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Sistemas urbanos flexíveis, Parte 1/2, artigo de Roberto Naime

 

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Sistemas urbanos flexíveis, Parte 1/2, artigo de Roberto Naime

[EcoDebate] MASSARA (2005) aborda a questão dos sistemas urbanos flexíveis, que são organizações produtivas espacialmente descentralizadas, que operam a partir de centros dispersos de controle, muito condicionados por fluxos de diversas naturezas e escalas.

Em diferentes partes do mundo, se percebe que a condição urbana de muitas cidades está diretamente subjugadas a sistemas urbanos dessa natureza, ocasionando um prejuízo para a qualidade de vida da população e uma perda da qualidade ambiental dos espaços urbanos.

O principal ponto é que a flexibilidade deste sistema faz com que aspectos de proximidade física, localidade, cultura local e identidade ambiental sejam secundários para o processo. Pode se dizer que este modelo de sistema urbano está diretamente relacionado a um sistema econômico também flexível.

Podem ser caracterizados, segundo Monte-Mór e Costa pelos seguintes aspectos principais. Apresentam uma relação intensa com os meios de transporte e comunicação e incorporam diversas inovações tecnológicas em seu próprio processo de produção, como meta para flexibilização.

Operam e são configurados a partir de constantes reorganizações de fluxos, tanto na intensidade quanto nos direcionamentos e apresentam uma maleabilidade estratégica em função das tendências dos mercados.

Esse novo paradigma produtivo flexível é abordado e apresentado como “paradigma toyotista” para Castells, que atribui uma importância fundamental às interconexões neste tipo de organização sistemática.

Ocorrem articulações de centros de controle, regiões produtivas e mercados consumidores como variáveis de uma equação dinâmica. O nível e a qualidade de proximidade entre estas variáveis não está relacionado à distância entre os pontos, mas à intensidade de articulação entre as áreas em que se localizam.

Os aspectos de infraestrutura são fundamentais para agilizar e sincronizar os processos de troca entre as variáveis. Redes de conexão e articulação definem as proporções do tamanho dos centros produtivos e sua localização geográfica, em muitos casos, desconsiderando aspectos da identidade do local onde estão implantados e dos espaços urbanos contíguos.

Nesta perspectiva, os sistemas urbanos flexíveis contemporâneos devem ser analisados não somente através de suas características físicas ou geográficas, mas a partir de sua predisposição de infraestrutura em se integrar a uma rede dinâmica de relações, que compõe um sistema maior globalmente articulado.

As tecnologias digitais de comunicação potencializaram a criação de mercados globais. E também de serviços remotos e novos espaços de troca. E tem uma importância infraestrutural estratégica na organização e na manutenção dos sistemas urbanos flexíveis na atualidade.

Para Mitchell, as redes de interação virtual são hoje um problema geográfico, se referindo à importância e à interferência delas na construção dos espaços físicos.

Se formos analisar esta afirmação a partir da leitura crítica do conceito “virtual” de Pierre Lévy, podemos afirmar que estas redes de interação, ao contrário do que coloca Mitchell, são bastante “reais” e dependentes de um suporte físico, além de produzirem efeitos concretos na articulação, distribuição e construção dos espaços urbanos em regiões industriais.

Se apresentam sob a forma de rodovias, ferrovias, oleodutos, redes de transmissão, usinas, portos e outros. Virtuais seriam as organizações possíveis de se realizarem através de novas velocidades de trânsito de informações, novos canais de relações comerciais e novos paradigmas de produção flexível.

Essas interferências dos sistemas produtivos flexíveis nos espaços urbanos são vistas por Castells como potencialmente definidoras das formas de uso e ocupação das porções de cidade onde se localizam.

Para o sistema, uma cidade não passa de um nó. Segundo o autor, as funções a serem preenchidas por cada um dos nós desta rede definem as características dos lugares onde estão ou serão localizados. As cidades se tornam extremamente dependentes de uma demanda produtiva cuja escala é mundialmente maior.

Cada “nó” tem funções bem definidas dentro de uma cadeia produtiva de serviços que, apesar de ser considerada hierárquica por Caslells, apresenta aspectos não-lineares e de configuração independente.

A composição desta cadeia poderia ser analogamente imaginada enquanto uma rede multilateral de fluxos, trocas, interações e enfrentamentos em constante movimento como num sistema de informações.

A configuração de um espaço urbano resultante exclusivamente deste modelo de relações seria o que podemos chamar de uma “paisagem operativa”, um espaço resultante de um sistema ativo de forças produtivas, cuja potência maior é a ampliação contínua de sua própria produção.

Para uma melhor compreensão destes sistemas urbanos flexíveis, é necessário um tipo de leitura que nos permita captar sua complexidade, uma vez que sua escala física é tão grande que não se pode vislumbrar com um único olhar.

É fundamental que essa apreensão nos proporcione refletir como essa dinâmica flexível se reflete na construção do espaço urbano bem como quais as possíveis consequências geradas a partir de suas constantes reconfigurações.

Este tipo de olhar crítico nos permitirá apreender também a escala intermodal do sistema e a dimensão de todos os outros pontos com os quais um determinado sistema flexível se interconecta, para a partir daí refletir mais apropriadamente seu impacto em diversos centros urbanos.

Esta condição de crescente flexibilidade produtiva, de formação de sistemas flexíveis, provoca em muitos casos uma descontinuidade de ocupação do território, sendo extremamente prejudiciais para a qualidade de vida no espaço urbano.

As condições para o desenvolvimento urbano surgem de demandas vindas de escalas muito maiores do que a vida cotidiana. Alguns autores definem esta condição como uma “metacidade”, ou seja um tipo de aglomerção urbana que, devido às suas especificidades, se coloca num estágio além de nossa compreensão trivial de uma cidade enquanto espaço físico coletivo.

Segundo o arquiteto catalão Guallart, “metápolis” estão para a era digital assim como as metrópoles estão para a era industrial. A característica marcante é a coexistência de diversos modelos em um mesmo espaço urbano

A natureza complexa da nossa realidade diária demanda um novo tipo de lógica mais aberta capaz de relacionar diversos níveis, estágios, latências e potenciais que emergem de um reconhecimento n-dimensional da realidade.

Apesar destas preocupações nascerem na Europa, existe uma série de aspectos que estabelecem relação com as situações urbanas encontradas no contexto brasileiro e que podem se tornar uma referência enquanto uma possibilidade de se compreender o espaço urbano atual, resultante de processos de produção flexíveis.

Referências:

MONTE-MÓR, Roberto Luís de Melo, COSTA, Heloisa S. M., Inovações tecnológicas e novas espacialidades: evidências e tendências recentes. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 20., 1996, Caxambu.

MITCHELL, Willian. E-topia: a vida urbana mas não como a conhecemos. Tradução: Ana Carmen Martins Guimarães. São Paulo: SENAC, 2002, p. 45-47.

CASTELLS. A sociedade em rede, 1999, p. 503.

GUALLART, Vicente et al. HyperCatalunya: research territories. Barcelona: IAAC, Generalitat e ACTAR, 2003.

MAAS, Winy et al. Metacity Datatown. Rotterdam: MVRDV/010, 1999, p. 16-19.

MASSARA, Bruno. Sistemas urbanos flexíveis e seus impactos no espaço urbano. (in) MASSARA, Bruno. Interfaces Gráficas e Cidades: Tecnologia Digital na Visualizaçào de Dinâmicas Espaciais en Grande Escala. Dissertação de Mestrado. NPGAU/EAU/UFMG, NOV. 2005, p. 30-36. Disponível em <http://www.territorios.org/teoria/H_C_sistemas.html> Acessado em: 26/12/2015.

 

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/06/2018

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