Imprescindível autuar criminalmente os responsáveis pela falta de manutenção em obras públicas, artigo de Álvaro Rodrigues dos Santos
[EcoDebate] O recente acidente ocorrido em Brasília, com o desabamento de um bloco do viaduto do Eixão Sul, trouxe mais uma vez à tona o fantasma da crônica falta de serviços de monitoramento e manutenção que ronda as obras públicas brasileiras aos níveis federal, estadual e municipal, condição que tem sido responsável por centenas de acidentes que chegam ao conhecimento da sociedade e por uma infinidade de disfunções técnicas que, ainda que não reveladas, tem o mesmo dom de arruinar o erário e o patrimônio público e prejudicar a vida de milhões de cidadãos.
Mas a maior tragédia nacional talvez esteja no fato de que essa constatação não é absolutamente novidade para ninguém, e muito menos por alguém é contestada. Pode-se afirmar consensualmente no mundo da engenharia que as obra públicas todas carecem de níveis mínimos de procedimentos clássicos de monitoramento e manutenção técnica. E absolutamente nada acontece, nenhuma providência mais séria e duradoura é tomada, permanecendo o brasileiro como vítima letárgica de desgraças acintosamente anunciadas.
Até nossa mídia vai se acomodando ao ritmo “normal” dos acontecimentos, anunciando burocraticamente as subsequentes “quedas de barreira”, os desabamentos, os afundamentos, o novo trecho rodoviário que “rodou”, a barragem que “estourou”, o colapso do túnel, o rompimento da adutora, etc., etc., repercutindo muitas vezes a cômoda e esperta explicação oficial do excesso de chuvas, de imprevistos naturais ou até de sintomáticos castigos divinos.
A sociedade brasileira precisa virar a mesa. Diante dos recursos tecnológicos disponíveis na engenharia brasileira não se pode aceitar que continuemos a ser vítimas inermes de condições tão humilhantes e prejudiciais aos cidadãos. Se acontece um acidente decorrente da falta de serviços de monitoramento e manutenção há responsáveis diretos envolvidos no evento, e esses responsáveis devem pagar o justo preço por sua falha.
Para tanto, como tornar fácil e inquestionável uma falha de manutenção e como localizar e responsabilizar seus responsáveis? Talvez uma boa medida seja determinar-se legalmente que a entrega de uma obra concluída deve obrigatoriamente ser acompanhada de um Manual de Monitoramento e Manutenção Técnica elaborado pela empresa executora. Como rotina processual, de caráter contratual, esse Manual deve ser recebido pelo órgão contratante que, no mesmo ato, obriga-se a definir e registrar oficialmente a responsabilidade institucional e nominal pelo cumprimento da manutenção especificada.
Com absoluta certeza, a adoção de atitudes e procedimentos dessa natureza nos fará transitar do atual estado de anomia e estupefação para um estado superior de responsabilidade e compromisso
com o interesse comum.
Geól. Álvaro Rodrigues dos Santos (santosalvaro@uol.com.br)
• Ex-Diretor de Planejamento e Gestão do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas
• Autor dos livros “Geologia de Engenharia: Conceitos, Método e Prática”, “A Grande Barreira da Serra do Mar”, “Diálogos Geológicos”, “Cubatão”, “Enchentes e Deslizamentos: Causas e Soluções”, “Manual Básico para elaboração e uso da Carta Geotécnica”, “Cidades e Geologia”
• Consultor em Geologia de Engenharia e Geotecnia
• Colaborador e Articulista do EcoDebate.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 26/02/2018
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