RJ: Moradores de Barra Mansa temem criação de aterro para resíduos tóxicos
ABr
A criação de novo aterro sanitário em Barra Mansa, no Rio de Janeiro, no sul do estado, está gerando descontentamento entre moradores e organizações ambientais da região. O projeto envolve a construção de uma unidade de tratamento de resíduo industrial, para a qual seriam destinados tintas e óleos, telhas de amianto, solos contaminados, latas e outras embalagens de produtos químicos, os chamados resíduos classe 1.
A principal preocupação é com a toxidade dos resíduos. Moradores querem que o Instituto Estadual do Meio Ambiente (Inea), órgão vinculado ao governo do Rio de Janeiro, responsável pela análise e aprovação do projeto, agende uma nova audiência pública, já que a última teve pouca participação dos interessados, por ter sido divulgada no período de festas natalinas. A audiência é obrigatória no processo de tramitação do pedido de licenciamento ambiental.
“Ao ser questionada, na primeira audiência, sobre o transporte do material, a empresa Foxx Haztec, responsável pela execução do projeto, respondeu que a responsabilidade será da transportadora e, com isso, vemos que há possibilidade de ocorrer um acidentes e o material se espalhar na estrada, nas áreas onde ficam as casas”, disse Adriana de Vasconcellos, coordenadora da Comissão Ambiental Sul-RJ, organização não-governamental criada em 2009.
O local de instalação do aterro é próximo ao encontro dos rios Rio Bocaina e Carioca, que desaguam no Rio Bananal, um dos principais afluentes do Rio Paraíba do Sul. “Não somos contra o aterro, mas temos preocupações que também se ocorrem em função do histórico da empresa”, disse José Arimathéa Oliveira, presidente do Comitê Médio Paraíba do Sul, que participou de uma reunião com os moradores e organizações ambientais, realizada na cidade, na última sexta-feira (12). Oliveira disse que vê o empreendimento com receio.
A construção da nova unidade de tratamento está em fase de licenciamento prévio. O projeto apresentado ao Inea prevê um aterro com capacidade para receber até 300 toneladas de resíduos por dia, embora a previsão seja de 100 toneladas diárias. A unidade teria vida útil de aproximadamente 15 anos.
O instituto informou que o processo segue os ritos processuais e prazos estabelecidos pela lei e que, por isso, a audiência pública foi realizada no dia 18 de dezembro do ano passado. A possibilidade de nova audiência pública está sendo avaliada.
Em nota, a Foxx Haztec afirma que fez estudos de viabilidade e de impacto social e ambiental, como determina a legislação. A empresa defende a necessidade do empreendimento. “Apesar de ter um dos maiores polos industriais do Brasil, situado na região de Barra Mansa, o estado do Rio de Janeiro não possui nenhum aterro sanitário destinado a resíduos provenientes desse mercado.”
Segundo a empresa, serão gerados 50 postos de trabalho diretos no município, que também se beneficiará com a arrecadação de impostos e o pagamento da outorga sobre o faturamento do aterro. “Não há risco de contaminação do solo, pois na construção do aterro serão instaladas camadas mantas impermeabilizantes e sistema de drenagem. Desta forma, o resíduo não terá nenhum contato com o solo”, acrescentou.
Em Barra Mansa, a Foxx Haztec opera, desde 2012, um aterro de resíduos classe 2, destinado a lixo domiciliar. Para o novo empreendimento, a empresa adquiriu um terreno de 78 mil m² na Rodovia Engenheiro Alexandre Drable (RJ-157), no bairro Cotiara. Em outros municípios brasileiros, a empresa gere mais oito unidades de tratamento de resíduos, duas delas voltadas para resíduos de classe 1.
Arrecadação municipal
A Comissão Ambiental Sul-RJ informou que, de acordo com dados repassados, a prefeitura de Barra Mansa receberia R$ 200 mil mensais pelo empreendimento. A entidade avalia que esse montante seria insuficiente para obras de manutenção das estradas por onde passarão os caminhões transportando as 100 toneladas diárias de resíduos.
Questionado pela Agência Brasil, o município negou o valor e informou que, caso o aterro se concretize, seriam arrecadados recursos oriundos do Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISS), correspondente a 5% das receitas da empresa, além de um percentual de royalties sobre o faturamento. “O município ainda está estudando quais compensações seriam feitas, além das ambientais e estruturais das vias de acesso ao complexo.”
A prefeitura disse que a responsabilidade pelo licenciamento é do Inea e da Comissão Estadual de Controle Ambiental (Ceca) e que cabe ao município o acompanhamento, podendo até criar restrições e impedir a instalação usando mecanismos da legislação municipal caso entenda haver prejuízo ao ambiente da cidade.
Ainda de acordo com a nota, o prefeito solicitou, na semana passada, a paralisação do processo até que sejam avaliados questionamentos relacionados com o aterro de lixo domiciliar da Foxx Haztec, já em funcionamento.
“Segundo o prefeito, o Inea não deve avançar com qualquer novo licenciamento enquanto existirem pendências do anterior, como por exemplo a estação de tratamento de chorume, cobertura florestal, recuperação da área do antigo lixão e recuperação das estradas municipais de acesso ao centro de tratamento”, diz a nota.
Legislação rígida
De acordo com Gandhi Giordano, pesquisador de engenharia sanitária e ambiental da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), há hoje legislação rígida que trata do manejo, controle e segurança em aterros de classe 1. Isso se dá porque os resíduos a eles destinados têm propriedades físico-químicas e infectocontagiosas que podem apresentar perigo à saúde pública e ao meio ambiente. Daí, a exigência de mais atenção por parte dos geradores, já que acidentes mais graves e de maior impacto ambiental são causados por esta classe de resíduos.
“A legislação vigente atende. Se ela for seguida, o risco é minimizado”, disse o pesquisador. Ele menciona a obrigatoriedade de constar no projeto a garantia de tratamento do chorume, os riscos de poluição do ar, o atendimento a normas de isolamento para evitar contaminação, os cuidados em relação ao solo e à localização. “No final do processo de licenciamento, pode-se chegar à conclusão que a localização não é adequada”, ressaltou.
Para Giordano, as pessoas em geral não querem aterros próximos às suas casas, o que é uma reação normal. No entanto, desde tenham as condições necessárias para a implementação, os empreendimentos precisam existir em algum lugar, já que são fundamentais para o correto descarte de lixo e para a preservação ambiental.
“Não tenho detalhes do projeto de Barra Mansa, mas é uma região que tem muitas indústrias, então deve haver demanda. Por outro lado, estamos falando do Vale do Paraíba, onde temos um manancial que atende vários municípios do estado e da região metropolitana. Então, tem que se tomar cuidado, poque é uma área sensível. Para esse tipo de projeto, se exige uma distância mínima dos rios e dos corpos d’água. Deve se levar em conta a proteção ao lençol freático e às nascentes. Esses elementos não podem ser ignorados”, afirmou.
O pesquisador disse que o Rio de Janeiro é carente deste tipo de unidade de tratamento. “Tem resíduo que sai de Macaé e vai para São Paulo. Quanto mais se anda na estrada, maior o risco de um acidente. Tem também a questão econômica. Mandar um resíduo para outro estado, certamente tem um custo para as indústrias do Rio de Janeiro. Quando se tem uma infraestrutura como essa, fica mais fácil o cumprimento da legislação ambiental e aí você atrai indústrias”, acrescentou.
Por Léo Rodrigues, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/01/2018
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