Água deve ser entendida como um bem comum, defendem participantes do seminário Águas pela Paz
Água deve ser entendida como um bem comum, defendem participantes do seminário Águas pela Paz
Em meio à crise ambiental que o mundo vivencia, representantes de instituições públicas, academia e organizações da sociedade civil reuniram-se para discutir a sustentabilidade na relação com a água do planeta e reivindicar uma nova compreensão da sociedade acerca da água.
No Águas pela Paz – II Seminário Internacional Água e Transdisciplinaridade, realizado nesta quinta-feira (11), em Brasília, foi feita a defesa de que a água deve ser reconhecida como um bem comum, não como uma mercadoria.
“Água não é mercadoria e não pode ser tratada como negócio”, afirmou Ana Laíse Silva, representante do Fórum Alternativo Mundial da Água. A perspectiva foi compartilhada por Dom Leonardo Steiner, secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que enfatizou que “precisamos de uma nova relação com a água”. Referindo-se à encíclica papal sobre meio ambiente, divulgada em 2015 pelo Papa Francisco, enfatizou que, em vez de buscar dominar e calcular possíveis valores da água, é preciso adotar o cuidado e o cultivo com esse bem.
Como exemplo de medidas que podem ser tomadas para concretizar tal perspectiva, o presidente do Conselho Mundial da Água, Benedito Braga, defendeu que o acesso à água potável e ao saneamento básico deve ser considerado um direito humano fundamental. Oficial de Projetos do Setor de Ciências Naturais da Unesco no Brasil, Maximiliano Lombardo disse que a organização está implicada em fomentar discussões e projetos que garantam o compartilhamento desse bem. “Todos temos que partir de uma visão e entendimento comum a respeito dos riscos, dos problemas e também das soluções em torno da água”, alertou.
Seminário
O seminário Águas pela Paz é uma atividade preparatória para o 8º Fórum Mundial da Água, que ocorrerá em março, no Brasil. Integrante do Movimento Awaken Love, que idealizou o evento, Sri Prem Baba disse que o primeiro passo para um novo entendimento é lembrar “que a água é a causa da vida neste planeta”. Ele relatou a expectativa de que o seminário, a partir do encontro de diversos saberes, chegue a “soluções criativas e inteligentes para encontrar saídas para os grandes desafios do planeta neste momento”. O evento deve culminar com uma carta com reivindicações comuns. O documento será apresentado como contribuição ao Fórum Mundial da Água.
O fórum, realizado a cada três anos, é considerado um dos mais importantes espaços de debate sobre o tema em âmbito mundial e, pela primeira vez, será realizado em um país do Hemisfério Sul. O governador do Distrito Federal, sede do evento, Rodrigo Rollemberg, afirmou que o tema água é o mais importante da humanidade nesse momento. “Em todos os lugares do mundo, e em Brasília não é diferente, já há muitos anos temos recebido alertas de cientistas, estudiosos, pessoas que têm relação com a água, de que estamos chegando em uma situação extremamente crítica”, disse o governador, que apontou a importância de ações como preservação das nascentes e observação da qualidade dos reservatórios.
Racionamento
Há mais de um ano o Distrito Federal tem sido submetido a racionamento de água. O problema com os reservatórios não é exclusividade dos sistemas que abastecem a capital federal. Há dois anos, a maior cidade do país, São Paulo, enfrentou intensa crise e viu o principal manancial de abastecimento da região metropolitana, o Sistema Cantareira, ter menos de 10% de sua capacidade ocupada. No Nordeste, diversos estados sofrem com a falta de água há anos. Em 2017, comunidades do Ceará e da Bahia saíram às ruas para defender a priorização de abastecimento para a população.
A urgência da questão fez com que ministros do Meio Ambiente de todo o mundo acordassem, no fim do ano passado, durante a Assembleia Ambiental das Nações Unidas (Unea, na sigla em inglês), no Quênia, África, 14 medidas para prevenir, reduzir e gerenciar a poluição do ar, da terra e do solo, da água doce e dos oceanos, entre as quais destaca-se o fortalecimento e aplicação de políticas mais integradas.
Sinalizando que a preocupação transcende o universo dos líderes políticos, o seminário de hoje reuniu em um painel representantes das tradições do candomblé, católica, judaica, budista, islâmica, indígena e outras em uma mesma mesa. Cada um deles explicou o lugar da água em sua tradição religiosa; e todos defenderam que a busca pela proteção da água deve mobilizar toda a sociedade.
O Águas pela Paz – II Seminário Internacional Água e Transdisciplinaridade terá continuidade nesta sexta-feira (12). Organizado pelo Movimento Awaken Love, em parceria com o Centro Internacional de Referência e Transdisciplinaridade (Cirat), o Instituto Espinhaço, a Universidade da Paz (UniPaz), a Universidade de Brasília (UnB) e a Secretaria de Meio Ambiente do DF, o seminário tem programação gratuita e é realizado no Museu da República. Para o diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), Ricardo Andrade, o seminário e o fórum são espaços para “despertar a consciência do cidadão comum sobre o tema”, o que ele considera ser fundamental.
Por Helena Martins, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 12/01/2018
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Em 2014, a pesquisadora da Universidade Stanford, na Califórnia, Newsha Ajami, foi a São Paulo se inteirar da maior crise hídrica jamais passada pela cidade, pois o Sistema Cantareira havia entrado em volume morto. Após amargar horas no trânsito, em virtude de enchente do Rio Tietê, que havia alagado a marginal, ela desabafou: – Há um rio passando na cidade e vocês estão sem água? Nós (na Califórnia), realmente não temos água, não está chovendo e os nossos rios estão secos.
Tem razão a pesquisadora. É inconcebível que a cidade de São Paulo, aquinhoada com rios como o Tietê e o Pinheiros, tenha amargado a crise hídrica de 2014. Talvez tenha sido essa a razão que levou a Organização Mundial de Saúde publicar o manual “Potable Reuse – Guidance for Producing Safe Drinking-Water”, traduzido para o português como “Manual de produção de água segura por reúso do esgoto”.
Sugiro, portanto, aos organizadores do evento que abram espaço para o tema “reúso potável do esgoto doméstico”. Enquanto olharmos o esgoto doméstico como algo ruim, que deve ser afastado de qualquer maneira, mesmo ao custo de poluir nossos rios, em vez de considerá-lo como uma fonte potencial de água segura, continuaremos a ter crises hídricas em um país que detém o maior volume de água doce do planeta. Pior: continuaremos a procurar soluções esdrúxulas, como a transposição de águas da bacia do rio Paraíba do Sul para garantir o abastecimento de São Paulo. Como diz o Prof. Ivanildo Hespanhol, da Universidade de São Paulo, estamos imitando os antigos romanos e buscando água cada vez mais longe para fazer frente ao crescimento de nossa metrópole, esquecidos de que essa água vai virar esgoto e que não teremos onde colocá-lo se não fizermos seu reúso.
O artigo é ok, mas o comentário do Paulo Afonso da Mata Machado é fenomenal, de aplaudir de pé!