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A Marcha Contínua de Contaminação por Nitrato, artigo de Carlos Augusto de Medeiros Filho

 

A Marcha Contínua de Contaminação por Nitrato, artigo de Carlos Augusto de Medeiros Filho

O desastre da contaminação por nitrato das águas superficiais e subterrâneas é um caso exemplar de sinistro ambiental que avança constante e silenciosamente

[EcoDebate] O jornal Tribuna do Norte de 17 de março de 2013 reportava que “do total de 131 poços perfurados pela Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte (Caern) em Natal, mais de 30 estavam contaminados por nitrato”. Correspondia, na época, a 23% dos poços.

Há poucos dias atrás, em 01 de dezembro de 2017, novamente a Tribuna do Norte transmitiu uma matéria com a manchete “ Natal tem 40% dos poços fechados por contaminação” e informava no texto que dos 133 poços existentes, 53 estão desativados por contaminação por nitrato, explicando se tratar de uma substância considerada nociva ao ser humano e tendo uma relação direta com a falta de saneamento básico.

Medeiros Filho (2016) comentava que desastres ambientais, de causas naturais ou antrópicas, que ocorrem de maneira brusca, violenta, motivam, normalmente, fortes divulgações na imprensa, especialmente se estiverem associadas com significativas tragédias humanas. Existem outros desastres, entretanto, que por se desenvolverem paulatinamente, por um relativo longo período de tempo, não chegam com destaque na imprensa e, em alguns casos, não são classificados como um sinistro ou não tem seus motivos devidamente discutidas.

Medeiros Filho (2016) acrescentava que, em Natal, o desastre da contaminação por nitrato das águas superficiais e subterrâneas é um caso exemplar de sinistro ambiental que avança constante e silenciosamente e sem expectativa clara de solução.

A reportagem da Tribuna do Norte, agora no começo de dezembro, vem infelizmente confirmar essa triste expectativa. O jornal potiguar registra que a região de San Vale, na zona Oeste de Natal, apresentava, há 13 anos, teores médios de nitrato de 1,8 miligrama por litro em sete poços da área. Atualmente essa média já atinge o valor de 9,72 mg/L. Lembrando que teores acima de 10 mg/L N-NO-3, pode causar doenças como metahemoglobinemia (WHO, 2008) e câncer gástrico (INCA,2009).

 

Médias anuais de nitrato nas águas de poços do bairro do Planalto, Natal-RN (Cabral et al., 2009)
Médias anuais de nitrato nas águas de poços do bairro do Planalto, Natal-RN (Cabral et al., 2009)

 

Essa tendência de contaminação progressiva, na zona Oeste de Natal, já tinha sido diagnosticada cientificamente no artigo de Cabral et al (2009). Os autores relatavam que o estudo de poços no bairro Planalto de 1999 a 2006 mostrava que os valores médios anuais de nitrato avançaram de 1,5 mg/L-N nas primeiras medições para 4,6 mg/L-N em 2006. Notava-se, portanto, um claro crescimento das médias ao longo dos anos, mesmo que ainda apresentado concentrações abaixo do limite de potabilidade de 10 mg/L-N (BRASIL, 2004).

 

Médias anuais de nitrato nas águas de poço da captação San Vale, Natal-RN (Cabral, 2007)
Médias anuais de nitrato nas águas de poço da captação San Vale, Natal-RN (Cabral, 2007)

 

Cabral (2007) estudando a variação temporal, de 2000 a 2006, nas concentrações de nitrato em um poço na captação San Vale, observou teores sempre inferiores a 10 mg/L-N, mas registrando uma preocupante curva, fortemente ascendente, nos teores de nitrato. Essa tendência de crescimento, aparentemente mantida, justifica as concentrações de nitrato hoje reportadas, muito próximas ao limite de potabilidade.

Algumas perguntas e suposições: Esse lento e contínuo desastre de contaminação vai continuar? As áreas de águas subterrâneas (Aquífero Barreiras) ainda livres de contaminação estão devidamente preservadas? Os 40 por cento de poços fechados, se não estivessem contaminados, não resolveriam com tranquilidade o abastecimento da Grande Natal, como também poderiam ajudar no suprimento, via pipe lines, de algumas cidades do nosso semiárido?

Referências Bibliográficas

BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria n° 518, de 25 de março de 2004. Estabelece os procedimentos e responsabilidades relativos ao controle e vigilância da qualidade da água para consumo humano e seu padrão de potabilidade, e dá outras providências. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2004.

Cabral, N.T. 2017. Avaliação do comportamento do aqüífero Dunas/Barreiras frente aos processos de Recarga e de contaminação em perímetro urbano de Natal/RN. UFRN/LARHISA/CNPq.

Cabral, N. T.; Righetto, A. M.; Queiroz, M. A. 2009. Comportamento do nitrato em poços do aquífero Dunas / Barreiras nas explotações Dunas e Planalto, Natal, RN, Brasil. Eng Sanit Ambient | v.14 n.3 | jul/set 2009 | 299-306.

INCA. Instituto Nacional de Câncer. Câncer de Estômago. [On-line]. Disponível em http://www.inca.gov.br> Acesso em: agosto.2009

Medeiros Filho, C. A. Desastres lentos e graduais. In EcoDebate, 08/08/2016.

WHO. World Health Organization. Guidelines for drinking – water quality. 2008. [on line]. Disponível em< http://www.who.int/water_sanitation_ health> Acesso em: 21 ago. 2009.

 

Carlos Augusto de Medeiros Filho, geoquímico, graduado na faculdade de geologia da UFRN e com mestrado na UFPA. Trabalha há mais de 30 anos em Pesquisa Mineral

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 18/12/2017

[cite]

 

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2 thoughts on “A Marcha Contínua de Contaminação por Nitrato, artigo de Carlos Augusto de Medeiros Filho

  • Paulo Afonso da Mata Machado

    Como ocorre o nitrato na água? O nitrato é produto da oxidação do nitrito e este é resultado da oxidação da amônia, que, por sua vez, deriva do nitrogênio orgânico, presente na urina e nas fezes humanas e de animais.
    A presença de nitrato indica, portanto, contaminação antiga. Houvesse a presença de amônia ou de nitrito e seria possível suspeitar de contaminação recente.
    Embora o nitrato seja o produto final da oxidação do nitrogênio e, portanto, não seja nutriente para as bactérias que possam transmitir doenças, ele, por si só, é um contaminante, pois em concentrações acima de 10 mg/L pode transmitir metamoglobinemia em crianças. Por isso, deve ser removido da água potável quando atinge tal concentração.
    O que chama atenção é que 40% dos poços de Natal estão fechados por terem contaminação por nitrato. Ora, a remoção do nitrato da água é feita facilmente. Se a água do poço não contém matéria orgânica para as bactérias, basta fornecê-la, mas sem o fornecimento de oxigênio. Em cada molécula de nitrato existem três átomos de oxigênio. Com alimento e sem oxigênio, as bactérias tendem a remover o oxigênio do nitrato, promovendo o que se chama de desnitrificação.
    Portanto, é preciso fazer-se uma campanha para remoção do nitrato e recolocação dos poços em funcionamento.

  • Paulo Afonso da Mata Machado

    Complementando meu comentário anterior, acrescento mensagem recebida de João Abner Guimarães:
    Bom dia Paulo.

    Esse é um problema antigo de Natal que compromete as captações dentro do perímetro urbano nas áreas sem esgotamento sanitário que chegou a atingir 70% de Natal, que deverá ser amenizado pela implantação de 100% de redes coletoras em andamento.
    Abraço. João Abner

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