasil já equivalem aos de um país em guerra
Participantes do Diálogos na USP Especial foram unânimes em afirmar que combate à violência baseado apenas na repressão é ineficiente
Rádio USP
A violência assola o país. Diariamente, os noticiários são recheados de informações de mortos de forma violenta, sem discriminação de sexo, raça, idade e classe social. Dados divulgados pelo IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada -, em parceria com o Fórum de Segurança Pública, mostram que 553 mil pessoas foram mortas no país nos últimos 11 anos.
Segundo o Atlas da Violência, esses números já são maiores que os de mortos da Guerra Civil na Síria, que chegam a 500 mil só nos últimos 7 anos.
O Diálogos Especial tratou a questão da violência e seus impactos na sociedade. Participaram dessa discussão os professores Sérgio Adorno, coordenador do NEV – Núcleo de Estudos da Violência -, Gustavo Justino de Oliveira, professor do Departamento de Direito do Estado da Faculdade de Direito da USP, e o jornalista Bruno Paes Manso, pesquisador do NEV.
O combate à violência baseado apenas na repressão – como vem sendo feito há décadas no Brasil – é ineficiente, segundo os participantes do programa.
O professor Gustavo Justino de Oliveira lembrou que o Estado fica em descrédito, se não consegue manter a segurança da população. O número de pessoas presas no país cresceu 700% nos últimos 20 anos. O número de homicídios cresceu mundialmente. No Brasil, Norte e Nordeste são as regiões com maior crescimento, lembra o pesquisador Bruno Paes Manso.
Segundo ele, como as violências são de diferentes espécies, a questão da crueldade vem aumentando. O número de crimes e sua severidade também cresce, e talvez a impunidade e a falta de qualidade nas prisões reflitam esse cenário. “O modo de combate à violência tem que mudar, porque elas (formas de violência) são diferentes.” Ele lembrou que, por muito tempo, “nós tivemos sempre o foco de combate da violência nos Estados. Os municípios e até a própria União Federal ficavam alijados.” O ideal é União, estados, municípios e sociedade juntos. A sociedade se sente vulnerável e com medo. É preciso desconstruir as políticas de segurança utilizadas nos últimos 40 anos. Hoje em dia, as prisões são dominadas por facções criminais que são fortalecidas. “É preciso lidar de forma inteligente, atacando financeiramente esses conglomerados. Porque o tráfico de drogas é um mercado muito lucrativo e se expandiu muito nesses últimos 30 anos”.
O professor Sérgio Adorno lembrou que “a vida cotidiana no Brasil, sobretudo no espaço privado, é também muito violenta”. O caso de violência contra as mulheres não tem a mesma repercussão e é tão grave quanto outros temas. A solução para lidar com esse crime não é mesma que você lidaria com a proteção das mulheres no espaço doméstico. Os maus-tratos e abusos de crianças e adolescentes também foram lembrados. “O problema é complexo, porque não só nós temos um cenário de violência que é heterogêneo, que envolve uma multiplicidade de situações, e tudo isso leva a que esse cenário de segurança seja um problema de maior relevo.” O professor lembrou que uma sociedade justa oferece rendimento para as famílias, habitação, saúde e segurança. “A segurança é fundamental.” Para se combater a violência, é preciso reiterar as velhas formas. O perfil do crime no Brasil mudou. Hoje em dia, há um peso maior dos crimes violentos, crime organizado, tráfico de drogas. O crime se modernizou e acompanhou o movimento dos mercados internacionais, mas o sistema de justiça permanece preso ao que se fazia há 30, 40, 50 anos. “O crime se modernizou e o sistema de justiça envelheceu”, disse o professor Adorno. Seriam necessárias inovações e programas de curto, médio e longo prazos. Ele lembrou o programa de segurança dos governos FHC e Lula, que foram muito bem elaborados, mas que não foram implementados por diversos fatores.
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O professor Gustavo Justino de Oliveira citou que o perfil sócio-econômico do jovem, negro e pobre, que não tem oportunidade de avanço social, é muito vulnerável. Ele se envolve muito cedo com a criminalidade e ao ser preso é apresentado ao crime organizado. “Seria necessária uma melhor gestão penitenciária para, aí sim, se combater o crime organizado”. Lembrando que este é um ano de eleições o professor disse que as soluções apresentadas pelos pré candidatos são muito simplistas. Ele citou como exemplo a liberação de armas, para que a população se arme. “Não há uma oferta de reabilitação plena de quem foi condenado e foi para a prisão.” Uma das novidades apresentadas pelo governo para lidar com a situação é a lei 13.675, de 11 de junho de 2018, já em vigor, que cria o Sistema Único de Segurança Pública. Ela envolve estado, município e União Federal, criando um conselho e um plano nacional de segurança pública.
Esta edição do Diálogos na USP Especial teve apresentação do jornalista Roberto Castro e trabalhos técnicos de Dagoberto Alves. A produção é do Departamento de Jornalismo da Rádio USP.
Da Rádio USP, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 09/07/2018
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