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Fórum Alternativo Mundial da Água – FAMA 2018: Água é direito, não mercadoria

 

Fórum Alternativo Mundial da Água – FAMA 2018: Água é direito, não mercadoria

Por Guilherme Weimann*, na Carta Capital / FAMA 2018

Há um embate em curso no planeta entre a mercantilização dos recursos hídricos e a garantia de seu uso público e universal

Neste momento, de crise do capitalismo, a água está no centro de uma grande disputa mundial. De um lado, temos uma estratégia de apropriação desse recurso por grandes corporações em benefício próprio. Do outro, encontram-se os povos de todos os continentes que enxergam a água como uma fonte fundamental à reprodução da vida e, por isso, a necessidade de mantê-lo sob controle público e a serviço de todos.

Durante essa semana, Brasília (DF) será o epicentro dessas duas visões opostas. O Fórum Mundial da Água (FMA), que ocorre no estádio Mané Garrinha com aporte estatal e privado, é um evento organizado pelo Conselho Mundial da Água – organismo dominado por grandes empresas como Ambev, Coca-Cola, Nestlé e PepsiCo. Na prática, este evento tem o objetivo de servir como um grande balcão de negócios para privatizar a água.

A poucos quilômetros do “fórum das corporações”, acontece o Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA), que se apresenta como um grande encontro de aproximadamente 7 mil pessoas de 170 países e 183 organizações – movimentos populares, sindicatos, ONGs, indígenas, quilombolas, pescadores, etc. O lema, “Água é direito, não mercadoria”, já evidencia o ponto de vista desse fórum que defende o controle público e se coloca irrestritamente contra a privatização dessa riqueza natural.

E o palco desse debate não foi escolhido de maneira aleatória. A América Latina detém 15% de toda a reserva de água doce do planeta – a maioria está no Brasil, que abriga em seu território 12% do total mundial. Para além das bacias hidrográficas, encontram-se no país os dois maiores aquíferos do mundo – Alter do Chão e Guarani, respectivamente.

Mas é importante pontuar que a mercantilização da água não acontece apenas com a tomada de nascentes, dos rios e das reservas subterrâneas, que são realizadas principalmente pelas empresas do setor alimentício e do agronegócio. A estratégia do capital é privatizar este recurso também por meio das hidrelétricas e do saneamento.

Logo após o golpe realizado em 2016, o presidente ilegítimo Michel Temer (PMDB) anunciou um pacote de privatizações de diversas estatais, entre elas a Eletrobrás. As propriedades da companhia incluem, entre outros bens, 47 hidrelétricas. Será uma transferência direta do patrimônio público à iniciativa privada. Na prática, isto se configura na completa privatização dos nossos rios.

Na área de saneamento básico, que inclui o abastecimento e tratamento da água, o cenário também é semelhante. Atualmente, no Brasil, 90% desse serviço é controlado por companhias estatais e, apesar do “estatal” não representar necessariamente um controle público, mantém o objetivo de atender a população, sem visar o lucro. A gana das corporações é privatizar completamente essa área, o que representará piora na qualidade e aumento exponencial das tarifas. Um exemplo de resistência nacional é Itu em 2016, onde ocorreu a remunicipalização do saneamento após oito anos de gestão privada (2007-2015), que causou o maior racionamento e um levante popular sem precedentes na história da cidade.

A partir dessas breves considerações, é necessário reafirmar que existem dois projetos completamente distintos de mundo. O FMA pretende monopolizar nas mãos de poucas pessoas toda a riqueza decorrente da água, sem se importar com as consequências disso. O FAMA enxerga a água como recurso essencial à vida e se contrapõe a sua apropriação privada em qualquer dimensão.

Dados alarmantes

Em decorrência do sistema capitalista que exclui a maioria da população do direito à cidadania e do acesso às fontes essenciais, o quadro mundial de distribuição do consumo de água é aterrador.

De acordo com o Relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), divulgado em julho de 2017, mais de dois bilhões de pessoas, que representa cerca de 30% da população mundial, não têm acesso à água potável. Além disso, mais de 60% não são atendidas por serviços seguros de saneamento – dessas, 160 milhões tem como única alternativa o consumo de água não tratada de fontes superficiais, como córregos e lagos. Como resultado, 361 mil crianças morrem com menos de 5 anos devido à diarreia.

Há também o alarmante número de 263 milhões de pessoas que se deslocam mais de 30 minutos para ter acesso a uma fonte segura de água. Nesse caso, é importante frisar a questão de gênero, já que a maioria desse montante é de mulheres, historicamente responsabilizadas pelos serviços domésticos e de cuidados. São diversos os exemplos ao redor do mundo de mulheres que caminham quilômetros com recipientes de água na cabeça para abastecer as necessidades para a reprodução da vida.

Precisamos utilizar esta semana para expor todos esses casos de violação dos direitos fundamentais do ser humano, mas, sobretudo, reunir forças para continuar na luta em defesa da água e da vida.

*Guilherme Weimann é jornalista e militante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB); integra a equipe de comunicação do FAMA.

 

Do FAMA 2018, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 20/03/2018

 

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