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Artigo

Como o Brasil sagrou-se campeão em corrupção e devastação ambiental? artigo de Giem Guimarães

 

artigo de opinião

 

[EcoDebate] Brasil: quinto maior país do globo em extensão territorial, com números de primeira grandeza. De um lado, abriga a maior floresta tropical do mundo, que garante o usufruto da maior reserva de água doce do mundo, com 12% do total disponível no planeta. De acordo com a Organização para Agricultura e Alimentação das Nações Unidas (FAO), esse porcentual é 42% superior ao da Europa. De outro, concentra maior produção de gado comercial do planeta – com mais de 215 milhões de animais – e a maior produção mundial de soja, revezando a primeira colocação com os EUA.

No gerenciamento das leis que regem a coexistência dessas grandiosidades até aqui, claramente paradoxais – floresta e água versus animais e soja –, temos outro expoente: a classe política brasileira, que responde pelos maiores crimes de corrupção mundiais.

O Brasil segue sendo o que parece ter sido programado para se tornar desde o princípio: uma terra que se arrasa e de onde se extrai rapidamente todas as riquezas por uma casta de privilegiados. No início, era a corte portuguesa que se fazia representada por exploradores enviados pelo império lusitano. Outros, como franceses, holandeses e espanhóis, tentaram o mesmo, mas nenhum, no entanto, foi páreo para a classe dominante que aqui já se instalara.

Fosse pela agricultura de subsistência, mineração, pecuária, exploração de madeira e afins, todas as atividades econômicas brasileiras foram, por séculos, “solodependentes”. Do pau-brasil ao café; do ouro à cana-de-açúcar, nosso território tem por mais de 500 anos servido aos senhores da terra. Desse período, pelo menos quatro séculos e meio, aproximadamente, solidificaram nossa cultura no trinômio extração mineral, desmatamento e plantio.

A maioria das famílias de imigrantes que nos séculos posteriores aqui chegaram também tirou da terra o sustento e seguiu com o mesmo comportamento destruidor aqui encontrado. Alemães, italianos e seus descendentes aniquilaram as florestas do Sul do Brasil no século passado. Nada mudou desde então; seguimos aprisionados no mesmo trinômio, reféns de um sistema político montado não para nos servir, mas para ser servido.

Quem poderia evitar a catástrofe se omitiu. Governantes eleitos e o Poder Judiciário foram historicamente omissos, quando não coniventes, na questão ambiental. E continuam sendo. De acordo com a revista Exame, estima-se que 80% da madeira comercializada no Brasil seja ilegal, ou “falsamente legal”. Na prática, o produto fornecido ao mercado vem de madeireiras que burlam os sistemas de controle do governo.

Mas como é possível tamanha falta de controle? Na verdade, é muito simples a resposta: Brasília governa para Brasília. A bancada ruralista que passou a dominar o governo (40% dos 513 deputados) enxerga o Brasil com o mesmo olhar espoliativo-extrativista secular. Mais do que isso: trata as autarquias públicas como se fossem uma extensão de seus negócios agrossilvopastoris. Vale deixar muito claro que não se faz aqui nenhuma crítica a partidos de direita ou de esquerda, já que o partido desses senhores seria melhor descrito como PPP, “partido do meu pirão primeiro“. O que aqui se critica é o descumprimento e a manipulação das leis ambientais.

Os comportamentos patrimonialistas e criminosos perpetrados pela classe política são a maior expressão do desprezo total pelos conceitos de cidadania, patriotismo e legado. O que lhes importa é o carpe diem da corte, como testemunhamos, estarrecidos, no caso da ruína financeira do Rio de Janeiro. Pedir que essa gente tenha escrúpulos com a natureza neste país é quase risível. Evidentemente que farão de tudo por seus interesses e o das suas bancadas que, ironicamente, se mantêm no poder graças aos seus “currais eleitorais” – termo duplamente adequado, pois, para eles, os eleitores não passam de gado. E, se somos todos gado, agro é realmente tudo neste país.

Enganam-se aqueles que julgam ser o Sul do Brasil uma ilha de ética e prosperidade. Veja-se, por exemplo, a irresponsabilidade e falta de consciência ecológica do governo do Paraná e da Assembleia Legislativa do estado, que desejam reduzir a Área de Proteção Ambiental (APA) da Escarpa Devoniana em 70%. Em Santa Catarina, uma medida provisória quer reduzir a área do Parque Nacional de São Joaquim em 20%, ou 17 mil hectares. Estamos falando de regiões com incidência das últimas áreas de Floresta com Araucária e Campos Naturais do planeta. Essas formações vegetais estão extremamente ameaçadas pela extinção e erosão genética e contam com menos de 1% de remanescentes em bom estado de conservação. Ironicamente, no Paraná, a mais alta honraria pública amplamente utilizada é chamada de Ordem do Pinheiro, uma referência à tão explorada árvore nativa, que enriqueceu muitas famílias tradicionais brasileiras.

Infelizmente, não são preocupações públicas que movem a maioria dos parlamentares. São objetivos de cunho privado que visam tão somente favorecer uma casta de privilegiados num país cujo sistema político faliu. Enquanto as reformas não vêm, é preciso que a Justiça brasileira ocupe seu lugar de maneira exemplar, não apenas em Curitiba, mas em todos os municípios e em todas as instâncias.

Fosse cumprido o artigo 225 da Constituição Federal – que trata do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado –, certamente não estaríamos aqui lamentando um dos piores tipos de corrupção: aquela que nos rouba direitos inalienáveis e intergeracionais como nossa identidade cultural, qualidade do ar, da água e do clima.

* Giem Guimarães é empresário e diretor-executivo do Observatório de Justiça e Conservação.

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 12/09/2017

[cite]

 

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