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Perda de biodiversidade e funcionalidades dos ecossistemas, Parte 1/3, artigo de Roberto Naime

 

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Perda de biodiversidade e funcionalidades dos ecossistemas, Parte 1/3, artigo de Roberto Naime

[EcoDebate] Micael Jonsson, do Department of Ecology and Environmental Science, da Umea University, da Suécia, elabora pertinente reflexão sobre as funcionalidades ecossistêmicas, que se apresenta e se desenvolve.

Inicia argüindo sobre a necessidade de se preocupar com a extinção das espécies. Até pouco tempo atrás, a diversidade da vida vem aumentando aos níveis mais elevados de que se tem conhecimento na história da Terra (CHAPIN et al., 2000).

Contudo, a exploração da natureza pelo homem tem tido conseqüências prejudiciais para a biodiversidade do planeta. Segundo estimativas, cerca de 150 tipos únicos de organismos são extintos diariamente (LAMONT, 1955).

É bem verdade que muitas espécies de plantas e animais estão desaparecendo e continuarão a desaparecer em decorrência de atividades humanas no passado e no presente (CHAPIN et al., 1996), mas será que essa perda afeta o funcionamento dos ecossistemas e influenciam o bem-estar da humanidade.

A ciência conhece quase dois milhões de espécies, mas acredita-se que existam pelo menos 10 milhões (e talvez até 30 milhões) de espécies (MAY, 1990).

Com esse grande número de espécies, e a vasta diversidade que representam, seria realmente tão importante se perdêssemos algumas, ou muitas que sejam.

Ocorre lembrar que é recorrente o argumento de que um mosquito a mais ou um sapinho a menos não faz diferença. Isto mostra o nível de desconhecimento da concepção de biodiversidade. Não é apenas os genes da espécie que podem trazer benefícios futuros para a civilização humana. Mas as funcionalidades desempenhadas pela espécie nas operações ecossistêmicas, que integra.

A extinção é um processo natural, mais de 99% de todas as espécies que já existiram estão hoje extintas (LEAKEY, 1996). Além disso, muitas espécies são consideradas redundantes (WALKER, 1992), o que significa que desempenham as mesmas funções dentro de um ecossistema.

Sendo assim, a perda de todas as espécies que desempenham uma certa função, com exceção de uma, não deveria importar. Ou deveria?

Qualquer possível efeito negativo no funcionamento do ecossistema deve-se não apenas à perda de espécies propriamente ditas, mas à velocidade com que estão desaparecendo.

Hoje em dia, as espécies estão desaparecendo de 100 a 1.000 vezes mais rapidamente do que em épocas anteriores à existência do homem na terra, e a extinção adicional das espécies ameaçadas pode acelerar substancialmente essa perda (CHAPIN et al., 1998).

Além disso, para cada 10.000 espécies que se extinguem, somente uma nova espécie chega a evoluir (CHAPIN et al., 1998). Portanto, a velocidade de perda de biodiversidade atual supera largamente a velocidade com que a natureza consegue efetuar uma compensação e se adaptar.

As espécies redundantes conseguem se proteger contra as mudanças de função do ecossistema, no caso de perda de espécies, somente até certo ponto.

Contudo, os organismos classificados por nós como idênticos em função muitas vezes demonstraram diferir o suficiente para adquirir uma importância significativa no funcionamento do ecossistema.

Mesmo que algumas espécies sejam redundantes em termos da função que desempenham, elas geralmente têm diferentes condições ambientais favoráveis ao seu crescimento e reprodução, o que é uma proteção contra as mudanças no ecossistema se as condições ambientais se alterarem (CHAPIN et al., 1995).

Consequentemente, a perda de espécies pode não só causar efeitos diretos num ecossistema, mas também afetar sua capacidade de proteção contra futuras mudanças ambientais.

Portanto, verificamos que as espécies estão desaparecendo mais rapidamente do que nunca, que a natureza não consegue acompanhar essa grande rapidez de extinção e que as espécies ecológicas equivalentes são importantes como proteção contra futuras mudanças no ambiente.

Portanto, existem motivos de preocupação. Mas será que existe alguma prova de que a perda de biodiversidade cause efeitos negativos no funcionamento dos ecossistemas? Existem pelo menos algumas indicações e, se vai discorrer brevemente sobre algumas investigações sobre os efeitos da perda de biodiversidade.

Embora diversos estudos, particularmente na ciência agrícola, tenham investigado empiricamente a importância do agrupamento de várias espécies em épocas remotas, foi só no início da década de 90 que os primeiros estudos testando especificamente os efeitos da perda de biodiversidade nos processos e funcionamento do ecossistema foram publicados.

Desde então, a pesquisa no campo da ecologia chamado “Biodiversidade e Funcionamento dos Ecossistemas, aumentou consideravelmente (LOREAU et al., 2001, 2002).

A despeito de alguns problemas com projetos experimentais, estatísticas e extrapolação de resultados para os sistemas naturais, houve progresso.

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http://www.ecologia.info/biodiversidade.htm

 

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.

Sugestão de leitura: Civilização Instantânea ou Felicidade Efervescente numa Gôndola ou na Tela de um Tablet [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 18/01/2018

 

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